Julio Emmert, diretor de novos negócios da Algar Tech e CEO da Omnify

A nova onda (digital) de amadurecimento na relação com os clientes

Largará na frente não só quem já está no caminho do digital há mais tempo, mas quem tem melhor capacidade de adaptação e investe em relacionamento mais humano e próximo aos clientes

Autor: Julio Emmert 

Capacidade de adaptação tem sido, desde março de 2020, uma habilidade fundamental para a sobrevivência e o sucesso tanto de profissionais quanto de organizações, de todos os portes e setores. Foram muitas – e profundas – as ondas de mudanças desencadeadas pela pandemia, que nos alçou de um dia para o outro para a digitalização acelerada dos negócios e transformações definitivas no modelo de trabalho.  

Junto com isso, em setembro do mesmo ano entrou em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), legislação que veio para trazer transparência e responsabilidade no uso de dados pessoais, e que também exigiu uma série de adaptações. Agora, mais uma medida chega para desafiar as empresas: em 10 de março de 2022, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) implementou uma regra que obriga a utilização do código 0303 para realização de chamadas de telemarketing.  

O objetivo da resolução é ajudar o consumidor a identificar que a chamada recebida se trata de uma ligação comercial, tendo o poder de decidir atendê-la ou não. Por estar alinhada à LGPD, ela parte do princípio de que a empresa só poderá entrar em contato com um cliente se isso for do seu desejo. Por outro lado, na avaliação da Feninfra (Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática), a medida pode gerar uma crise nas empresas do setor, caso o trabalho dos atendentes de telemarketing se torne inviável com a recusa dos clientes.  

Além disso, a entidade aponta o risco de o próprio consumidor ser prejudicado por chamadas importantes serem rejeitadas previamente, sem levar em conta a importância do teor do seu conteúdo. No caso de uma proposta de renegociação financeira, por exemplo, a ligação pode ser de interesse do cliente e ele estaria desperdiçando uma oportunidade ao recusá-la.  

Para adicionar ainda mais camadas de complexidade, chega também o novo decreto do SAC, norma que confere diretrizes para o atendimento ao cliente e que valerá para o atendimento em setores regulados (bancos, seguradoras, telecomunicações e outros). Sancionada em abril, a lei entrará em vigor em 180 dias, com diretrizes importantes, como o fim do atendimento telefônico em até um minuto. Outra novidade é que as regras de atendimento serão definidas pelos órgãos reguladores de cada setor da economia, conforme suas particularidades. Além disso, o decreto derruba a exigência de atendimento telefônico humano 24 horas por dia, sete dias por semana – agora, as empresas só precisarão oferecê-lo 8 horas diárias. Enquanto isso, os demais canais de atendimento (como chatbots) serão obrigatórios e gratuitos, com disponibilidade 24 X 7. Por fim, a norma traz, ainda, uma primeira definição de omnicanalidade dentro da lei brasileira.  

Tudo isso aponta para uma nova onda digital. Independentemente de vantagens e desvantagens das novas regras, uma coisa é certa: assim como ocorreu com a pandemia e com a LGPD, a implantação do código 0303 e do novo decreto do SAC são novas oportunidades de evolução. Isso tira as empresas novamente da zona de conforto ao obrigá-las a apostar em novas formas de contato com o consumidor, cada vez mais digitais, buscando um relacionamento mais maduro e respeitoso. Antes, era possível que realizassem ligações quantas vezes quisessem e a qualquer hora, prática que causou profundos desgastes entre as partes. Agora, prevalecerá a vontade do cliente e essa será uma oportunidade de reconstruir esse relacionamento, com recursos mais eficientes e informações baseadas em dados. Nesse contexto, os canais digitais também ganham muito mais relevância dentro da própria lei, prevalecendo sobre o atendimento telefônico. 

A regra agora é geração de valor. Caberá às empresas buscarem interações com o consumidor que gerem o desejo de contato. Para isso, muitas empresas precisarão repensar sua abordagem, passando a se aproximar dos clientes de maneira mais criativa e muito menos invasiva. Esse contato prévio poderá ser feito, por exemplo, via WhatsApp, redes sociais, vídeos no YouTube, ações por e-mails ou qualquer outra forma de marketing digital – o importante será sempre provocar no cliente o desejo de interagir com a marca, seja respondendo a mensagem enviada de forma não invasiva, seja preenchendo um formulário de contato. Ambos os casos são exemplos de ações que poderão ser ajustadas para representar um opt-in, ou seja, uma permissão para que as empresas possam dar o próximo passo no relacionamento. 

Diante dessa nova abordagem, se o cliente aceitar seguir adiante, as organizações poderão incentivá-lo, por exemplo, a registrar na agenda de seu celular o número telefônico da empresa (e, por isso, ter um número único de contato com o cliente poderá ser uma vantagem) e, quando o temido prefixo 0303 aparecer na tela, essa ligação não será só bem-vinda, mas até mesmo esperada, e o cliente não irá deixar de atender ou bloqueará o número. 

Assim como vivemos amplas transformações anteriormente, que trouxeram mudanças e avanços inquestionáveis que vieram para ficar, vejo que o prefixo 0303 e o novo decreto do SAC também desempenharão esse mesmo papel. Largará na frente, é claro, quem já está no caminho do digital há mais tempo, tem melhor capacidade de adaptação e investe um relacionamento mais humano e próximo com seus clientes. Diante disso, testar e corrigir rapidamente, colocando o cliente no centro e com foco no digital será ainda mais imprescindível para a perenidade e sucesso das organizações. 

Julio Emmert é diretor de novos negócios da Algar Tech e CEO da Omnify. 

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