Depois de um 2015 economicamente terrível para o Brasil, que obrigou mudanças empresariais profundas em vários segmentos, da indústria à prestação de serviços, a perspectiva é de um ano com mais dificuldades. Este é um consenso entre os muitos líderes que participaram do XIV Encontro com Presidentes, no final de novembro. Qualquer perspectiva de melhora passa por uma definição política, sem muitas esperanças no curto prazo, reforçaram praticamente todos os discursos dos líderes no evento. Entre os cerca de 300 participantes, há outro consenso: ninguém acreditava que os apertos para passar 2015 fossem tão profundos. Entre eles, um comentário de que “quem acreditou que atingiu o fundo do poço, descobriu que ele ainda era mais fundo”. Com isso, as adaptações para 2016 ainda precisam continuar, e de forma contínua, até começarem acontecer efetivamente as mudanças estruturais que o País necessita.
Painel 1 – O Brasil em Tempos de Mudança
O delicado momento
As empresas estão sofrendo, se adaptando e, algumas, conseguindo colher resultados, a partir das novas oportunidades geradas, enquanto outras não resistem
O ano de 2015 não foi fácil para ninguém. Mesmo quem conseguiu crescer, não passou ileso pela crise econômica e política, mostrando que estamos vivendo um novo momento, que pede mudanças de atitude, como deixaram claro os líderes reunidos no primeiro painel do XIV Encontro com Presidentes, no Espaço do Bosque, em São Paulo. “Uma crise com mais de 120 dias já não é crise, mas sim um estado. Com isso, as empresas precisam, o quanto antes, se adaptar ao novo cenário para que não percam espaço”, alertou Miguel Ignatios, presidente da Fenadvb.
O presidente da Construtora Chap Chap, Romeu Chap Chap, comentou que esse foi um ano em que as regras estão sendo mudadas. Porém, essa mudança deveria já ter começado lá atrás com o próprio Governo. Ele explica que a crise é resultado de um quadro que já vinha se desenhando. De acordo com Chap Chap, o Governo Lula soube manter a política econômica e introduzir novas medidas, conduzindo o País para o crescimento. Porém, essa política precisava, em algum momento, ser ajustada. “O governo acabou gastando demais com os programas sociais e o dinheiro acabou. Agora estamos pagando a conta”, afirmou o executivo, acrescentando que, embora medidas já estejam sendo tomadas, a crise política ainda está afetando.
Esse quadro, na visão de Sérgio de Souza Monteiro, presidente da Uptime, mostra como o Brasil é um país de incoerência. “Quem não sabia que aquecer a venda de imóveis da forma como foi feita não iria dar certo. O mesmo para outras áreas, quando se incentivou o consumo desenfreado.” Para ele, uma hora esse modelo ia ter um fim, já que o salário não cresceu na mesma proporção. Com isso, criou-se uma utopia, que virou uma bolha. Além disso, ele alertou para o fato de que no Brasil ainda se discute pontos que há muito tempo se discutia em outros países. Um exemplo citado é a carteira assinada. Monteiro também destacou o fato de que tudo que vai para o Governo, para. Enquanto, o que está nas mãos da iniciativa privada anda. “Por isso tudo, digo que é preciso colocar gente nova no Governo. Não podemos continuar do jeito que está.”
Na mesma linha, Topázio Silveira Neto, presidente da Flex RR, coloca irresponsabilidade fiscal, crise política e economia fraca como principais pontos que levaram o País ao atual cenário. De acordo com ele, mesmo na fase em que o Brasil estava bem, o Governo não reduziu os custos, sobrando para as empresas, até que chegou ao limite. O desafio agora é ter que lidar com os repasses de custos quando, na verdade, a empresa foi preparada para outro cenário. “O quadro mudou e temos que nos adaptar a nova realidade.” Como exemplo, Silveira cita a indústria de cobrança, que é remunerada pelo sucesso. “Como administrar isso quando os custos estão maiores. A estrutura precisa ser revista, assim como toda a cadeira precisa se ajustar.” Segundo o executivo, a única forma de manter a alta rentabilidade é aumentar a produtividade, com inovação. “Fazer mais e melhor com menos já era algo que vinha sendo feito. Agora, isso precisa ser mais profundo”, afirma.
Ainda nesse mercado de cobrança, Jefferson Frauches Viana, presidente da Wayback e do Instituto Geoc, comentou que a economia estagnada do jeito que está corrói todo esforço empreendido. “Por isso, também considero que é importante pensar no que se pode fazer de diferente. Criar novas estratégias, investir em novas tecnologias. É hora de mudar”, reforçou o executivo, ressaltando que, embora não seja um momento simples, não se pode desistir. “É preciso encontrar caminhos. Não podemos parar. Temos que acreditar nos País e nos negócios.” Ele destacou que se por um lado há a oportunidade com o aumento dos inadimplentes, por outro há menos liquidez para saldar as dividas. Esse quadro impõe a necessidade do mercado de cobrança buscar um equilibro junto aos parceiros. “Temos que conversar com os contratantes para mudar o modelo. É hora de unir para fazer algo novo”, pontuou.
Na avaliação de Consuelo Amorim, presidente da Sigma, apesar dos economistas falarem que já chegamos ao fundo do poço, a cada dia e nova notícia a situação se mostra ainda pior. No entanto, há um lado positivo em tudo isso. Ela cita o fato da crise política evidenciar o “mar de lama” em que o País está imerso, permitindo assim que se construa um futuro mais digno. “Tenho a esperança que todos esses escândalos sirvam para fundamentar uma base mais sólida e sustentável”, disse. Consuelo defendeu que, quando mais escancarada a realidade, mais fácil será para voltar a crescer. Pois, no Brasil ainda há muita oportunidade de desenvolvimento. “Estamos vivendo uma realidade difícil, mas temos a oportunidade de transformar esse País”, decretou.
