Empresas almejam remuneração variável


Luiz Felipe Cortoni

Forma de reconhecimento e motivação que substituiu as promoções hierárquicas, a remuneração variável traz conseqüências nem sempre tão positivas para os colaboradores e principalmente para a organização. Praticamente impensável há alguns anos, a remuneração variável (como forma de compensação financeira pelo esforço das pessoas em produzir resultados nas empresas) é hoje reconhecidamente um dos produtos mais cobiçados das atuais políticas de RH.

Na verdade, uma lógica maior por trás desta ferramenta deu condições para que ela aparecesse com peso e legitimidade no contexto organizacional: a lógica financeira. Esta “força” tem invadido e condicionado a maior parte das políticas e estratégias organizacionais nos últimos tempos. Ou o resultado financeiro aparece e é o grande objetivo a ser produzido, ou nada fará sentido na empresa. Parece uma lógica reducionista, porém tem sido disseminada como o sentido da existência organizacional e da sobrevivência do acionista. Tudo se subordina a ela.

Neste contexto nasceu a remuneração variável. Se por um lado é filha da racionalidade financeira, por outro veio resolver uma equação que até os anos 90 ainda não tinha sido decifrada, talvez exatamente porque os cenários internos ainda não fossem “estabelecidos” o suficiente. Como motivar pessoas sem movimentá-las na estrutura de cargos e posições da empresa? Até então (com as exceções de sempre – os vendedores, e os raros prêmios de algumas empresas) não era possível conceber um aumento de salário sem a devida movimentação na estrutura e a indesejável incorporação ao salário fixo.

Nestas épocas, uma movimentação vertical ascendente ou promoção, era a grande aspiração de todo funcionário, pois em termos de motivação o pacote vinha completo. Proporcionava pelo menos quatro níveis motivacionais se considerarmos apenas a teoria do velho e bom dr. Maslow: segurança no emprego, reconhecimento, auto-estima positiva e auto-realização. Ou seja, era muito potente o impacto na pessoa, em sua performance e no seu vínculo com a empresa.

A promoção era, e ainda é, um tipo de movimentação que mobiliza as aspirações das pessoas, mas que hoje é utilizada com baixíssima freqüência, principalmente em função das estruturas enxutas que as empresas desenvolveram para enfrentar os novos tempos. Movimentar-se na vertical ascendente hoje é quase um privilégio.

Pois bem, e o que fazer com as aspirações motivacionais neste novo quadro? Como administrar pessoas com esta séria restrição, num cenário de alta competitividade em que a motivação é sinônimo de comprometimento com resultados?

Tudo “conspirava” para o nascimento da remuneração variável.

Porém, vamos concentrar a análise no impacto desta ferramenta sobre a performance e o vínculo da pessoa com seu trabalho. Aqui, parece estarmos diante de um dilema velho conhecido, e que reapareceu “modernizado”. Sabemos que a compensação financeira provoca saltos significativos na performance das pessoas, mas não consegue sustentá-la em alta por tempos muito longos. Diferentemente de formas sociais de reconhecimento, a performance tende a cair “na espera” de outro estímulo financeira.

Dito de outra forma, este tipo de recompensa condiciona a performance à sua presença. Portanto, na sua ausência, a performance cai de freqüência e tende a desaparecer. O dilema entre condicionar ou motivar pessoas para o trabalho reaparece com toda força em novo contexto.

Em relação ao contrato psicológico (vínculo) da pessoa com a empresa, pode-se dizer que certamente este tipo de recompensa faz o vínculo se volatilizar. Isto porque pessoas altamente orientadas no sentido das recompensas financeiras transferem esta lógica ao seu vínculo com a empresa e estabelecem sua permanência ali ou nos trabalhos para os quais são responsáveis. Quer dizer, será necessário ganhar sempre para que a performance se sustente, e quando o ganho não vem a relação de permanência é questionada. Mais ainda, sabemos que pessoas que se vinculam por condicionamento desenvolvem insuficientemente outros comportamentos desejados na administração contemporânea: comprometimento com resultados, interesse em inovar, trabalho com qualidade…

Desta forma, o que se apresenta como desafio é como garantir ambientes de alta performance e de vínculos compromissados entre pessoas e empresa com as restrições da mais poderosa recompensa utilizada hoje: o dinheiro. Nem Taylor saberia sair desta, mesmo sendo ele um dos pais da idéia.

Luis Felipe Cortoni, professor da Fundação Vanzolini (USP) e sócio-diretor da LCZ Desenvolvimento de Pessoas e Organizações.

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