Ninguém gosta de ser ameaçado, xingado ou humilhado, ainda mais no ambiente de trabalho, na frente de outros profissionais. Porém, por mais que isso seja visto como algo errado, não são poucos os casos em que há um desvio de conduto dos líderes na hora de cobrar os colaboradores diante de metas agressivas. Por isso, todo cuidado é pouco na hora de dar um feedback ou exigir mais do colaborador. Afinal, se o gestor passar do limite do bom senso pode ser considerado um assédio moral, com prejuízos enormes para a empresa. Mais do que receber processo, há o risco de criar um ambiente de medo e preocupações, com profissionais desmotivados e um alto turnover. E no fim, ao invés de bater as metas, a empresa pode amargar uma queda na produtividade. “O assédio moral caracteriza-se pela repetição de atos que fragilizam qualquer performance laboral. Logo, teríamos um quadro pouco colaborativo e doente, fatos que comprometem significativamente o resultado da companhia”, explica Kelly Cortes, superintendente nacional de desenvolvimento humano.
De acordo com Mauro Scheer Luís, advogado de Scheer & Advogados Associados, o assédio moral no ambiente de trabalho é caracterizado quando o profissional sofre de forma frequente/constante com atitudes ilícitas de seus chefes (assédio vertical) ou até mesmo de seus companheiros de trabalho (assédio horizontal) que lhe causam sofrimento e dor moral. Em geral, ocorre com a prática sistemática de algumas atitudes, diferenciando-se de atos isolados e pontuais, que podem até caracterizar dano moral, mas não assédio moral. “O assédio pode ocorrer, por exemplo, com a designação de apelidos desagradáveis, cobrança de metas excessivas e de impossível cumprimento, alteração de função do profissional com o único e exclusivo motivo de vingar-se ou puni-lo, concessão de ´premiações´ não desejadas, tratamento desrespeitoso, com gritos, voz alta, etc”, detalha.
Assim, ele provoca a degradação do ambiente de trabalho, que passa a comportar atitudes arbitrárias e negativas, causando prejuízos a todos, inclusive no desempenho dos funcionários, que acaba por refletir na produtividade da empresa como um todo, bem como aumentando o índice de rotatividade de colaboradores. Para Watson Pacheco da Silva, advogado, especialista em Gestão Empresarial e Direito da Empresa, associado do Escritório Terçariol, Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados, a humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador de modo direto, ocasionando graves danos à saúde física e mental, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte. “Trata-se de um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho.
O filósofo-eticista e consultor da Aprendendo a Pensar, Francisco Santos, explica que o modelo que formou o gestor com característica predadora é o grande responsável por isso. “Essas pessoas ´predadoras´, por ocasião de uma situação que exige maiores e melhores resultados, não têm repertório para agir de forma menos truculenta e, perdem a mão exagerando nas cobranças. É pura transferência de medo. Coerção.” O efeito disso não são melhores resultados, mas conflito e ansiedade na equipe. “Trabalhar com medo, não habilita a criatividade nos momentos de crise, pelo contrário, destrói.” Sendo assim, o consultor acredita que a mudança do modelo mental predador deve ser objetivo de todas as organizações, pois já não vê mais espaço para esse tipo de organização. “O capitalismo deve mudar as métricas que demonstram o sucesso de uma empresa. Hoje, essas métricas são apenas da ordem financeira e econômica. Uma empresa é considerada de sucesso se acumulou bens. Isso tem que mudar”, sentencia.
Isso já acontece com as empresas que sabem, efetivamente, “para quê existem” e não precisam utilizar de pressão emocional para obter resultados. Essas engajam e inspiram os colaboradores a agirem em função de uma causa e não de metas sem significados, de acordo com Santos. “Se o líder tem uma postura mais humana e colaborativa, ele dividirá seus objetivos com a equipe e juntos conseguirão atingir o que esperam deles. É óbvio que essa postura deve ser genuína e iniciar com o principal executivo”, completa. Ou seja, é necessário instituir na empresa uma agenda ética para tratar das condutas das pessoas de forma estruturada e reflexiva.
A principal medida de prevenção passa ser então a informação sobre as características do assédio moral e suas consequências aos trabalhadores, sobretudo aqueles que exercem cargo de confiança, segundo Silva. “É imperioso ensinar a gerentes e chefes ´como´ cobrar e advertir os subordinados.” Por isso, é fundamental que a empresa tenha, primeiramente, procedimentos operacionais bem definidos e manual de descrição de cargos com o perfil descrito por competências, segundo Kelly. Ou seja, ter a pessoa certa, no lugar certo e que ela saiba exatamente o que precisa fazer. Após esse nivelamento de informações, a executiva coloca como essencial ter atenção ao processo de formação das lideranças, “visto que é muito tênue a linha entre cobrança de metas e um possível assédio moral”. “A liderança é um ponto basal para o sucesso de qualquer segmento empresarial, tanto do ponto de vista de atendimento aos indicadores de desempenho, quanto na gestão de pessoas e disponibilização de um clima organizacional saudável. Assim, o desenvolvimento deve ser contínuo e estruturado”, completa.
Além disso, o gestor precisa ter o discernimento de que as metas e a cobrança pelo atingimento das mesmas precisam do bom senso comum, defende Miriam Adriana Migliorini Viecili, diretora da ABS Brasil. Mais do que metas realistas, a executiva acrescenta que é preciso que a cobrança seja realizada pelo gestor, o qual não só é um líder, como também deve realizar o coaching de sua equipe. “É, pois, fundamental que o gestor entenda como cada membro de sua equipe reage à pressão por resultado, hoje inerente em qualquer segmento do mercado de trabalho.” Nesse sentido, Miriam destaca que 85% dos líderes da ABS Brasil são oriundos das bases das operações, ou seja, já tem incorporado o DNA da empresa. “Toda a formação desses gestores está pautada no princípio que o líder é um coach, pois sabemos que a cobrança só pela cobrança não garante o bom resultado.”
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