Evandro Lopes, CEO da SLComm

Como o cérebro do cliente decide por ele e o que isso revela sobre nós

É preciso criar conexões verdadeiras, transparentes e coerentes com o funcionamento mental do cliente

Autor: Evandro Lopes

O mito da decisão racional nunca foi tão exposto. Por trás de cada clique, cada escolha e cada compra, há um sistema invisível, veloz, emocional e automático que opera com precisão quase instintiva. Trata-se do que Daniel Kahneman, Prêmio Nobel de Economia, chamou de “Sistema 1”: o piloto automático do cérebro, que resolve quase tudo sem pedir licença à razão. Mais do que uma curiosidade da psicologia, esse mecanismo tem implicações diretas para o modo como consumidores decidem, muitas vezes sem saber que decidiram.

Segundo pesquisa da Harvard Business School, mais de 95% das decisões humanas são inconscientes. Isso significa que o consumidor não avalia racionalmente todas as alternativas, mas reage a estímulos baseados em padrões, emoções e sensações familiares. O cérebro, responsável por apenas 2% da massa corporal, consome até 20% da energia do corpo. Para economizar esse recurso, ele busca atalhos: as heurísticas. E é aí que os vieses cognitivos entram em cena, moldando silenciosamente o comportamento de milhões.

Dominar esses vieses é como conhecer o mapa oculto da jornada do cliente, e isso não precisa ser antiético, tampouco manipulação. Trata-se de compreender, com base científica, como o cérebro humano responde a determinados estímulos. A escassez, por exemplo, é percebida como uma ameaça à perda. Isso não é uma falha: é evolução. A Prospect Theory, desenvolvida por Kahneman e Tversky, mostra que as perdas são duas vezes mais impactantes do que os ganhos. Essa aversão à perda explica por que anúncios com “últimas unidades” ou “somente hoje” são tão eficazes: o cérebro entra em alerta.

Na fase da consideração, o cliente busca segurança e recorre ao que os outros fazem. Um estudo da NYU mostrou que avisos como “75% das pessoas reutilizam toalhas” aumentam significativamente a adesão ao comportamento. Isso é o viés da prova social em ação. Ao ver avaliações positivas ou recomendações nas plataformas digitais, o cérebro entende: “se outros aprovaram, provavelmente é seguro”. Já no momento da decisão, estratégias como a ancoragem — apresentar um preço mais alto antes do real — direcionam a percepção de valor.

Robert Cialdini, estudioso da psicologia da persuasão, sintetizou esse conhecimento em sete princípios universais, cada um alinhado a um viés específico. Reciprocidade, coerência, autoridade, afeição, escassez, aprovação social e unidade são chaves que, quando bem aplicadas, ativam mecanismos naturais do cérebro. E há evidências empíricas para cada um. No experimento de Regan (1971), pessoas que recebiam uma Coca-Cola compravam mais rifas por simples senso de obrigação social. Em outro caso, Freedman & Fraser (1966) mostraram que pequenos compromissos iniciais aumentam significativamente a probabilidade de aceitação de pedidos maiores depois.

O desafio ético, no entanto, permanece. Guiar a decisão do cliente exige responsabilidade. Não se trata de enganar, mas de construir experiências alinhadas aos princípios que governam nosso cérebro. Se o consumidor escolhe com emoção e padrões inconscientes, cabe ao profissional de comunicação entender que sua missão vai além do convencimento: é preciso criar conexões verdadeiras, transparentes e coerentes com esse funcionamento mental.

No fim das contas, compreender os vieses cognitivos é mais do que uma vantagem estratégica, é um convite à humildade. Revela que, apesar da nossa pretensa racionalidade, seguimos sendo guiados por atalhos ancestrais, que fazem da mente humana um terreno fértil para quem sabe escutá-la.

Evandro Lopes é CEO da SLComm, empreendedor, palestrante e consultor.

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