O futuro do atendimento ao cliente não será sobre substituir pessoas por máquinas, mas sobre ampliar a potência das relações
Autor: Eric Garmes
Existe um traço humano curioso que diz muito sobre o atendimento ao cliente: somos apegados a pequenos gestos de atenção. Um recado deixado sobre a mesa, um bilhete escrito à mão, uma resposta inesperada que chega no momento certo. É por isso que, ao fazer uma pergunta ao ChatGPT e receber uma resposta clara e útil, muitas pessoas agradecem, mesmo sabendo que estão interagindo com uma máquina. Não é o algoritmo que nos emociona, mas a sensação de ter sido atendido com cuidado.
Esse é o paradoxo central do futuro do Customer Experience (CX). De um lado, o cliente quer sentir que há alguém, ou algo, genuinamente interessado em ajudá-lo. De outro, a tecnologia avança para oferecer interações rápidas, personalizadas e cada vez mais assertivas. E, ao contrário de nós, a inteligência artificial não carrega ego, não disputa espaço, não ostenta um crachá.
O crachá, aliás, é um símbolo ambíguo. Representa pertencimento e autoridade, mas, em muitos casos, funciona como uma couraça: ao vesti-lo, alguns profissionais erguem barreiras emocionais, transformando o cliente em “o outro” — quase um adversário. A IA não faz isso. Ela não se ofende, não interpreta mal, não cria resistência. Ela apenas responde.
Talvez seja essa ausência de ego que explique por que a inteligência artificial começa a conquistar um espaço tão relevante no atendimento. O relatório da Genesys mostra que 64% dos consumidores acreditam que a IA pode melhorar a qualidade das interações, especialmente quando aplicada para personalizar experiências E a personalização, hoje, deixou de ser diferencial: segundo a Zendesk, 88% das lideranças em CX a consideram prioridade estratégica, enquanto dados da Twilio Segment indicam que 64% dos consumidores abandonam marcas que não personalizam suas comunicações.
Essa transformação não se limita a chatbots mais avançados. Ela se desdobra em tendências claras que já redesenham o setor. A primeira é a personalização radical, baseada em dados em tempo real e no entendimento preciso do comportamento individual de cada cliente.
A segunda é a omnicanalidade plena, capaz de integrar canais físicos e digitais sem fricção e a terceira é a proatividade, ou seja, a capacidade de prever e resolver problemas antes que o cliente precise solicitar ajuda, fortalecendo a percepção de valor e confiança.
Outro vetor é a evolução das interfaces de linguagem natural e voz. Com os avanços dos modelos de linguagem, as máquinas já entendem nuances como ironia, hesitação e variações emocionais, tornando a interação mais próxima de uma conversa real. Isso se soma à automação inteligente, que libera os times humanos para questões mais complexas.
Mas há uma camada invisível sustentando todo esse movimento: a segurança da informação. Um levantamento da Salesforce que aponta que 32% dos consumidores globalmente não confiam que as empresas respeitam sua privacidade e 43% não confiam no uso ético da IA.
Por isso, não haverá futuro saudável para o CX sem confiança. Investir em tecnologia de proteção é essencial, mas igualmente importante será adotar políticas transparentes e éticas no uso das informações.
O futuro do atendimento ao cliente não será sobre substituir pessoas por máquinas, mas sobre ampliar a potência das relações. Isso significa desapegar de práticas antigas, como o distanciamento que o crachá pode simbolizar e adotar uma postura mais aberta, colaborativa e sensível às necessidades reais do consumidor.
Afinal, se uma máquina que não sente nem possui ego é capaz de responder com precisão e consistência, o mínimo que podemos fazer é colocar, de volta, o humano no centro do relacionamento desta vez, com a ajuda da tecnologia para potencializar essa experiência.
Eric Garmes é CEO da Paschoalotto.