Em cinco dias de congresso, a 47ª edição do The Voice Foundation – TVF apresentou à os últimos avanços em ciência e cuidados com a voz e comunicação humana. Entre os convidados do evento, realizado na Filadélfia (EUA), estava a diretora técnica da Univoz, Ana Elisa Moreira-Ferreira, que participou do painel “Programa de Saúde Vocal e Comunicação em empresas”, apresentando os resultados dos projetos desenvolvidos pela empresa. “O Brasil já vem se destacando em programas de saúde vocal ocupacional e programas de competência na comunicação, o que influenciou o convite para escrevermos um capítulo no livro Voice Training Programas for Professional Speakers. Diante dessa oportunidade em desenvolver o tema, fui convidada pela segunda vez, a participar de um painel, o que é motivo de grande satisfação e reforça o quanto o nosso trabalho está consolidado”, comenta a especialista.
Ela conta que, como congressista, teve a oportunidade de conhecer o que há de mais atualizado em assuntos ligados aos cuidados com a voz e ao seu aprimoramento como um dos itens mais importantes para a comunicação humana. “Afinal, a voz é responsável por transmitir mais de 38% do conteúdo emocional da fala numa conversa presencial e 82% nas conversas à distância, como no telefone ou no WhatsApp.” A partir desse conhecimento, Ana Elisa destaca que o grande benefício de ter participado é trazer atualizações da área. Em entrevista, a diretora da Univoz nos conta sobre algumas dessas novidades e fala sobre a importância da saúde e bem-estar da voz.
Na sua participação, você abordou os programas de saúde vocal e comunicação em empresas aplicados principalmente aos operadores de call center. Por que esse assunto deve ser motivo de atenção entre as empresas deste e outros segmentos?
Ana Elisa: Esses profissionais sofrem com problemas relacionados à voz, pela própria característica do trabalho de depender da voz para o contato com o cliente. A falta de um programa de saúde vocal eficiente que atue com o real sentido da prevenção, traz prejuízos para o bem-estar do colaborador, sua qualidade de vida; mas também sofrem as empresas com mais afastamentos, licenças por problemas de voz, baixa qualidade e produtividade dos profissionais. No fim dessa linha de prejuízos mútuos, ainda está o risco de passivos trabalhistas para as organizações, uma vez que a disfonia (alterações na voz) já é reconhecida por respaldos legais como podendo ser relacionada ao aos aspectos ocupacionais. E mais do que apresentar uma solução paliativa, meu objetivo é mostrar que desenvolver as competências comunicativas e a voz é o melhor caminho para a prevenção de problemas relacionados às doenças ocupacionais, oferecendo conforto e segurança ao operador, professor, vendedores, facilitadores de treinamento e tantos outros profissionais.
E o que é ergonomia vocal e como ela ajuda o trabalhador e as empresas?
Ergonomia é um termo muito conhecido que estuda o ambiente e suas variáveis para ajustá-lo ao homem, trazendo menos adoecimento, e maior qualidade de vida. Ergonomia vocal foi um termo adotado por um estudioso finlandês e que nos remete ao cuidado global da voz no ambiente de trabalho. Uma vez que a voz pode ser afetada por múltiplos fatores, a ergonomia vocal analisa todos esses e busca minimizar seus impactos sobre a qualidade da voz dos trabalhadores. Então, analisamos e fazemos intervenções no ambiente, como por exemplo observando se tem água à disposição do trabalhador para preservar a voz; observamos os aspectos organizacionais do trabalho – se o trabalhador tem pausas suficientes para repousar a voz; além de muitos outros fatores que podem ser reajustados para reduzir o sofrimento vocal.
Que orientações você daria para as empresas e também, para todos os profissionais que utilizam a voz a trabalho?
No congresso, a pesquisadora Mary Sandage, Ph.D. em Ciência do Exercício, pela Universidade de Auburn, mostrou que em um dia de trabalho as pregas vocais do operador de telesserviços percorre uma distância equivalente a 4,5 km e em professores, a distância pode chegar a 3,7 km. Então, operadores fazem quatro vezes mais uso da voz e professores três vezes mais uso do que o recomendado. Para outros profissionais que se comunicam muito em ambiente de trabalho, como líderes de equipes, executivos, acreditamos que o uso vocal também é acentuado. Por isso, é fundamental o condicionamento vocal desses profissionais em programas de saúde da voz, os cuidados com a ergonomia vocal, e os trabalhos de comunicação e relacionamento interpessoal. A comunicação é um ato de convivência e sobrevivência e temos a missão de cuidar para que ela esteja presente a vida toda auxiliando as pessoas em suas profissões e crescimento na carreira, mas também em suas relações pessoais.
Quais são as novidades relacionadas à neurociência que você conheceu no TVF?
No congresso assisti a apresentação do pesquisador alemão Boris Alexsander Kleber. Ele ressaltou que o cérebro tem sua plasticidade e que é uma máquina de aprender; que o cérebro aprende a cantar e é modificado pelo canto, o que pode ser um bom exercício para as funções cerebrais. Trouxe estudos interessantes mostrando que ao produzirmos nossa voz nos momentos de comunicação, ela pode ser acionada pelo sistema límbico, e neste caso agiremos emocionalmente como um ato reflexo podendo falar de um modo que não queremos; mas também pode ser controlada pelo córtex cerebral, e assim, poderemos usar a voz que queremos, a voz certa para aquele momento de comunicação.