Se não fosse o medo

O que você faria se não sentisse medo de falar? Aquele medo que paralisa, aterroriza, que considera os espectadores seus verdadeiros inimigos.

Chegou a hora, os holofotes e todas as atenções estão sobre você. O coração dispara, a garganta seca, o pigarro surge, uma sensação de ‘branco’, respiração ofegante, transpiração, mãos frias e trêmulas, uma voz débil se insinua.

Desde a cultura Helênica nos chegam, através de lendas e mitos, o testemunho da notoriedade que desfrutou Orfeu, poeta trácio e hábil músico. Da Antiga Grécia à Paris, na voz de Sarah Bernhardt, atriz teatral que viveu no período de 1844 a 1923 e ficava muito nervosa nos momentos que antecediam as suas apresentações. Certa vez o seu medo foi criticado por uma atriz amadora. Sarah, enfurecida, respondeu: “Não se apoquente, quando lhe vier o talento, você se sentirá como eu!”

Chegando ao teatro brasileiro, na voz místico-poética de Paulo Autran, o medo também se expressa. Depois de meio século de palco, num misto de drama, ternura, garra, carisma e sucesso, Paulo Autran, nos primeiros minutos de cada apresentação, confessa sua insegurança. Mesmo que a peça já tenha sido apresentada centenas de vezes, o ator só perde o temor inicial após alguma manifestação de aprovação da platéia.

Um estudo com 3.000 americanos sobre os maiores medos do homem, concluiu que:

41% têm medo de falar em público;

32% têm medo de altura;

22% têm medo de insetos; problemas financeiros; medo de águas profundas;

19% têm medo de doença;

19% têm medo da morte.

A equipe do Voz-Centro Fonoaudiológico, que exerce a estética vocal e a performance da fala, tem observado a presença do medo de falar em cerca de 85% dos clientes que procuram estes serviços profissionais. Apesar disso, uma certa dose de medo é natural e necessária para ser acionada em situações de emergência, servindo como mecanismo de defesa, assim como para nos prepararmos melhor antes de nos sentirmos expostos.

É saudável e necessário desenvolvermos técnicas especializadas para canalizar o medo em prol de uma palestra, onde o objetivo principal é proporcionar algum benefício às pessoas, não a exibição de conhecimentos pessoais. Mas e essa sensação terrível de falar em público? Estamos sempre esperando que outro fale em nosso lugar, abdicamos o direito de nossa palavra. Esse sentimento de repulsa pela exposição ao público é como um sofrimento.

Para não “sofrer” é que se foge de oportunidades únicas, porque sabemos que se não formos, outro irá em nosso lugar. Este sofrimento não acaba aí. Depois de termos perdido esta oportunidade, fica a consciência de que o conhecimento existe, mas não existe coragem. Ficamos esperando uma conversa particular, quando as palavras, então, fluirão animadamente.

Ouvimos queixas de que o medo de falar ocorre em situações mais simples tais como falar ao telefone, entrar em lojas e falar com vendedores.

Quantas vezes aquela estrela tão esperada nos decepciona ao apresentar uma visível dificuldade em se comunicar? E outros palestrantes menos conhecidos se apresentam confiantes, despertando a atenção da platéia.

A divina Julie Andrews, depois de permanecer 34 anos longe da Broadway – por opção pessoal, retorna aos palcos na estréia de Victor/Victoria em 1995. Disse ter sido a apresentação mais excitante de sua vida. Estava muito nervosa, a platéia torcia pelo seu sucesso, mas sentia uma responsabilidade maior por saber que todos já a conheciam, diferente da sua estréia aos 18 anos: ‘Quando ninguém sabia quem eu era, não havia nada a perder’. Era uma espécie de obrigação corresponder às expectativas.’

Ao potencializar o orador inato em cada um de nós, haverá ascensão profissional e possibilidades adicionais de expressarmos as nossas idéias ao público que torce pela nossa vitória. No aperfeiçoamento permanente da fala, se encontrará o oásis – falar sem medo.

Janete Mayer, Fonoaudióloga do Voz-Centro Fonoaudiológico e Conferencista Internacional, Brasília-DF

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