Como um grande palco de ensaio para a convergência total de mídias que se avizinha no horizonte dos próximos anos, a Internet vai-se firmando no País como forte canal de gestão de relacionamento com clientes, empregando ferramentas multicanal e combinação de meios. Em recente evento realizado em São Paulo pela eBusiness Brasil, ficou claro, entretanto, que adquirir, fidelizar e atender às demandas dos consumidores através da rede mundial tornou-se um complemento fundamental às ações de relacionamento, dependendo muito mais da cultura de conteúdo do que da tecnologia.
“Atualmente, o canal web, sozinho, não é essencial. Mas como alternativa complementar no relacionamento com os clientes se tornou fundamental. Um diferencial competitivo importante”. A constatação é de Richard Lowenthal, presidente executivo da eBusiness Brasil – Associação Brasileira de E-business – que reuniu em São Paulo, cases de empresas como a Phillips, Tecnisa, Fleury, Macromidia, Pirelli, Ford e Natura, no evento Marketing de Relacionamento na Web: Experiências e Resultados. Com exposição de casos e debates, as organizações convidadas e participantes puderam verificar os avanços que a atividade empresarial on-line vem trazendo para os negócios e para seus consumidores.
Benchmark mundial – Uma das tendências estratégicas que ficou evidente a partir dos cases estudados é a de fabricantes não concorrerem com seus parceiros intermediários, mas sim fortalecê-los ainda mais com o próprio uso da web. A Natura, por exemplo, realiza desde 1998 forte incentivo para que seu quadro de revendedores se utilize da rede, mantendo no entanto o mesmo esquema de vendas diretas do período pré-internet. Fábio Mengozi, ex-gerente do portal corporativo da empresa, informou que a Natura continua crescendo os mesmos 25% ao ano de antes do incremento do e-commerce. “A Internet é um complemento da venda direta”, afirmou Mengozi, salientando que “os investimentos em conteúdo para o usuário do site impulsionaram a aproximação dos consumidores com a marca e com os canais de revenda.” Sem citar números, em virtude de haver deixado recentemente seu cargo na fabricante de cométicos, ele falou da experiência do site como ferramenta para aumentar a base de clientes.
Já a Phillps do Brasil, uma das pioneiras em seu setor na busca por um marketing de relacionamento via ambiente virtual e que desde 2000 vem desenvolvendo o projeto Phillips e-com Você, a espinha dorsal da atividade na web é exatamente robustecer a malha varejista do segmento. De acordo com Flávio Dias Fonseca, gerente de E-business e CRM para a América Latina, a fabricante de eletroeletrônicos desenvolveu sua política de relacionamento no canal internet em dois estágios. Primeiro, se voltou para os parceiros que já possuíam um site em atividade. Depois, realizou várias campanhas e incentivos mostrando aos demais a importância de também atuarem na rede mundial.
Segundo o executivo da Phillps, o projeto se transformou num sucesso porque se assentou em três estratégias básicas: gerar leads (compradores em potencial) para o site dos lojistas a partir do portal Phillips, fornecer suporte integral dentro desse site e, por último, realizar ações de fidelização em campanhas de relacionamento em conjunto com a rede varejista. “Na prática – ressalta ele – conseguimos um retorno de mais de seis vezes em relação ao investimentos e, só como exemplo, em 2004 foram conseguidos cerca de R$ 1,2 milhões só em leads gerados a partir do site da Phillps para os comerciantes”.
As iniciativas inovadoras da empresa na web que, conforme conta Fábio Dias Fonseca, representam hoje cerca de 6% das vendas totais, passaram pelo acordo formal com buscadores de preços online e pela criação de ferramentas que permitem aos consumidores uma “experiência quase real” com o produto nos próprios sites dos lojistas. “Os consumidores que entram no noso portal corporativo podem saber onde e com que preço são vendidos os produtos desejados. Uma vez encaminhados ao site do nosso cliente varejista, ele pode acessar o ‘Assistente Virtual’ e a ‘Experimentaçao Virtual’, contando ainda com a orientação de nosso pessoal de suporte”. As soluções da subsidiária brasileira da Phillps que, segundo Fábio, foram sendo acompanhadas pela concorrência, se tornaram benchmark mundial como prática de e-business.
