Autor: Marcelo Domingues de Andrade
Foi-se o tempo em que o celular era para poucos. Hoje, se tornou objeto indispensável para a grande maioria da população. Segundo a Anatel, o Brasil registrou, em maio de 2016, 255,23 milhões de linhas ativas na telefonia móvel. Em 2014, este número era de cerca de 143 milhões. E, com a evolução do aparelho, sua principal função (fazer ligações) ficou em segundo plano. Com as redes sociais, aplicativos de comunicação, de música, de vídeos, fotos, entre outros, o celular se tornou uma verdadeira ferramenta de conexão com o mundo.
No entanto, mesmo sendo largamente utilizado, o celular pode gerar problemas ao profissional em seu ambiente de trabalho. Apesar de não haver no ordenamento jurídico brasileiro uma legislação em desfavor ou mesmo regulamentando o uso do celular no ambiente corporativo, algumas empresas criaram regimentos internos que limitam o uso ou mesmo proíbem a utilização do aparelho.
Além disso, os empresários contam com o amparo da Consolidação das Normas Trabalhistas CLT) que, em seu artigo 482, enumera as hipóteses de demissões por justa causa, dentre elas, a letra “e”, que é desídia no desempenho das respectivas funções. Neste caso, desídia é o desleixo nas funções desenvolvidas, ou seja, o simples fato de atender ao telefonema ou mesmo olhar as mensagens enviadas via whatsapp ou facebook geram um comportamento negligente e que desvia a atenção normal que deveria existir por parte do colaborador.
Exemplos em desfavor da utilização do celular no ambiente de trabalho são as empresas de telemarketing, onde a atividade exige atenção exclusiva, e o uso do aparelho poderá causar prejuízo imediato no pronto atendimento. Sendo assim, estas empresas acabam criando políticas internas que proíbem a utilização durante o horário de expediente. Se o colaborador descumprir a norma, certamente será advertido, e até suspenso pelo seu supervisor. Muitas vezes, o colaborador advertido, ou até mesmo suspenso, continua a agir reiteradamente, gerando indisciplina ou mesmo insubordinação. Ambos os pontos estão previstos na letra “h” do já citado dispositivo da CLT (art. 482), resultando na justa causa do empregado.
Outros amparados legais estão previstos no mesmo artigo quando o colaborador divulga fotos ou vídeos que possam comprometer a vida privada e até íntima (nude ou sexting) de clientes da empresa, empregados e até do empregador ou de seu superior hierárquico. Estas previsões estão nas letras “j” e “k” do já citado artigo 482 da CLT.
Por outro lado, e muito diferente dos exemplos citados acima, temos as condições de profissionais que laboram com sua capacidade motora, e qualquer descuido poderá resultar em acidentes de trabalho. Estamos falando de atividades como de operadores de máquinas, motoristas, entre outras. A falta de concentração poderá prejudicar a vida do colaborador e até de terceiros. Portanto, a melhor atitude para atividades que exigem atenção sob pena de acidentes de trabalho seria a proibição total do uso de celulares.
Na realidade, enfrentamos uma mudança social muito brusca na sociedade da informação em que vivemos. A cada dia, são muitas novidades, especialmente no setor de tecnologia da informação, o que deveria fazer movimentar o Poder Legislativo, principalmente no setor da reforma trabalhista. Mas isso não está ocorrendo no Brasil, daí a necessidade de continuar aplicando as normas já existentes (obsoletas, muitas vezes) ou mesmo contar com a judicialização (ou ativismo judicial) do Poder Judiciário. Isso significa que o Poder Judiciário vem decidindo processos sem normas existentes, o que causa uma construção jurídica, com princípios constitucionais fundamentais e dos direitos sociais, diferente das normas previstas na Consolidação das Leis Trabalhistas. Logo, não há impedimento para a aplicação do direito na área trabalhista, ou em qualquer outra área. Mas, por ser o Brasil um país em que a legislação é essencial, as alterações das leis trabalhistas devem ocorrer rapidamente.
Marcelo Domingues de Andrade é sócio do Guerreiro e Andrade Advogados.