Não há como se esperar os mesmos níveis de produtividade das pessoas de antes da crise quando houver o retorno à normalidade. Todos estarão com o emocional sobrecarregado por um período de insegurança generalizada. Voltar às atividades normais estará sob o risco de ser mais um dos motivos de estresse. Caberá, então, às lideranças e aos profissionais da saúde ações específicas para mitigarem problemas e ajustarem tudo à base de compreensão e solidariedade. Essas são apenas algumas das visões apresentadas, hoje (09), no “Quintou?”, bate-papo que faz parte da série de entrevistas dos portais ClienteSA e Callcenter.inf.br, para analisar junto a especialistas o momento da pandemia e o futuro na atividade de gestão de clientes. Na conversa, Leyla Nascimento, vice-presidente de relações internacionais da Associação Brasileira de Recursos Humanos, e Rosylane Rocha, presidente da Associação Nacional de Medicina do Trabalho, revelaram pontos de vista importantes nesse sério momento de exceção.
Leyla, que representa também, como presidente, a Federação Mundial de RH – entidade que congrega mais de 70 países -, confirmou que, em termos de gestão de pessoas, o home office em massa mudou tudo. “Estamos trabalhando muito para administrar a transição”, comentou ela, apontando as providências tomadas em três fases distintas. “Primeiro enfrentamos o desafio de como colocar as pessoas em casa para trabalhar. Assim como a medicina está sendo protagonista naturalmente, a área de RH também ganhou uma prevalência nas decisões. Momento emergencial para que juntos conseguíssemos vencer a fase de choque e necessidades.” No segundo momento, a área se debruçou sobre os detalhes do que pode ser melhorado visando ao bem-estar e à produtividade dos colaboradores. “Muita preocupação de como trabalhar junto com a família em casa.” Já a terceira etapa, desafiadora, na análise da especialista, é preparar o retorno à possível normalidade. “Tudo funcionava bem em determinado modelo e houve interrupção. Como retomar de forma satisfatória, é o que deveremos saber responder”, salientando que, se for confirmado o horizonte de três meses para o fim deste período de isolamento social, para as empresas é muito tempo.
Já Rosylane, que além de presidir a entidade também mantém sua atividade médica, exemplificou com a própria vivência o momento. “Quarentena, pra mim, dirigindo a associação e trabalhando em um dos hospitais que se tornaram referência em Brasília, nesse momento, tem representado 14 horas de atividade. São muitas reuniões virtuais, cuidar de pacientes, ajudar a proteger a família. Além dos estudos ininterruptos que temos que fazer diante da situação.” E descreveu que a própria atividade do médico do trabalho também mudou muito nessa fase de anormalidade pandêmica. Segundo ela, trabalhando em home office, o profissional em geral precisa de grande discernimento para organizar a família para a colaboração geral. “Mas é necessário também estar em contato com os médicos para ficar atentos às questões posturais, à posição dos equipamentos de trabalho, aos exercícios, etc. As pausas para alimentação ficam desregradas. E até horários de sono e repouso podem ter seus ciclos alterados. Cabe à medicina do trabalho agir com muita atenção nesse estágio diferenciado que deverá durar mesmo uns três meses”, completou.
De acordo com a presidente da ANAMT, por ser um período completamente atípico, ainda há carência de pesquisas e análises sobre o que está efetivamente ocorrendo em relação a essa implantação de home office massivo. “Evidentemente, a telemedicina deverá ser mais acionada. Em 2002, o Conselho Federal de Medicina publicou regulamentações sobre essa modalidade de comunicação na área e, neste momento, podemos lançar mão desse recurso. Mas o atendimento presencial deve sempre ser considerado pelo médico.”
Concordando em absoluto com a ressalva feita pela médica, Leyla complementou que ainda levará muito tempo, em nível mundial, até que se consiga entender tudo o que está acontecendo. “Estamos recomendado aos nossos profissionais da área que anotem e registrem tudo. O objetivo é o de se criar um histórico.” E ela fez questão de destacar o que considera o grande aprendizado desse momento. “Não temos mais como tomar decisões isoladas. Precisamos interagir em todas as áreas, sejam grandes ou pequenas empresas. É o momento de compartilhar nossas angústias e minimizar riscos e erros.”
Ao passo que Rosylane, incorporando mais reflexões sob a ótica da saúde, lembrou que não está sendo fácil trabalhar em casa, se reorganizando diante da nova realidade e, ao mesmo tempo, a preocupado com o vírus. “O médico do trabalho é, nesse momento, a autoridade sanitária da organização. Sob qualquer evidência de algum sintoma ou dúvida em relação à doença, o médico deve ser contatado. Ele é o primeiro ou o único meio de dirimir dúvidas. Através da tele-orientação e monitoramento. Ele indicará se é necessário atendimento presencial e até hospitalização. Além disso, orientação sobre higiene, prevenção dentro e fora de casa. Estará sempre à disposição via on-line”, explicou.
Ela descreveu a transformação que requer cuidados. “A vida estava, de certa forma, organizada. Havia alguém para auxiliar em casa, as crianças na escola e as questões domésticas eram administradas dentro de certa rotina. Agora, os turnos que eram separados estão acontecendo ao mesmo tempo. Podem surgir transtornos de ansiedade, depressão.” Portanto, é importante cuidar da saúde mental agora. Não é só a preocupação com o vírus. “Notadamente quem já sofria com esses problemas antes. Buscar atividades lúdicas, de entretenimento e que revigorem a energia com o prazer.”
Rosylane enxerga dois itens fundamentais para o ser humano: a saúde e a liberdade. Por isso, ela acredita que, para a grande maioria, será um momento de felicidade o retorno ao trabalho normal. “Não estamos fechados em casa num momento de liberdade e prazer. Mas de insegurança e cuidados. O ser humano necessita de ser valorizado pelos pares, em todas as atividades. O trabalho isolado dificulta isso. Apesar das dificuldades de deslocamento, as situações de convívio e confraternização compensam esse desconforto para muita gente. Mesmo com todas teleconferências o contato físico é insubstituível”, na avaliação da médica. Leyla, por sua vez, observou que em todas as profissões o momento é de reflexão e não de apreensão. “No retorno, haverá demandas que sequer imaginávamos. Depois de passarmos por um estágio de tolhimento de nossa liberdade, haverá novas necessidades e comportamentos. Ela alertou, assim, que caberá às lideranças entenderem essa nova realidade e agir com calma e estratégia nesse retorno. “Como vamos cuidar dos profissionais após toda essa experiência. Ou seja, mudará a atividade de gestão de pessoas. Levará um bom tempo até que se entendam as transformações. Nesse aspecto, as consultorias da área e as universidades com suas escolas de negócios terão de se atualizar e ajudar”. O bate-papo, na íntegra, estará disponível em nosso canal no Youtube.
Na próxima semana a série de entrevistas segue com Altivo Oliveira, VP de clientes da Mutant, na segunda-feira, falando sobre automação do atendimento. Também já estão confirmados Jefferson Frauches Viana, CEO da WayBack, board member da TCM Group e iGeoc; e Luís Carlos Bento, CEO da Intervalor / Arvato e board member iGeoc; Euriale Voidela, CEO da Customer Centric Consulting; e Roberto Madruga, CEO da Conquist.