Imagine um CEO-algoritmo que reconfigura jornadas de atendimento em tempo real e ajusta políticas de fidelização conforme o comportamento de compra do cliente nas últimas 24 horas
Autor: Renan Salinas
Imagine sentar-se em uma reunião estratégica, olhar para a cabeceira da mesa e, no lugar do CEO de terno bem cortado, encontrar… um algoritmo. Sem vaidade. Sem pressa. Sem ego. Só dados. Frio, mas funcional. Impessoal, mas altamente personalizado. Parece ficção científica? Pois saiba que já está acontecendo — e com resultados bem reais.
Recentemente, dados da Gartner mostraram que 89% das organizações já consideram a IA como uma prioridade estratégica. O que antes era apenas uma ferramenta para aumentar produtividade virou, aos poucos, o cérebro invisível que orienta fusões, demissões, investimentos e até o tom de voz da marca. A pergunta que fica não é mais “se”, mas “quando” uma IA vai assumir de vez o comando — ou ao menos, ser mais influente do que qualquer ser humano da diretoria.
A Deep Knowledge Ventures, fundo de investimentos de Hong Kong, já nomeou uma IA chamada Vital como membro do conselho. E o mais curioso? Ela não apenas participa das decisões — tem poder de veto. Ou seja, se o algoritmo disser não, a reunião acaba ali. Frio? Talvez. Eficiente? Com certeza.
Afinal, o que define um bom CEO? Capacidade de decisão sob pressão. Visão de longo prazo. Leitura estratégica de cenários. Habilidade de adaptação. Agora pense: qual dessas qualidades não pode ser replicada — ou superada — por uma inteligência artificial alimentada por dados em tempo real, com acesso a milhares de variáveis, padrões históricos e predição de tendências?
Enquanto os humanos dormem, hesitam, se distraem ou se deixam levar por política interna, a IA processa. Sem fadiga. Sem vaidade. Sem viés (ao menos, não intencional). Talvez o ponto mais provocativo de toda essa transformação seja o seguinte: algoritmos tomam decisões mais impopulares, porém mais racionais, algo que CEOs humanos muitas vezes evitam por pressão, medo de exposição ou simples apego.
Isso muda completamente o jogo para a área de Customer Experience. Imagine um CEO-algoritmo que reconfigura jornadas de atendimento em tempo real, ajusta políticas de fidelização conforme o comportamento de compra do cliente nas últimas 24 horas e toma decisões sobre expansão ou fechamento de unidades baseado no que o consumidor vai querer, não no que disse querer. CX, nesse cenário, deixa de ser um “projeto” e passa a ser uma engrenagem viva, estratégica, iterativa. A experiência do cliente passa a ser comandada por dados que não apenas descrevem, mas antecipam desejos. E melhor: sem depender da aprovação de alguém que não entendeu o que é NPS.
Claro, isso levanta questões éticas e culturais. Um algoritmo pode demitir? Pode ser responsabilizado? Pode liderar pessoas? Não sabemos ainda. Mas sabemos que as empresas que mais crescem hoje são aquelas que já têm algoritmos tomando decisões-chave, mesmo que ainda assinem como “recomendações da área de dados”.
Não é sobre substituir o humano. É sobre reconfigurar o papel da liderança. CEOs do futuro talvez sejam metade analista de dados, metade curador de decisões algorítmicas. Uma nova espécie de liderança híbrida, onde quem manda não é quem tem mais anos de casa — mas quem tem mais capacidade de ouvir o que os dados estão dizendo, mesmo que eles estejam gritando algo incômodo.
A boa notícia? Ainda há tempo para se adaptar. A má? Quem esperar demais para entender esse novo jogo, talvez descubra tarde demais que já não está na sala de decisões. Está no rodapé do relatório — como dado obsoleto.
Renan Salinas é CEO e founder da Yank Solutions.