Eric Garmes, CEO da Paschoalotto

Empresas como agentes de transformação social: do call center à inclusão financeira

É preciso coragem para simplificar processos e reduzir barreiras de entrada, sabendo que milhões de brasileiros ainda vivem à margem da economia formal

Autor: Eric Garmes

Em sociedades marcadas por desigualdades profundas, as empresas carregam uma responsabilidade que vai muito além da eficiência operacional ou do crescimento financeiro. Mais do que nunca, consumidores, governos e comunidades esperam que o setor privado seja um ator ativo na construção de um país mais justo. Esse chamado não é abstrato, ele se materializa em práticas concretas, que unem propósito e resultado e que estão transformando dois mundos aparentemente distantes, os call centers e a inclusão financeira digital, em pilares de impacto social.

Os call centers sempre foram vistos como a linha de frente do relacionamento com clientes. Mas essa visão reducionista já não dá conta da realidade atual. Hoje, muitas empresas do setor deixaram de ser apenas “postos de atendimento” para se tornarem plataformas de relacionamento.

Em seus quadros, encontram espaço as mães solo que buscam conciliar renda e cuidado com os filhos, pessoas com mais de 50 anos que enfrentam a difícil reinserção no mercado, refugiados que chegam ao país em busca de dignidade, além de jovens em situação de vulnerabilidade que precisam da primeira chance para se desenvolver. O resultado é que cada ligação atendida carrega muito mais do que uma solução ao cliente, carrega também histórias de reconstrução de vidas.

Esse movimento é estratégico e humano ao mesmo tempo. Estratégico porque empresas que praticam esse tipo de relacionamento tendem a gerar maior engajamento, produtividade e até inovação. Afinal, diversidade amplia perspectivas. Humano porque, em um país em que o desemprego estrutural ainda atinge milhões, oferecer oportunidades significa literalmente transformar destinos.

A mesma lógica de empoderamento aparece na outra ponta, no sistema financeiro. Nos últimos anos, o Brasil viveu uma revolução silenciosa, mas profunda, a da inclusão financeira digital. Ainda assim, a exclusão não desapareceu. Segundo dados do Instituto Locomotiva, 4,6 milhões de brasileiros continuam desbancarizados e outros 29 milhões permanecem sub-bancarizados, utilizando de forma limitada suas contas e serviços. Esse cenário mostra que a inclusão não é um destino, mas uma jornada contínua.

É nesse vácuo que os bancos, fintechs e bancos digitais se consolidam como protagonistas. Ao reduzir burocracias, oferecer taxas menores e priorizar a experiência do usuário, essas empresas criam não só acesso, mas cidadania econômica, ou seja poder decidir, empreender, planejar o futuro.

A convergência do propósito corporativo

Quando colocamos lado a lado o call center que contrata quem foi historicamente excluído e as instituições financeiras que dão crédito ao microempreendedor da periferia, percebemos que se trata do mesmo movimento: ampliação de acesso.

Essa convergência revela o que está em jogo no século XXI: empresas não são apenas engrenagens da economia, mas arquitetas sociais. Elas têm o poder e a responsabilidade de reduzir desigualdades estruturais a partir de escolhas de gestão, cultura e estratégia. E não se trata de caridade e sim de visão de futuro.

Empresas com práticas sólidas de diversidade, equidade e inclusão têm resultados financeiros superiores à média de mercado. Da mesma forma, companhias que expandem o acesso a produtos e serviços básicos criam novos mercados, fidelizam clientes e constroem reputação. Em outras palavras, lucro e impacto não se anulam, se potencializam.

O futuro exigirá coragem corporativa. Coragem para investir em programas de formação e inclusão mesmo quando o retorno não é imediato. Coragem para simplificar processos e reduzir barreiras de entrada, sabendo que milhões de brasileiros ainda vivem à margem da economia formal. Coragem para reconhecer que ser relevante no mundo dos negócios passa, cada vez mais, por ser relevante para a sociedade.

Não há volta. A sociedade exige mais e os consumidores também. Do call center que abre portas para mães solo à plataforma digital que possibilita a primeira transação de um trabalhador informal, o que vemos é a mesma lógica em movimento: empresas se tornando vetores de justiça social.

E talvez essa seja a maior revolução do nosso tempo: descobrir que crescimento e inclusão não são caminhos opostos, mas complementares. Empresas que entendem isso não apenas fortalecem seus balanços, mas cumprem um papel histórico de transformar vidas enquanto crescem.

Eric Garmes é CEO da Paschoalotto.

Deixe um comentário

Rolar para cima