A despeito do Brasil se encontrar reconhecidamente entre a vanguarda mundial de um agronegócio tecnologicamente produtivo e competitivo, há ainda uma jornada de aproximação a ser melhor desenvolvida entre os polos de inovação e os meios rurais. Como exemplo, basta citar que, enquanto proliferam de forma ininterrupta as fintechs que resolvem com abrangência as dores no segmento financeiro, das cerca de 15 mil startups existentes hoje no país, menos de 3% delas são agrotechs. Ou seja, o novo produtor rural, aquele já disposto a resolver tudo por meio do celular na palma da mão, está se abrindo para os avanços dos benefícios oferecidos pelo digital, mas poucas são as organizações preparadas para ouvi-lo na busca de entender suas reais necessidades. O universo que isso representa ainda de potenciais oportunidades nas várias regiões do país – se houver a diminuição desse distanciamento – e outros temas envolvendo a experiência do cliente no campo, fizeram parte do debate que reuniu, hoje (04), Ivan Moreno, CEO da Orbia, Marcos Mazza, consultor da MZ Mazza, e Paulo Humaitá, fundador e CEO da Bluefields, na 418ª edição da Série Lives – Entrevista ClienteSA.
Dando início ao bate-papo, o CEO da Orbia chamou logo a atenção para o desafio que a transformação digital no campo tem representado para a cadeia de valores transacionais e tradicionais do segmento. Fazendo uma análise mais profunda desse fenômeno, Ivan lembrou como se dava, anteriormente, o modelo de desenvolvimento de qualquer organização: um crescimento horizontal, oferecendo o maior número possível de produtos e serviços de forma a gerar uma base consistente para escalar; enquanto, no eixo vertical, tratava-se de saber segurar tanto a concorrência já existente quanto os entrantes. Nesse cenário, o surgimento de novidades disruptivas eram muito raras, principalmente em função do alto custo representado pela tecnologia.
Agora, no entanto, com a revolução digital, destacou ele, surgem, a todo momento, startups com capacidade de atender aos agentes do agronegócio em pé de igualdade com as grandes corporações. E de uma maneira mais fácil, mais rápida e mais barata. “Isso traz agora ao produtor rural uma grande possibilidade de escolha. Seja para combater ervas daninhas ou insetos na plantação, comercializar a safra ou adquirir insumos em geral, existem agora, no chamado eixo vertical, vários substitutos ou entrantes com alternativas que colocam em xeque o conjunto de valores tradicionalmente ofertados no modelo transacional.” E citou o próprio marketplace da Orbia como um dos claros exemplos práticos dessa realidade.
Já, como fundador da Bluefields, uma aceleradora de startups, Paulo não só confirmou a análise como disse ser fácil perceber a dinâmica desse novo tipo de empresa também nos negócios rurais. Para ele, o modo de agir diferenciado e o uso inteligente do digital se coadunam perfeitamente com a feição assumida pelo novo produtor do campo, há bastante tempo voltado para os recursos tecnológicos que tornam o agro brasileiro destaque mundial. “Essa nova geração que conduz o agronegócio está muito mais ligado na inovação e na tecnologia. Entretanto, quando olhamos para o ecossistema de startups, notamos que se trata, em relação a esse segmento, uma oportunidade ainda em processo de nascimento. Das cerca de 15 mil startups hoje existentes no país, podemos estimar que apenas umas 300 ou 400 estejam voltadas para o setor.” Ou seja, um potencial que começa a ser aproveitado agora, ofertando modelos de negócios inovadores, possibilitando que as agrotechs ocupem gargalos nesse segmento, como as fintechs têm realizado em profusão no financeiro. Algo que, assegura ele, certamente acontecerá.
Já Mazza, falando do outro lado do balcão, já que atua junto aos produtores no agronegócio, não só concordou com a análise como lembrou que quem está à frente de pelo menos metade dos negócios no campo são os netos daquela clássica figura de homem do campo com seu chapéu de palha. Ou seja, jovens empreendedores cuja ferramenta de trabalho, hoje, é o aparelho celular. É por onde faz cotações, compra produtos, contrata consultorias, etc. Embora ele lembre que, em termos de inovação, existem os mais avançados, os ainda excessivamente tradicionais e uma maioria que sempre acompanhará aquilo que estiver dando certo. “Falando com a cabeça do agricultor, penso que tecnologia depende fundamentalmente da comunicação. Porque, como fazemos para que chegue até a fazenda uma novidade bem relevante criada por uma startup lá da cidade? Porque o cliente não compra o produto ou o software, etc., mas sim o benefício que isso trará para o seu negócio. Ou seja, esse encontro é uma jornada e, quanto mais cedo ocorrer, melhor para todos.”
Indagado sobre como pode se operar de forma mais ágil essa aproximação, Mazza ressaltou a importância dos fornecedores de insumos ouvirem o produtor rural. Para ele, quem não souber praticar essa escuta ativa que abrevia o distanciamento, terá sérios problemas pela frente. “Esse mercado tem de empoderar o vendedor lá na linha de frente para saber fazer as perguntas certas. A figura do passador de preço e tirador de pedido está desaparecendo porque não faz mais sentido. Hoje isso está tudo disponível no celular. Agora é hora de visitar o produtor para entender suas necessidades verdadeiras, tendo sempre em mente que há sérias diferenças culturais e comportamentais nas várias regiões do país. É preciso investir em pessoas para capturar insights.”
O vídeo com o bate-papo na íntegra está disponível em nosso canal no Youtube, o ClienteSA Play, junto com as outras 417 lives realizadas desde março de 2020. Aproveite para também para se inscrever. A Série Lives – Entrevista ClienteSA retornará na segunda-feira (07), trazendo Rodrigo Rosa, head de CX do QuintoAndar, que falará como surpreender o consumidor na experiência da moradia; na terça, será a vez de Leandro Jasiocha, VP de consumer journey para Electrolux América Latina; e, na quarta, João Pedro Thompson, co-fundador e CEO da Z1.