Relacionamento integrado – Já o desafiante e bem-sucedido projeto da Pirelli em integrar o conceito de CRM com a cadeia produtiva B2B foi abordado pelo diretor de TI da organização, Ricardo Miranda. Entre os resultados conquistados pela fabricante de pneus, Miranda destacou que no ano passado a empresa movimentou R$ 1,4 bilhões em transações pela internet. “São 1.200 pontos de venda da Pirelli ligados no B2B, com cerca de 22 mil acessos logados ao mês”. O maior desafio, segundo ele, além dos incrementos tecnológicos adequados, é que “o atendimento não pode ser robotizado, pois tanto o conceito de CRM quanto o de B2B tem que incentivar momentos memoráveis para o cliente”.
E a Pirelli acabou por se tornar um caso-modelo nessa operação. Basta dizer que hoje nada menos que 90% dos pneus da empresa são vendidos através do relacionamento na web. E tudo começou com uma pesquisa junto à própria rede de revenda para se descobrir como aproveitar o cotidiano da rede mundial que se instalava nas corporações. Em 2001 entrou no ar o Pirellinet, o portal corporativo de business to business. O próximo passo era incentivar e treinar toda a rede já que a adesão não era total. Foi quando a empresa desenvolveu um sistema de treinamento à distância que acabou envolvendo a todos. “Não acreditamos na tecnologia por si só. As pessoas são fundamentais. Por isso a Pirelli criou a figura do tutor no treinamento online dos revendedores”, salientou Ricardo Miranda.
O último e mais complexo passo seria criar um projeto de CRM, aproveitando-se dessa aproximação com seu canal de vendas. E surgiram, na empresa, os conceitos de B2C (CRM/Consumidor) e B2B (CRM corporativo). Essa integração, no entender do executivo da Pirelli, pressupõe a visão de um ambiente de B2B “rico’. O que deve englobar, além da geração de pedidos e cotações, catálogos, acompanhamento de pedidos, entre outros itens (veja quadro ao lado), também o suporte comercial e apoio integral às atividades de relacionamento. Também para um ambiente de CRM “rico”, ele traça um menu que vai desde a gestão de contatos, as atividades transacionais do relacionamento, até o entendimento de resultados e a simulação de ações , numa interação respeitosa com o cliente. E finaliza mostrando que, se no B2B a ação ativa é do cliente e a passiva é da corporação, no CRM é o contrário.
Extraindo valor – A análise de casos e mais casos de sucesso na relação empresa/consumidor dentro do ambiente virtual revela que, cada vez mais, as organizações se esforçam para transformar a internet também num centro de lucros. Sempre levando em conta que, além das atividades de e-commerce, a rede se mostra um excelente meio para reduzir custos, abreviar caminhos e apresentar altas taxas na relação custo /benefício.
O Laboratórios Fleury, por exemplo, trilhara o caminho da prestação de serviços até chegar na “extração de valor” via web. “A vocação do site do Fleury é a prestação de serviços, alinhada com a estratégia da organização que é a satisfação plena dos clientes”, esclarece Teresa Sacchetta, gerente de Relacionamento. Nesse portal, o carro-chefe são os resultados de exames, com mais de 2,5 mil acessos diários. E tem como diferencial a possibilidade de o cliente ver o histórico de todos os resultados anteriores. “Isso é fidelização”, diz ela.
O consumidor do Laboratório Fleury tem à disposição no site, também, exames de imagem tais como ultrassom e ecocardiograma, e podem acessar o “laudo executivo”, uma tela única que mostra a evolução dos exames. E uma ferramenta de relacionamento, com orientações via e-mail sobre planos de saúde, etc. Entretanto, o portal acaba difundindo material educacional para a classe médica, inovação tecnológica na área da saúde e alguns links segmentados para mulheres e crianças, por exemplo. O que, no entender da executiva “atrai novos clientes para o site, que deixa de ser um centro de despesas e agrega valor à organização. “Gastamos muito menos com atualizações de cadastros, telemarketing ativo, assessoria aos médicos, e divulgamos o laboratório graças aos diferenciais que apresentamos no site”.
