Em outras regiões do mundo, apenas 25% reconhecem a pauta social como vantagem competitiva, sendo a agenda climática mais valorizada
As instituições bancárias sediadas na América Latina são as que mais acreditam que, entre os vários motivadores das ações de impacto social, estão os efeitos benéficos aos clientes e o incremento da base de atendidos – população que ainda a ser bancarizada -, o que se traduz em melhor desempenho financeiro. A constatação faz parte de estudo realizado pelo Boston Consulting Group (BCG), conduzido com executivos de 40 bancos em 33 países. Combinadas, as empresas ouvidas pela pesquisa possuem 15 trilhões de dólares em ativos e cerca de 800 milhões de clientes.
O estudo revela que bancos na América Latina ainda atribuem mais importância à agenda social do que à climática, diferentemente das instituições ao redor do mundo. Enquanto, em um ranking de importância, a Europa concede 29 pontos a causas sociais, a América Latina atribui 43. “A rede de segurança social relativamente mais robusta na Europa faz com que instituições do continente considerem que ações sociais não sejam uma prioridade dos setores privados. Em contrapartida, por operarem em países emergentes com populações menos privilegiadas e, em alguns países, deficientes de serviços financeiros que as atendam por completo, bancos na América Latina costumam ter maior foco na pauta ‘S’ do ESG”, analisou Flávio Magalhães, diretor executivo e sócio sênior no BCG.
Especificamente no Brasil, o executivo comentou sobre a correlação entre o acesso a serviços financeiros e a desigualdade social no país. “Em termos relativos, a bancarização no Brasil tem altos índices e a competição crescente tem contribuído para estender o acesso. Permitir recebimentos e pagamentos com baixos custos de transferência é importante e o setor financeiro brasileiro avançou nessa agenda. Iniciativas que aliam extensão de acesso à educação também são poderosas e algumas instituições investem em educação financeira. Acesso e educação financeira é um binômio poderoso”.
Fatores de engajamento
Para além das condições socioeconômicas, há outros fatores que motivam os bancos a se engajarem em causas sociais, sendo os três principais identificados pelo BCG: benefícios reputacionais (apontados por 80% dos entrevistados), missão, visão e valores da instituição (77%) e motivação e retenção de colaboradores (58%). Uma das explicações para o protagonismo dos funcionários como agentes motivadores da agenda social dentro dos bancos – sendo que na agenda climática eles aparecem em apenas 20% das respostas – é pelo fato das pessoas terem mais facilidade em se identificar com questões sociais do que o tema climático.
Nessas análises, o BCG também identificou que 70% consideram a pressão regulatória como motivador da agenda climática, já na agenda social ela aparece com apenas 35%. “Isso sempre está em constante evolução. Agentes regulatórios na Europa, por exemplo, estão se movimentando para cobrar das grandes instituições relatórios de impacto social de toda a cadeia, incluindo nos próprios colaboradores, fornecedores, comunidades e consumidores. Isso tudo ainda está em desenvolvimento, mas, sem dúvida, os bancos serão direta ou indiretamente cobrados pelas ações das empresas que eles financiam”, afirmou Magalhães.
A sondagem do BCG apontou que 34% dos entrevistados também registram a dificuldade de mensuração do impacto das ações sociais e a falta de objetivos bem definidos como barreiras da agenda social. “Fazendo uma comparação de alto nível, a neutralização da emissão de carbono (net zero) serve de objetivo claro para a agenda climática, já com a agenda social, um dos grandes desafios é justamente o desenho de objetivos em comum devido à diversidade de problemas sociais que são mais difíceis de serem sintetizados a uma única meta”, exemplificou o executivo.
Ações para potencializar a agenda social
Para o diretor executivo, “estamos nos aproximando de um futuro no qual as empresas enfrentam cada vez mais pressão dos stakeholders para endereçar problemas sociais. Dada a relevância do impacto dos bancos na sociedade, como intermediadores de crédito e provedores de diversos serviços, isso é potencializado. Movimentos do portfólio financiado pelas instituições financeiras geram impacto direto a grandes, médias e microempresas, empreendedores individuais e pessoas físicas. Para além do financiamento direto de ações sociais, equilibrar decisões de portfólio de investimento/concessão de crédito e seus impactos sociais é algo presente na governança dos bancos mais comprometidos com uma agenda ESG”.
A pesquisa identificou algumas ações principais que são cruciais para que os bancos pensem criativamente e liderem o impacto social de forma equilibrada com o desempenho financeiro. São elas:
1 – Escolher temas com a razão, não com a emoção. As instituições financeiras devem escolher pautas nas quais sejam capazes de contribuir e causar impactos significativos. A resposta certa depende da junção coerente de propósito, modelo de negócios, regiões e da base de clientes atendidas.
2 – Criar um cargo para supervisionar a agenda social. Crescentemente, as instituições financeiras têm nominado líderes que priorizam a agenda climática e estabelecem mecanismos de governança que permitem interface direta com os negócios. Nem sempre isso acontece para a agenda social. As ações, então, ficam dispersas em diferentes departamentos e sem coordenação ótima. Um líder de impacto social não precisa ser especialista em todas as iniciativas, e sim alguém com conhecimento, habilidades de relacionamento e capaz de mobilizar a organização, influenciar a priorização de pautas balanceadas construindo sobre os negócios e ativos estabelecidos, ajudando a dar visibilidade e construir um portfólio coeso de iniciativas sociais, assim como auxiliar as partes envolvidas na execução das tarefas.
3 – Contratar os especialistas certos. Para muitas iniciativas, por exemplo, iniciativas relacionadas a direitos humanos, é preciso contratar talentos de fora da indústria financeira e, ao mesmo tempo, conectá-los com outros especialistas do negócio, como gerentes, desenvolvedores de produtos e especialistas de risco. Fazer esse tipo de talento funcionar na organização é de suma importância e requer um planejamento adequado.
4 – Integrar os esforços climáticos e sociais. Identifique onde objetivos climáticos convergem e divergem. Bancos que conseguem trazer lentes sociais e climáticas para suas atividades regulatórias e de negócios podem maximizar o impacto em todas as áreas.
5 – Pensar em DEI para além das paredes do banco. Esforços de diversidade, equidade e inclusão (DEI) aumentam a retenção de talentos, mas também auxiliam na construção de uma força de trabalho em sintonia com seus clientes e precisam alcançar outras atividades da empresa, como na criação de produtos e/ou análise de risco de crédito.
6- Fazer parcerias. Encontrar organizações não-governamentais e instituições que procuram por capital privado e tenham a necessária especialização para potencializar seus próprios programas sociais. Parcerias podem maximizar o impacto social.