Dinheiro-móvel seria o futuro?

Imagine sua vida sem acesso ao que bilhões de pessoas chamam de serviços financeiros básicos: pagamento de contas, empréstimos, acesso ao crédito e envio de dinheiro para parentes e amigos. Difícil de imaginar, não é? Mas esta é a realidade de 2,5 bilhões de pessoas no mundo que não têm conta bancária. No Brasil, esse contingente é de metade da população economicamente ativa (55 milhões de pessoas). Como resultado, 51% dos brasileiros que trabalham ainda são pagos em dinheiro, girando, apenas em 2013, o equivalente ao PIB da Colômbia (R$ 665 bilhões).
Felizmente, 1,7 bilhão das pessoas sem conta bancária no mundo possuem um telefone móvel com internet, o que significa que quase 68% dos usuários de celular sem conta bancária têm a oportunidade de utilizar serviços financeiros surpreendentemente econômicos, seguros e convenientes. Ainda existe, porém, uma lacuna entre ter uma oportunidade e realmente aproveitá-la. De acordo com o Groupe Spéciale Mobile Association (GSMA), apenas 61 milhões daquele estimado 1,7 bilhão sem conta bancária e com aparelho celular são usuários ativos de serviços financeiros móveis.
A razão dessa baixa penetração talvez esteja ligada aos fenômenos Catch-22 ligados a eles, que é quando uma exigência não pode ser atendida até que um pré-requisito seja cumprido, mas, para tanto, ele precisa da exigência. Desta forma, enquanto o dinheiro móvel tem o potencial de revolucionar a vida dos consumidores que hoje vivem sem serviços financeiros, o sucesso desse ecossistema depende também de sua adoção por agentes e comerciantes. Afinal, se os três não estiverem comprometidos, os serviços não funcionam, pois os consumidores relutam em usar os serviços de dinheiro móvel sem a presença de agentes ou de comerciantes, ou de ambos. Sem uma massa crítica de clientes prontos para entrar no sistema, os agentes e os comerciantes ficam hesitantes e desmotivados para subir a bordo.
Esta é a hora dos prestadores de serviços financeiros móveis desenvolverem as estratégias de negócios adequadas que atrairão todos os participantes para o jogo, demonstrando claramente as vantagens do dinheiro móvel sobre o seu principal concorrente: o dinheiro vivo. E não existem duas maneiras de fazer isso. Os serviços financeiros móveis não vão realmente pegar sem a presença de uma sólida rede de agentes financeiros móveis com cobertura em áreas geográficas sem agências bancárias ou caixas eletrônicos. 
A principal entidade a ser procurada pelos usuários de dinheiro móvel é a dos agentes que dão acesso aos serviços de entrada e saída de dinheiro (cash-in e cash-out). Mas, em vez de utilizarem o seu capital de giro para a compra de estoque de itens de giro rápido como produtos e recargas, os agentes são obrigados a financiar os serviços de cash-out – que pesarão significativamente em seu retorno financeiro.
Os prestadores de serviços financeiros móveis precisarão delinear claramente os benefícios, tanto de curto quanto de longo prazo, e fornecer aos agentes as ferramentas necessárias para gerir eficazmente sua liquidez e fluxo de caixa. Esperar que esse serviço amadureça pode parecer contraproducente para os agentes, mas assim que a adoção de dinheiro móvel comece a expandir, os agentes serão os grandes vencedores, ganhando negócios adicionais e lucrando com novas ofertas de linhas de produtos.
Os comerciantes enfrentam desafios ligeiramente diferentes, pois poderão lidar com períodos de liquidação mais longos impostos pelo dinheiro móvel, basicamente comprometendo o seu capital de giro. Eles precisarão de tecnologia e ferramentas adequadas. Entre estas, estão os sistemas de ponto de venda, bem como a experiência no uso de seus novos equipamentos. A medida que a adoção de dinheiro móvel se expanda, os comerciantes poderão usar o dinheiro móvel para pagar seus fornecedores, de pessoa jurídica para pessoa jurídica. Porém, se os consumidores demorarem a adotar o sistema, os comerciantes não terão retorno financeiro adequado para transformar isso tudo em uma empresa lucrativa.
Será então que o dinheiro móvel superará os benefícios do dinheiro vivo em qualquer nível? Na verdade, sim. O dinheiro móvel oferece mais segurança contra risco e roubo, oferecendo a paz de espírito que está praticamente ausente no dinheiro vivo. Mas o que os consumidores realmente querem, acima de tudo, é a simplicidade, a conveniência, e um elevado status social. 
No final das contas, serão os fornecedores de serviços financeiros móveis que conduzirão a adoção do sistema de dinheiro móvel, se conseguirem trazer todos os jogadores para dentro do ecossistema para comprovar seus benefícios. Os prestadores de serviços financeiros móveis ainda precisarão demonstrar a capacidade desse ecossistema de maximizar o cash-in e minimizar o cash-out, além de demonstrar a necessidade e o valor das transações de dinheiro móvel no longo prazo.
Nelson Wang é vice-presidente regional de negócios para CALA (América Latina e Caribe) da Amdocs. 

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