Autor: Wilson Justo
Nos anos 80, até o início da década de 90, o Brasil conheceu a chamada hiperinflação. De acordo com dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), entre 1980 e 1989, a inflação média no país foi de 233,5% ao ano (a.a.). Na década seguinte, mais precisamente de 1990 a 1999, esse número mais que dobrou e chegou a 499,2% a.a.
Os números exorbitantes contribuíram para corroer o já reduzido poder de compra do consumidor; desvalorizar ainda mais a moeda nacional (Cruzeiro, Cruzado, Cruzado Novo, Cruzeiro novamente, Cruzeiro Real e, por fim, Real) e continuar provocando a alta generalizada dos preços, resultando em recessão. Depois de um longo período turbulento, a economia voltou a se estabilizar a partir da criação do Plano Real, em 1994.
Uma vez com o cenário econômico brasileiro voltando a entrar nos eixos, a população readquiriu um hábito há muito abandonado: o de ir às compras. O consumo voltou a impulsionar o varejo e foi visto um movimento de ascensão das classes sociais. Surgia, ali, a nova classe média (de acordo com a pesquisa Data Federal, da Secretária de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, quase quarenta milhões de brasileiros migraram para a classe C entre 2001 e 2011). Esta parcela da população deixava para trás as condições de vida miseráveis – marca da classe pobre brasileira desde o início da colonização do Brasil – e passava a vivenciar uma nova realidade social.
Este novo grupo se tornou a menina dos olhos para o comércio, que abriu as suas portas oferecendo crédito com juros baixos. Imóveis, viagens, eletroeletrônicos, automóveis, viagens, eletrodomésticos e bens de consumo deixaram de ser sonho e se tornaram reais para milhões de brasileiros. Os números comprovam esta ascensão: em 2005, a classe média representava 34% da população; saltou para 36% em 2006; depois para 46% em 2007 e, hoje, passa de 50% dos brasileiros.
Mas, seguindo o movimento de desaceleração vivenciado pelo Brasil e por outros países de 2014 para cá, o cenário passou a ser outro. Contudo, isto não quer dizer que a classe média irá deixar de consumir. A diferença, neste momento, é que estas pessoas pensarão mais antes de comprar e o mercado terá de redesenhar as estratégias para atraí-las, seja para compras à vista ou parceladas (e aqui, sobretudo, usando o cartão de crédito).
E o mercado não pode titubear quando o assunto é o consumo por parte da Classe C. De acordo com uma pesquisa do “Instituto Data Popular”, em 2005, o poder de compra foi de, aproximadamente, R$ 790 bilhões e, para 2015, a estimativa girou em torno de R$ 1,35 trilhão. Como se percebe, o crédito nunca foi tão importante para estas pessoas. Entretanto, vale ressaltar que, se para a classe A o cartão de crédito funciona mais como um meio de pagamento, substituindo o dinheiro em espécie, para a C ele é comprovadamente o instrumento de crédito. E cada vez mais ela o usa para os seus gastos básicos como alimentação, saúde e educação, além de tê-lo como suporte para situações emergenciais. E assim como já é na maior parte das famílias, o poder de decisão sobre como e onde usá-lo está nas mãos das mulheres.
A crise não acabará com o consumo, mas irá reduzi-lo. Mais do que nunca é o momento de repensar as estratégias para atrairmos novos clientes, principalmente com produtos diferenciados e inovadores.
Wilson Justo é diretor de marketing e relacionamento da Sorocred.