Muriel Garrido, diretor da MCX Experience e consultor de inovação e experiência do cliente

Reflexões sobre como construir experiências

Case da The Coffee que mostra coerência, sendo toda a jornada do cliente modelada conforme os atributos identificados na marca

Autor: Muriel Garrido

Uma das estratégias mais usadas hoje é a de usar experiência como diferencial do negócio, porém o que mais vemos são ações buscando copiar ou até adaptar ações de gigantes como a Disney ou alguns cases de grandes empresas. Não há nada de errado em buscar inspiração em gigantes que lideram o como ser único e diferenciado, mas será que é o melhor caminho tentar copiá-los sem antes entender as diferenças entre a sua realidade e a deles?

Na minha visão, para o fator experiência ser considerado um diferencial, é preciso estar conectado com três visões:

Coerência de marca

A coerência de marca é a forma como serão tangibilizados os atributos e o jeito da marca se expressar. Não adianta de nada fazer todo um trabalho de branding, se eu não o comprovo para as pessoas, com quem me relaciono, a minha forma única de ser.

Coerência com perfil de clientes

Já a coerência com o perfil de clientes é perspectiva de como criar relações relevantes que tragam, na maioria das vezes, boas percepções e um fortalecimento da conexão cliente versus marca através de uma base sólida de entrega de valor.

Impacto positivo no negócio

E o impacto positivo no negócio se refere aos ganhos que as experiências oferecidas aos clientes estão gerando para o negócio. Esses impactos podem ser entendidos como: aumento de retenção, indicações orgânicas, reviews positivos, maior entendimento do comportamento dos clientes, ajustes de produtos e inovação. A experiência não é somente sobre a felicidade do cliente, pois muitas vezes isso não vai acontecer, mas sim tornar a boa percepção dele como o pilar que ajuda a direcionar o caminho estratégico para a empresa obter sucesso.

Vamos agora analisar como essas três perspectivas podem ser aplicadas na prática. Para isso, vamos olhar o caso do The Coffee. Quando ele foi criado, poderiam copiar os modelos já existentes como cafeterias temáticas ou se inspirar no modelo Starbucks, entretanto, seria uma boa ideia copiar um gigante que está no mundo todo ou criar um modelo negócio que existe uma imensa dificuldade de escalar (cafeteria temática)? Com isso, procuraram uma alternativa: um modelo escalável que pudesse se destacar pela experiência e café de qualidade. Como ponto inicial, escolheram uma inspiração japonesa e aplicaram o modelo de negócio “to go” (pegar e levar).

Agora precisavam provar para todos como na prática funcionaria diferente. Assim o como as pessoas vivenciaram esse novo conceito (jornada do cliente).

O primeiro passo para se modelar uma experiência é conseguir extrair os atributos/caraterísticas da marca, pois servem como base para qualquer criação de interação (jeito da marca). Na minha visão, o The Coffee buscou as seguintes características: modernidade, minimalismo e praticidade.

Para fazer sentido, precisavam transformar atributos em algo prático para que os clientes percebessem, logo podemos ver a seguinte lógica: modernidade – uso de tecnológica e design físico moderno; minimalismo – lojas pequenas e cardápios enxutos; praticidade – interações rápidas, convenientes, simples e intuitivas.

Com essa lógica, modelaram a jornada do cliente e suas interações mais ou menos assim: acessar o aplicativo, selecionar o local mais conveniente, escolher os produtos, pagar e só passar na loja para retirar. Assim que o pedido estiver pronto o app avisa e o barista chama também.

Como eles aplicaram as três visões?

Modernidade

A maior parte da jornada é totalmente digital via app; suas lojas se baseiam no design moderno japonês, buscando otimizar cada metro e mantendo o conceito.

Minimalismo

Suas lojas são pequenas (espaços até 20m²); o app é simples e direto, com poucas funções e focado no objetivo central que é conseguir comprar o produto; o cardápio oferece poucas opções, para eliminar todo o tempo desperdiçado e a dor da indecisão.

Praticidade

No app é possível ver a distância de cada loja, o tamanho da fila e qual a projeção de tempo para o pedido ficar pronto; outro reforço é o app com poucas funções e objetivo claro;. a loja é toda modelada para que ajude o barista a conseguir fazer o café o mais rápido possível. Além disso, oferecem novas formas para aumentar o conforto de transporte do café.

Mas essa experiência está de acordo com a nossa ideia inicial?

Coerência de marca: toda a jornada do cliente foi modelada conforme os atributos que identificamos da marca. A jornada do cliente é praticamente digital e as lojas têm design estilo japonês e moderno (modernidade). As opções do cardápio e ações no aplicativo são limitadas (minimalismo), e existe todo um cuidado para lidar com a expectativa de tempo de fila e etapas enxutas para fazer o pedido (praticidade).

Coerência com perfil de clientes: como o próprio modelo de negócio é “to go”, focam em públicos que estão de passagem, querem rapidamente fazer o pedido, pegar e seguir o seu rumo. As lojas até oferecem poucos lugares para sentar-se, porém o grande foco está em pessoas que estão “em trânsito”. Visto que toda a jornada foi modelada para o uso do app, não é preciso estar na loja para fazer o pedido, mas pode fazer o pedido e depois se locomover só para pegá-lo. Isso me faz crer que existe sim uma coerência com o público desejado. Analisando os reviews do aplicativo (3.2), Reclame Aqui (8 geral e 9.3 em 2022), vemos uma maior percepção positiva da experiência.

Impacto positivo no negócio: A empresa começou em Curitiba em 2018. No final de 2022, contavam com 200 lojas no Brasil e 11 no exterior. Recentemente receberam o novo aporte de US$ 7,5 milhões com a meta de expandir. Isso mostra que a marca entrega uma boa proposta ao mercado.

Para criar experiências, precisamos entender que elas são únicas de cada marca. Devemos desenhar interações que representem o que somos, faça sentido para as pessoas que queremos nos relacionar e que possamos colher frutos. Só assim, experiência se torna um diferencial de negócio.

Muriel Garrido é diretor da MCX Experience e consultor de inovação e experiência do cliente.

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