Novo cenário?

Autor: Daniel Ávila 
O termo “alinhamento de interesses” tem ganhado cada vez mais relevância no ambiente corporativo e provavelmente deve ser o novo vetor para se fazer negócios no mercado financeiro. 
O nível geral de informação tem melhorado com a difusão pela internet e as pessoas hoje podem compreender melhor suas relações com fornecedores de produtos e serviços, bem como os interesses envolvidos. No mercado financeiro não é diferente.
Embora a maioria das operações sejam muito abstratas, a distância entre os bancos e o consumidor tem diminuído, seja pelo maior interesse dos investidores ou mesmo pelas iniciativas de educação financeira – muitas vezes promovidas pela própria imprensa através de cadernos especializados em finanças com linguagem simples e acessível.
Paralelamente, observamos um fenômeno contemporâneo e de massa: cada vez mais o patrimônio financeiro tem se tornado relevante às famílias. E isto possui relação direta com o padrão de vida e a segurança patrimonial que todos buscam com o trabalho e os esforços de poupança. E em geral, o nível de renda e patrimônio, reflete o nível educacional, de forma diretamente proporcional.
Sendo o mercado financeiro um veículo que canaliza parte da poupança popular para empreendimentos da economia real, é certo que entre tomadores, financiadores e intermediários, haja um alinhamento de interesses para gerar o maior valor possível e reparti-lo de forma mais equilibrada.
Este deveria ser o ideal de funcionamento. Mas a realidade é um pouco diferente. Hoje grande parte dos clientes tem dividido o lucro e arcado com os custos e riscos envolvidos nas operações. Esta dinâmica tem aberto espaço para que novos concorrentes aproveitem esta oportunidade. Quem se posicionar ao lado dos clientes pode conquistar parte de um mercado crescente e ainda participar de um negócio construído com a identidade de uma geração que busca mais do que um emprego: busca propósitos.
O relato de Greg Smith, ex-diretor do banco americano Goldman Sachs, é bastante ilustrativo sobre o limite de deterioração das relações entre clientes e instituições financeiras. Antes uma empresa admirada, que atraía jovens motivados a seguir carreira em um setor aspiracional; hoje um ambiente descrito como de relações degradas e muito distante dos pilares que o fez prosperar por mais de um século de operação.
Em um artigo publicado em 2012 no NY Times, Smith retrata o depoimento de um antigo entusiasta do Goldman, que se desmotivou pelo ambiente de negócios criado para simplesmente gerar lucros e bônus em detrimento do patrimônio do cliente. Este é um problema moral da diretoria que se alastra para a instituição e requer permanente vigilância, pois é resultado de incentivos mal direcionados, focado apenas nos resultados de curto prazo, preterindo o cliente e deteriorando a relação que sustenta o negócio. 
Esse desalinhamento de interesses pode ter sido um dos motivos que desencadeou a crise de 2008, e que o principal interesse da área comercial era distribuir ativos financeiros, preocupada com as comissões imediatas e sem o necessário comprometimento com a maturação ou risco do investimento para o cliente.
Felizmente o investidor tem percebido esses acontecimentos e está cada vez mais crítico e cético em relação ao mercado financeiro. Como o patrimônio de muitos já passou a ser mais importante que a própria renda, o nível de preocupação e exigência mudou de patamar. Ele passou a ser a garantia da manutenção de um padrão de vida e precisa ser mantido durante os anos em que a força de trabalho tende a ser reduzida.
Um dos atributos da internet é inverter a lógica de poder, possibilitando mudar a forma de fazer negócio. Com o mercado financeiro não será diferente. Não há como projetar um negócio para os próximos 50 anos, ancorar-se nos modelos do passado e desejar ser bem sucedido. 
Com o poder da informação nas mãos dos consumidores, teremos famílias cada vez mais interessadas em buscar empresas que consigam trabalhar de forma transparente e alinhada, proporcionando a geração de valores recíprocos e melhorando a forma de se fazer negócios. Ainda bem.
Daniel Ávila é diretor da Vérios Investimentos e do site Comparação de Fundos

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