O pesadelo dos empresários

Autor: Edilson Menezes
Naquela empresa, quando o telefone soa com apenas um toque intermitente, é ramal; alguém da empresa está ligando. Dois toques intermitentes é ligação externa.
São 8h30m e Ricardo mal acordou. Fisicamente, está ali, mas o cérebro ainda está na cama, de onde saiu pensando na frase que motiva a maioria dos brasileiros:
– Não tem outro jeito, bora levantar e ir pra luta!
Voltando ao telefone, que agora já tinha tocado seis vezes, Ricardo pensa: Caramba, não desiste; vou ter que atender esta m… Esse pessoal não tem o que fazer mesmo. Isso é hora de incomodar? Nem me sentei direito!
Quando estica o braço para tirar o fone do gancho, Ricardo bate a mão no copo de café, que escorre pela mesa. Pragueja. Fica vermelho. Os colegas olham para ele. O da esquerda oferece um sorriso de deboche, do tipo: se ferrou. O da direita oferece um sorriso gentil, do tipo: relaxe, isso acontece! E a colega cuja mesa fica de frente para Ricardo, ágil, já está diante dele, com guardanapos de papel na mão.
Ricardo não chega a sorrir, apenas faz um movimento incompreensível com a boca, ao perceber que está sendo salvo e só então se lembra do telefone que tirou do gancho, não atendeu e corre para falar:
– Alô!
Era o diretor geral na linha.
– Ricardo, é o Sampaio. Posso saber por que a demora para atender e por que me deixou pendurado na linha te esperando?
Gagueira. Hesitação. Silêncio. Pavor.
Sampaio é daqueles chefes que não tolera nada errado. Funcionário deve estar em sua mesa pronto para atender assim que o relógio marca o horário estabelecido pela empresa.
– É que, de-desculpe, Sampaio. Derrubei café quando fui atender!
– E a mesa representa o seu ambiente de trabalho ou uma cafeteria?
Silêncio.
– Ricardo, fiz uma pergunta!
– O meu ambiente de trabalho, Sampaio. Desculpe! – responde, enquanto seus olhos giram 180 graus, em sinal de tédio.
– Bom, paciência, já pedi pra não usarem a mesa como cafeteria, mas vocês não têm jeito. Venha até minha sala assim que possível!
Ele ia responder que sim, mas não deu tempo. Sampaio já tinha desligado.
Odeio esse cara! – pensa Ricardo.
O vizinho da esquerda, aquele que sorriu com deboche, chega para Ricardo e diz:
– O dia não começou bem, hein, parceiro? Pela sua cara, aposto que era o Sampaio importunando logo cedo!
– Acertou, era aquele mala, mas vê se me erra você também!
Minutos depois, já com a mesa limpa, Ricardo se levanta e vai até a mesa do gentil vizinho da direita, aquele que sorriu com generosidade quando o café caiu. Ricardo diz:
– Leandro, o Sampaio pediu que eu vá até a sala dele. Com certeza, é sobre o relatório que encomendou ontem e eu não sei como preparar. Você que conhece bem o sistema novo, pode me ajudar? Detesto mudança, o sistema antigo era tão prático…
Leandro olha bem para Ricardo e solta:
– Ricardo, depende… Se você disser “bom dia”, te ajudo!
– Deixa pra lá, eu me viro!
Ricardo sai bufando e pensando: gente cheia de frescura, pô! Tudo que se pede precisa de sorrisinho, de nhem, nhem, nhem…
De tão envenenado com a própria amargura e má vontade que já levou de casa, ele não percebeu que o amigo estava apenas tentando, em vão, acalmá-lo. Ele então vai até a mesa que fica de frente para a sua, onde estava aquela moça gentil que entregara os guardanapos. Quando o vê chegando, ela abre um novo sorriso e diz:
– Agora sim… Bom dia! Naquele instante, você estava com telefone na mão e café na mesa, então eu nem te cumprimentei.