Painel 2 – Empresas que se Reinventaram
Dá pra vender lenço?
A frase é famosa, e acabou sendo muito usada por refletir o atual cenário político-econômico e tentar mostrar otimismo na indispensável para a mudança
Se o ano de 2015 foi complicado, 2016 precisa ser de mudanças, até para quem vai vender lenço. Afinal, o desafio é, além de gerenciar a expectativa dos clientes cada vez mais mutantes, entender os cenários político e econômico para construir planejamentos consistentes. Pode ser mesmo difícil encontrar uma luz no fim do túnel. Os líderes que participaram do segundo painel do XIV Encontro com Presidentes, é que a crise pode ter trazido diferentes parâmetros de mercado: o diferencial das empresas é ver nas inovações como formas de oportunidades. E fizeram da frase do publicitário Nizan Guanaes a regra de ouro do momento: “enquanto uns choram, outros vendem lenços”.
Com o nome de “Empresas que se reinventam”, o painel teve a missão de mostrar como as empresas têm trabalhado para contornar a situação, buscando novas oportunidades. “Estamos passando por um momento de crise política, que acaba trazendo crises sociais e econômicas para todos”, definiu o moderador José de Melo Borba Neto, presidente da Car System. Ele ainda avaliou que, apesar de desafiadora, tal qual outras fases complicadas, essa também é cíclica e terá seu fim. “Coisa que os empresários brasileiros e executivos estão bastante acostumados. E é nessa hora que mostram suas flexibilidades, criatividades e modelos de ação.”
O vereador de São Paulo, José Police Neto, defende que é preciso ter noção, em primeiro lugar, que as crises são fruto do meio. Ou seja, elas nascem da sociedade, dos setores públicos e produtivos. Sendo assim, “a única solução para sair delas tem a mesma origem, nós”, diz. Por outro lado, ele entende que em meio a uma turbulência, fica mais difícil entender o cenário ao qual está inserido. Uma das análises que Police Neto faz é sobre a confiança brasileira. Para ele, esse é um ponto frágil da cultura do povo, pois o brasileiro sempre desconfiou muito do outro e, por conta disso, passou a escrever até demais nas leis, como subterfúgio para conseguir acreditar mais nesse outro. “Há muita insegurança que o outro vá infringir. Normalmente, a lei, no Brasil, não é pró-desenvolvimento, é punitiva. Ela sempre trabalha com o ´não´ e não tem portas para o ´sim´.”
O que acaba sendo um problema de tamanho maior e se agrava nesse momento de negativismo e insegurança. O presidente da Vita Derm, Marcelo Schulman, corrobora com essa visão, acreditando que estejamos passando também por uma crise de credibilidade. “A gente vive um problema com a verdade. Quando a gente tem uma ideia, acha que ela pode ser a melhor, mas as pessoas não acreditam no poder dessa ideia”, comenta. “Temos um país espetacular e precisamos aproveitar isso.”, aconselha.
Justamente, com a ideia de procurar desenvolver as melhores ideias e tendo ciência de que elas não só podem como devem ser rentáveis, que Diego Perez e outros sócios formaram a Start Me Up. Como ele mesmo explica, a empresa realiza o equity crowdfounding, em que pequenas e médias empresas recebem investidas de pessoas, não necessariamente investidores, e esses ainda podem ganhar com parte no lucro e crescimento dos negócios.
“A gente busca fomentar o pequeno empreendedor, porque o banco cobra juros altos, tem muita burocracia e quando ele vê o trabalho que pode ter e custo, pode nem criar a empresa ou ter dificuldade para crescer”, detalha. Aliás, a missão é ainda maior, é também de transformar a cultura brasileira, ficando mais voltada para o investimento. Fazer de uma sociedade limitada, em um cenário fértil para novas ideias. “Diria mais, olhos que choram olham para as crises. Olhos que enxugam as lágrimas olham para as oportunidades.”
Apoiando as pequenas empresas, a economia se aquece e faz o mercado girar. Sem contar que esses negócios apoiados pela empresa de Perez são, geralmente, startups. Ou seja, empresas que possuem alguma solução para a sociedade.
Aliás, para Mohamad Akl, presidente da Central Nacional Unimed, essas empresas que criam soluções e tecnologias fazem parte do avanço da humanidade, assim como a roda, a energia elétrica, a Internet e outros adventos. “São coisas que modificam o modo das pessoas pensarem e agirem. Essas inovações mechem com a população. É fantástico!”, pontua. E não tem como resistir à modernidade, pois, segundo o executivo, elas vão acontecer de qualquer jeito. “A sociedade vai demandar e exigir pela inovação. Resistir é perda de tempo.”
Mas, entender a sociedade, como ela se comporta, suas preferências e cultura parece não ser fácil. O presidente da Data Popular, Renato Meirelles, mostrou por meio de suas pesquisas que as classes brasileiras já não são a mesmas. Principalmente, o que chama da nova classe média. Ele ressalta que é essencial as empresas terem esse conhecimento sobre a população até para ter ideia da distribuição do seu portfólio. “O tamanho do crescimento do negócio é diretamente proporcional ao quanto dos consumidores se consegue atingir”, conta. Porém, o mundo corporativo ainda tem muita dificuldade para entender esse novo consumidor. Até porque, este ano, também esteve atípico para as pessoas – oito em cada 10 admitiram que fizeram alguma coisa para conter os gastos em casa, seja aumentando renda ou diminuindo consumo. “Empresas que querem sair da crise devem investir fortemente no relacionamento com cliente. É preciso ser parceiro dele, porque em tempos de crise, óbvio, ele compra menos. E, para isso, é preciso se colocar no lugar do cliente”, alerta.