Responsabilidade ou culpa?



Pesquisando alguns dicionários e lendo algumas definições em torno de responsabilidade e culpa  é certo de que ninguém pode ser considerado culpado até que seja provada a sua culpa. Intencional ou não. Entretanto responsabilidade não necessariamente requer uma prova ou investigação, pois muitas vezes ela decorre de uma profissão, função ou cargo que o indivíduo ocupa.  Um médico é responsável pela vida do paciente embora possa não ser culpado, e geralmente não é, de um óbito, quando infelizmente ocorre.


Não sou estudioso nem tenho experiência suficiente em culturas estrangeiras ou hábitos em outros países, mas tenho a impressão de que tem coisas que acontecem aqui em nosso país que não acontecem em outros do mundo dito civilizado. Não do jeitinho que vemos aqui.  Aqueles que me lêem, fiquem a vontade para comentar e discutir este assunto. 

Uma destas coisas é o tratamento que se dá a responsabilidade. Aqui ninguém é responsável. Se algo que não deveria acontecer, por um acaso acontece, é muito comum aquele que naturalmente pela sua profissão, função ou cargo é o responsável alegar imediatamente ignorância. “Eu não sabia de nada”, “Tenho muitas pessoas cuidando disto, como poderia saber?”. Contudo, quase que imediatamente declara, “vamos investigar profundamente os fatos e se houverem culpados, estes serão severamente punidos” ou “vamos fazer uma reunião imediatament para discutir o assunto”.

Nas relações de consumo, é muito comum um gerente, diretor ou presidente de uma empresa não saber o que acontece.  “Preciso averiguar com o nosso coordenador de suporte, este tipo de ocorrência é responsabilidade dele” me disse um destes executivos que atua no segmento de internet. Imediatamente retruquei: “nada disto meu senhor, a responsabilidade é sua”. Se alguém resolve deliberadamente antecipar em um mes as datas de vencimento de todos os serviços só porque alguns reclamaram que os avisos vêm em cima da hora, este talvez tenha a culpa de ter tomado uma ação sem sentido e colocar em risco a credibilidade da organização. Mas a responsabilidade de deliberadamente alterar contratos de prestação de serviço em prejuízo do cliente, violar leis e executar práticas comerciais discutíveis é do presidente da empresa. Mesmo que ele não tenha culpa pelo ato em si. “Como iria saber?”, retrucou, “a culpa não é minha, o problema é o sistema e ninguém me avisou. Mas vou procurar os culpados e eles serão responsabilizados”.  “Ora”, disse eu, “se você tivesse esta preocupação de fato, criaria meios de ser avisado ou alertado toda a vez que uma coisa desta natureza fosse discutida. Participaria mais de reuniões sobre este assunto e não delegaria tanto. Além disto investiria mais em controles e alertas para que você fosse escalado quando necessário”.  


O fato é que hoje existe tecnologia, técnicas, formas enfim, de se gerenciar ocorrências como estas que podem ser implementadas para ajudar aos gestores a assumirem a responsabilidade. Mas creio que infelizmente o problema não está aí.  A gente vê poucos gestores de alto escalão se considerando responsáveis de fato pelas operações. Delegam, não participam e esperam que pessoas que não tem esta responsabilidade – mas que levam a culpa – decidirem sobre como os contratos vão ser cumpridos, como  será a comunicação  e como vão atuar se algo não der certo. Não investem em controles que permitam chegar a sua mesa indicadores do que acontece, não se envolvem e acham mais fácil culpar os “colaboradores”  ou “os sistemas”  quando um cliente coloca a boca no mundo. 


“Tenho muitas coisas importantes a resolver não posso cuidar de tudo, por isso tenho gente para ver isso. Se eles não olham não é responsabilidade minha”. O que é tão importante quanto garantir o serviço ao cliente que permite um alto executivo, um presidente de empresa, acreditar que isso não seja de sua responsabilidade direta?

Comentários são muito bem vindos!

 Até a próxima.

0 comentário em “Responsabilidade ou culpa?”

  1. Ã% cultural e muito conveniente. A hierarquia funciona de baixo para cima para tudo que é positivo, levando poder, prestigio e dinheiro para o topo. Esta mesma hierarquia é frequentemente usada como álibi para o que é negativo, como falhas da organização em cumprir suas obrigações com o mercado e os clientes.

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