Mileine Vargas

Entrar em estado de flow

Autora: Mileine Vargas

Tenho ouvido muitos relatos de mulheres que estão estressadas devido às grandes demandas das suas atividades de trabalho em suas carreiras. Estão bastante sobrecarregas. Somado a isso, a exigência e autocobrança em serem supermães, esposas, filhas e mulheres. A intensa luta por cargos de liderança e para ocupar, cada vez mais, funções que garantam ascensão, além da cobrança por resultados, está fazendo com que as mulheres tenham dificuldades para encontrar uma vida feliz e equilibrada.

A própria mulher, no final dos anos 50, com o início da chamada segunda onda do movimento feminista, de acordo com a socióloga Jacqueline Pitanguy, se empenhou para corrigir lacunas deixadas pela primeira onda do movimento, no começo do século XX, ocasião em que as mulheres lutaram por direitos políticos igualitários. A partir daí, surgiu um grande desejo de sentir-se parte do cenário econômico e social. Assim, a mulher daria um sentido maior à vida e não restringir-se apenas às tarefas de gerar e criar filhos.

Com a chegada da pílula anticoncepcional, em agosto de 1960, a mulher ganhou liberdade de escolha. Passava a ter maior poder de decisão sobre a sua vida. Com o ingresso da mulher no mercado de trabalho, efetivamente dentro das empresas, ela ganhou poder, autonomia e, acima de tudo, a capacidade de escolher uma profissão que lhe garantisse independência.

Desde o final dos anos 90, período em que o Brasil alcançou uma economia mais estável, possibilitou às pessoas planejarem suas vidas de forma diferente, principalmente no que diz respeito à carreira. À medida em que as empresas evoluíram de forma rápida e dinâmica, surgiu o desejo de crescer e galgar posições de liderança. Tornamos-nos líderes, diretoras, VP’s de multinacionais, governadoras e até mesmo presidente da república.

Será que uma mulher precisa ter o desejo de ocupar um cargo de liderança para provar que ela pode crescer profissionalmente?Cada dia que passa, mais ouvimos falar sobre desenvolvimento de lideranças. O que é ser líder? Qual é o seu papel em uma sociedade ou empresa? Um líder é aquela pessoa que provoca mudança, é a mão que conduz para um lugar aonde se quer chegar. É, acima de tudo, uma escolha pelo simples fato de dedicar uma boa parte da sua vida a um projeto, a uma causa ou desenvolver seres humanos. Desempenhar essas tarefas é um processo bastante complexo, principalmente quando estamos nos referindo a desenvolver pessoas.

Uma pesquisa do Instituto Insper realizada este ano, aponta que houve uma redução de 8% nos cargos de presidência dentro das empresas de 2018 para 2019. Com essa diminuição, podemos considerar que está havendo uma pequena estagnação do crescimento de lideranças femininas no País.

A que se deve esse retrocesso? Obviamente podem ser várias as justificativas. Hoje, estamos vivendo no mundo VUCA, sigla que abrevia Vulnerabilidade, Incerteza, Complexo e Ambíguo, usado nos Estados Unidos nos anos 90. Atualmente, o mundo VUCA está incorporado dentro das empresas em todo o mundo. De forma geral, o quanto as pessoas estão preparadas para viver em um mundo tão cheio de incertezas e mudanças tão rápidas?

E como fica ainda para as mulheres que querem compor famílias, preparar os filhos para o mundo, cuidar das suas casas e também de si? Se perguntarmos para mulheres extremamente bem sucedidas e que empreenderam nos negócios ou mesmo em suas carreiras nas empresas, perceberemos que não houve equilíbrio e sim dedicação extrema para chegar aonde chegaram. Hoje existe um profundo questionamento sobre a real necessidade e se de fato faz sentido essa dedicação total, tendo que abrir mão de projetos pessoais para chegar ao topo.

Nunca se falou tanto em felicidade dentro das empresas. Um dos cursos mais procurados em Harvard, nos últimos tempos, foi o do Tal-Ben Shahar, que estuda a ciência da felicidade. Com base nesse conceito, abrimos espaço para dialogar as carreiras e falarmos de propósito, questionando nossas escolhas e nos levando à reflexão sobre quem somos nós. Nessa mesma linha de raciocínio, existe um conceito chamado flow.

Ele foi desenvolvido pelo psicólogo húngaro Mihaly Csikszentmhalyi, professor da Universidade de Chicago (EUA). Levantou diversos questionamentos sobre os motivos que levam as pessoas a ter dificuldade em ser feliz, mesmo atingindo posições que muito desejaram. O psicólogo conseguiu provar que era “estar em fluxo” que faz com que nos sintamos realizados. Muitos artistas experimentam esse estado de fluidez na música, nas artes e até mesmo no trabalho, que é quando relatam que nem veem o tempo passar sem nenhum esforço para se manter nesse estado. Podem ficar horas produzindo que não se sentem esgotados.

Será que exercer o papel de líder sempre proporciona às mulheres um estado de flow? Acredito que nem sempre, justamente pelo fato de que exigirá, sem exceção, uma dedicação acima da média. Terão que ser exemplo, desenvolver muitas habilidades para ler pessoas, entendê-las e compreendê-las mais do que qualquer outra atividade. Significa também, em muitos casos, levar trabalho para casa e nem sempre a mulher estará disposta a executar tudo isso. Além disso, esse aumento de responsabilidade não garante mais realização.

É por isso que falamos tanto em propósito de vida. É buscar um entendimento de si e para que viemos ao mundo. É sobre encontrar o seu lugar para exercitar a felicidade que, em muitos casos, está fora das posições de liderança e longe dos holofotes. A satisfação está em dar seu melhor, entrar em estado de flow sem a necessidade de ser presidente ou líder de alguma coisa. Ser feliz é ser simples, mesmo que seja contribuindo em funções administrativas, na indústria, no comércio, em hospitais, em comunidades ou mesmo em casa.

Mileine Vargas tem mestrado em Educação na Unilasalle, é empresária e Trainer em PNL pela Universidade da PNL na California. É Analista de Inteligência Emocional e Analista DISC.

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