É preciso promover líderes com base em empatia, curiosidade e capacidade de aprendizagem e não apenas pelos resultados passados
Autor: Rodrigo F. Santos
Há uma zona invisível nas empresas onde forças opostas se encontram e muitas vezes se chocam. De um lado, a pressão da alta liderança por resultados, inovação e velocidade. Do outro, equipes que pedem escuta, clareza e equilíbrio. No meio, os líderes intermediários, supervisores, coordenadores e gerentes de linha, que sustentam o peso das decisões e o ritmo das emoções. Eles são o elo vital entre estratégia e execução, cultura e comportamento, discurso e prática. São quem traduz o “o que” e o “por quê” em um cotidiano possível. Quando estão fortalecidos, criam alinhamento e engajamento. Quando estão exaustos, a cultura se esfarela.
A função intermediária sempre foi complexa, mas, no contexto atual, de mudanças aceleradas, estruturas achatadas e revolução tecnológica, ela se tornou quase insustentável. Segundo a Capterra’s Middle Manager Survey (2023), 71% dos líderes intermediários afirmam sentir-se sobrecarregados ou exaustos e 53% dizem que não têm tempo suficiente para realizar tudo o que precisam em uma semana típica. Mais da metade também admite não conseguir dedicar atenção individual suficiente aos seus liderados.
Em outra pesquisa, realizada pela Gartner 76% dizem que os gestores estão sobrecarregados e 73% que não estão equipados para liderar mudança. Esses números revelam algo profundo: as organizações estão pedindo demais de quem menos tem tempo e espaço para se reinventar. O meio da liderança, que deveria ser ponte, está se tornando um campo de tensão.
Supervisores e coordenadores são, na prática, guardiões silenciosos da cultura organizacional. É por meio deles que valores se tornam hábitos, que políticas se transformam em atitudes e que metas ganham sentido humano. Eles sustentam três pilares essenciais: a cultura, ao modelarem comportamentos e darem corpo ao discurso institucional; a motivação, ao reconhecerem e estimularem o senso de pertencimento; e o desempenho, ao acompanharem de perto e garantirem ritmo e qualidade. Mas esse papel só é possível quando o líder intermediário está emocionalmente disponível, cognitivamente preparado e reconhecido pela alta gestão. Quando não está, o resultado é um previsível burnout, desalinhamento e queda de engajamento.
O líder do meio precisa de mais do que ferramentas de gestão. Precisa de escuta, agilidade e repertório. Escuta para perceber o não dito, interpretar o contexto emocional e entender o que motiva ou paralisa uma equipe. Agilidade para adaptar-se, ajustar rotas e decidir mesmo sob incerteza. E repertório para compreender a complexidade humana, conectar experiências e inspirar propósito. Empresas que desejam preservar sua cultura e performance precisam investir nesse tripé. Não com treinamentos formais, mas com programas vivos de desenvolvimento, que envolvam mentorias, trocas entre pares e espaços de reflexão sobre o fazer diário da liderança.
Isso começa pela forma como se escolhe quem lidera. É preciso selecionar pelo potencial humano, não apenas técnico, promover líderes com base em empatia, curiosidade e capacidade de aprendizagem e não apenas pelos resultados passados. Depois, oferecer suporte contínuo e ágil, com ecossistemas de aprendizagem “on the go”, coaching em tempo real, microcursos e espaços de feedback prático. Automatizar tarefas administrativas também é essencial para liberar o supervisor do excesso de burocracia e permitir que ele se dedique ao que realmente importa, as pessoas. Além disso, a solidão do líder intermediário é uma das maiores causas de esgotamento,criar redes de mentoria e grupos de apoio entre pares ajuda a compartilhar dilemas e fortalecer o coletivo. Por fim, é fundamental monitorar a saúde emocional e reconhecer o esforço desses profissionais.
O futuro da liderança será decidido nesse espaço de intersecção, nem no topo, nem na base, mas no meio. É ali que a cultura se materializa, que o propósito se sustenta e que o desempenho se torna coletivo. O líder intermediário é o novo protagonista silencioso das organizações. Se estiver apenas obedecendo, o elo ruirá, mas se for preparado para escutar, agir e inspirar, será ele quem reinventará a confiança como o novo comando.
Rodrigo F. Santos é CEO do Grupo Mop.