– Ah, nem esquente com isso, não sou como uns e outros, cheios de melindre. – e assim dizendo, Ricardo olha na direção do amigo Leandro, que apenas sorri e balança a cabeça, em tom de não adianta. – Sabe o que é, Débora? Preciso de ajuda com um relatório que o Sampaio me pediu desde ontem, mas já tentei e o sistema novo tá me dando um baile!
Débora olha com afeto para Ricardo.
– Pegue uma cadeira e coloque do meu lado, Ricardo. Vou te ensinar, mas tem uma condição. Eu escutei o que você disse ao Leandro. Vá até a máquina, pegue um café pra ele e peça desculpas. É o justo. Ah, me lembrei… Ele gosta com pouco açúcar!
O irritadinho se vê num beco sem saída, mas acaba cedendo. Quando chega à mesa de Leandro, entrega o café e procura se redimir.
– Leandro, me desculpe. O Sampaio tá me deixando doido. Aceite este café como bandeira de paz?
Leandro olha fixamente para Ricardo e reflete por uns segundos antes de responder.
– É claro que posso desculpar, eu entendo. Aproveitando, vou adiantar uma informação pra você. Fui promovido na tarde de ontem. O Sampaio vai se aposentar e a partir de hoje, serei o diretor geral. Eles anunciarão até o fim do dia. E relaxe, o Sampaio não quer relatório algum. Ele quer apenas te dar um toque para mudar, afinal há 10 anos você tá na mesma função. Sacou?
A postura de Ricardo mudou imediatamente.
– Pô, chefe, agora é que me desculpo meeeesmo! Já imaginou se você fosse um cara rancoroso? Eu já estaria demitido.
– Aí é que você se engana, Ricardo. É justamente isso que você deve mudar. Não se trata líder com respeito e colegas de função como se não existissem!
Percebe, leitor (a), como o clima organizacional agradável depende muito mais das atitudes e reações das pessoas? Há quem alegue que esta é uma questão circunstancial, que se a empresa oferece condições justas e prazerosas para o trabalho, automaticamente o clima é bom, que, que, que…
São falácias. A empresa pode e deve colaborar, mas as pessoas fazem o clima, que por sua vez se torna harmônico sem a necessidade de considerar a cascata hierárquica. Do CEO ao faxineiro, quando os funcionários estão dispostos a olhar o todo, a pensar em cada ser humano, investindo nos relacionamentos interpessoais, todos ganham. É simples, mas não é fácil.
Treine a sua equipe emocionalmente e cuidado com a armadilha corporativa que faz empresários destinarem verba de treinamento somente para preencher carências técnicas.
Ambos são de suma importância. De nada adianta uma equipe eficiente no que faz (razão), mas péssima em relacionamento (emoção).
No exemplo citado, Ricardo estava fazendo o que na empresa? Não se mantém um funcionário desmotivado, ranzinza, por 10 anos na mesma função, por melhor que seja.
Demitir faz parte do processo de recursos humanos e gera amadurecimento em ambos: contratante e contratado. Depois que retirar da empresa os vampiros energéticos como Ricardo, será o momento de investir com coragem na inteligência emocional.
Concluindo, ainda tem muito profissional de RH e até mesmo empresários supondo que demitir gente atuante na empresa há muitos anos sai caro.
Isso é investimento, porque oneroso de verdade é manter na equipe alguém que atende clientes internos e externos com má vontade, se relaciona com mediocridade, vai trabalhar como se estivesse prestando um grande favor para a empresa e de quebra atrasa o crescimento dos pares, porque vive a repetir seu mantra:
– Faço só o que a empresa me paga. Não sou como os puxa-sacos que se matam de trabalhar!
A maior e mais poderosa lei do desenvolvimento humano pede sua atenção…
A tarefa de motivar e inspirar pessoas demanda investimento de tempo, dinheiro, dedicação, treinamento, atenção constante e servidão dos líderes. A tarefa de desmotivar pessoas requer apenas um falso motivado no grupo.
Mas a escolha, como sempre, é apenas sua!
Edilson Menezes é treinador comportamental e consultor literário. Atua nas áreas de vendas, motivação, liderança e coesão de equipes. ([email protected])
Nota do autor: Gratidão, Giovanna Palacio, por me pedir que escrevesse sobre este tema.

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