Mesmo caminho adotou a Tecnisa, construtora e incorporadora brasileira criada em 1977. Através da prestação de serviços, a empresa espera que haja uma “forte identificaçao com a marca” proporcionando vendas e fidelização. “O portal da Tecnisa nos ajuda a transformar o internauta em comprador e, depois, em advogado de nossa marca”, ressalta Alejandro Dicovisky, gerente de E-business. Cerca de 650 mil pessoas navegaram no portal da construtora em 2004, informa o executivo, embora não saiba dizer quantos desses internautas estavam entre os 8 mil que acabaram visitando os stands de vendas no mesmo período.
Mas, em matéria de números, Alejandro apresenta um que impressiona. Fazendo as contas, a empresa notou que, enquanto o custo para se levar um provável cliente ao empreendimento em exposição, através dos meios tradicionais de marketing, é de R$ 1.150, por pessoa, na mídia web cai para R$ 1,00 por visitante. “Cerca de 75% dos imóveis foram comercializados para pessoas que estiveram pelo menos uma vez visitando nosso site”, complementa o executivo.
O grande desafio da Tecnisa era reduzir o que eles chamam de “ansiedade pós-venda” – o tempo intermediário entre o fechamento de contrato e a entrega das chaves. E a internet foi fundamental nesse processo. Segundo Alejandro, o status da obra é atualizada mensalmente no portal. O comprador pode verificar o estágio do empreendimento e, além disso, é recebido no site com uma saudação em áudio personalizada. “Fizemos, também – acrescenta o executivo da Tecnisa – através do portal, programas de marketing segmentado, aproveitando, por exemplo, a tendência do que ele chama de ‘mulherização’ na aquisição de imóveis, já que hoje perto de 90% das decisões de compras imobiliárias estão com as pessoas do sexo feminino”.
Internet rica – O segredo da utilização da Internet no relacionamento com os clientes está no modelo de negócio e não na tecnologia. Essa afirmação poderia parecer paradoxal vindo de um profissional voltado para a comercialização de ferramentas tecnológicas para aplicativos na web. Entretanto, ao ser proferida por Antonio Luiz Schuch, ex-gerente de Vendas Corporativas da Dell Computadores e agora Country Manager da Macromídia no Brasil, apenas marcou uma apresentação que impressionou grande parte dos participantes do evento, por abordar conceitos poucos discutidos em eventos e na mídia em geral.
Ao apresentar os produtos Macromídia Flex e Macromidia Breeze, Shuch mostrou a importância de se incorporar nas políticas de relacionamento via rede mundial o conceito de RIA – Rich Internet Aplication. “Uma internet tão rica quanto um comercial de TV, a um custo infinitamente menor”. Exibindo exemplos numa conexão online, o executivo demonstrou que deverá mesmo ficar ultrapassada a visão que associa website com navegação em páginas.
“Por causa da cultura dos livros, nos acostumamos a visualizar a web como um roteiro de páginas que aparecem em seqüência. Isso é errado”, opinou Antonio Luiz Schuch, exibindo uma tela na qual as páginas são substituídas por códigos. Surgem as camadas que interessam ao internauta pesquisar, e não mais rolagem de páginas. O que considera um grande avanço em favor do conceito de usabilidade e da simplicidade, diminuindo muito a “taxa de abandono” dos usuários. “Só para citar um exemplo, uma rede de hotéis da Europa aumentou suas vendas em 47%, de um dia para o outro, apenas aplicando esse novo conceito e diminuindo a taxa de abandono em 3%”.
Aconselhando os profissionais a pensarem na Internet não mais como uma plataforma de páginas, mas como “uma plataforma de conteúdo, aplicação e comunicação de alto impacto”, propiciando experiências memoráveis aos clientes, Schuch explicou que o Macromidia Flex é um presentation server que resolve o desenvolvimento da camada de apresentaçao, e assim complementa os aplication servers existentes. E permite que os desenvolvedores tirem proveito da plataforma Flash Player já presente em mais de 90% dos computadores em nível mundial.