Para a grande maioria das indústrias, a distribuição dos produtos pelo varejo merece estratégias cada vez mais elaboradas. Para determinadas empresas, no entanto, o que se passa nos pontos de venda pouco importa. Essas companhias trabalham com o que se convencionou chamar de vendas diretas. As representantes desse segmento apresentam números alvissareiros. De acordo com informações da Associação Brasileira de Empresas de Vendas Diretas (ADEVB), o setor movimentou R$ 14,6 bilhões em 2006, valor 18% superior ao do ano anterior. No ano passado foram comercializados 1,2 bilhões de itens e o número de revendedores saltou para 1,6 milhões, um incremento de 9,6%.
“As vendas diretas sustentam o patamar dos últimos sete anos, o do crescimento nominal médio de 18%. Descontada a inflação anual do IPCA, que foi de 3,14%, o crescimento real no ano passado foi de 14,3%”, explica Rodolfo Guttilla, presidente da ADEVB. O executivo ressalta também a evolução no número de revendedores. “O volume de profissionais atuantes equivale à população de Curitiba”, lembra. Esse cenário coloca o Brasil em posição de destaque quando o assunto é vendas diretas. Dados da Federação Mundial das Associações de Vendas Diretas (WFDSA), da qual a ADVB é filiada, apontam que o País ocupa a quinta posição em montante de negócios, atrás apenas dos Estados Unidos, Japão, Coréia do Sul e Alemanha.
Dois paradigmas – A idéia das vendas diretas ganhou forte impulso em 1886, quando David McConnel, um vendedor de livros que trabalhava em New York, passou a oferecer um frasco de perfume como brinde aos clientes. Em pouco tempo, para sua surpresa, o brinde passou a fazer mais sucesso que os livros. Isso o fez mudar de ramo. No mesmo ano, fundou a Califórnia Perfume, voltada para vendas a domicílio. A primeira revendedora da nova empresa foi sua esposa, Florence Albee. Ao perceber o potencial do negócio, Florence chamou outras mulheres para ajudá-la na tarefa. Numa época em que o lugar tradicional das mulheres era o lar, surgia a oportunidade delas se tornarem financeiramente independentes.
A idéia fez muito sucesso e McConnel fundou no ano seguinte a Avon, hoje poderosa multinacional com faturamento global na casa dos US$ 9 bilhões. Hoje, a fabricante de cosméticos está presente em 120 países e conta com exército de cinco milhões de revendedoras. Embora homens também trabalhem como revendedores para a empresa, a esmagadora maioria da força de vendas é formada pelo público feminino.
O Brasil é o país onde ocorre o maior faturamento da empresa depois dos Estados Unidos. Os números das vendas por aqui não são revelados, mas vale lembrar que a empresa conta com um milhão de revendedores ativos espalhados em todo o território nacional, número que representa 20% da força de vendas da empresa em todo o mundo e quase dois terços do total dos trabalhadores em vendas diretas do Brasil. Para se ter uma idéia do que representa a operação, a empresa imprime por aqui seis milhões de catálogos a cada 21 dias.
Outra empresa paradigma de sucesso do modelo de vendas diretas é a fabricante de artefatos plásticos Tupperware. Ela nasceu nos Estados Unidos nos anos 40, por iniciativa do inventor Earl Tupper. Ele teve a idéia de utilizar plásticos mais resistentes na fabricação de utensílios domésticos, tornando-os diferenciados da concorrência.
Nos anos 50, a vice-presidente da Tupperware, Brownie Wise, passou a promover reuniões com vizinhos e familiares para demonstrar as qualidades dos produtos. Essas reuniões fizeram tamanho sucesso que a empresa passou a adotá-las como forma de atuação. Ficou famoso em todo o mundo o método da empresa de ensinar e explicar para os clientes o diferencial dos produtos a partir de demonstrações feitas em reuniões domiciliares organizadas pelas revendedoras. Hoje, a companhia está presente em mais de 100 países e conta com perto de um milhão de revendedoras. Estima-se que a cada 2,5 segundos é iniciada uma demonstração em algum canto do planeta.
No Brasil, a Tupperware conta com 32 distribuidoras independentes, espalhadas em todos os estados e que atendem a 50 mil revendedoras. Aqui foram comercializados US$ 40 milhões no ano passado, número 18% superior ao de 2005. O índice de crescimento tem se mantido nesse patamar nos últimos quatro anos.
Semelhança – Quando o assunto é conseguir bons resultados comerciais, as companhias de vendas diretas têm uma semelhança com as empresas que operam no varejo tradicional. Trata-se da necessidade de contar com marcas fortes, que proporcionam aos revendedores maior facilidade na hora de oferecer os produtos aos consumidores. “A força da marca ajuda muito a comercializar nossos produtos”, explica Luis Felipe Miranda, presidente da Avon Brasil. Opinião similar tem Paola Kiwi, diretora de vendas e marketing da Tupperware. “A marca dá apoio às vendas. Nossos utensílios plásticos têm qualidade bastante diferenciada. O fato de oferecermos garantia de dez anos para os nossos produtos nos diferencia perante a concorrência”, justifica a executiva.
A Avon não tem economizado para fortalecer sua marca. Pelo contrário. A empresa lançou de forma simultânea em todo o mundo, no último dia 8 de março, data em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, milionária ação institucional de reposicionamento de imagem. “É a primeira vez, em 120 anos de história, que a companhia investe em uma iniciativa global”, informa Miranda. A ação institucional associa a Avon em todos os países onde a fabricante de cosméticos atua ao slogan “Viva o Amanhã” e está calcada em três pilares.
Além de promover a qualidade dos produtos e a colaboração para a emancipação financeira das mulheres, ela reforça a imagem da empresa como responsável social. Os investimentos em iniciativas sociais da companhia começaram na década de 90. “Nos últimos quatro anos investimos R$ 10 milhões em ações do gênero no Brasil”, lembra Miranda. A maior parte dessa verba foi destinada à criação do Instituto Avon, que tem como principal objetivo o combate ao câncer de mama.
Só no Brasil, o lançamento da campanha “Viva o Amanhã” exigiu investimento de US$ 2,5 milhões. Entre as iniciativas adotadas por aqui, encontra-se a compra de inserções na mídia. No dia 8 de março foi exibido filme de um minuto no intervalo comercial do Jornal Nacional e, durante aquela semana, foram veiculados anúncios nas principais mídias impressas do País.
Os investimentos em publicidade não vão parar por aí. “Sempre que investimos em publicidade nossas vendas crescem”, afirma o presidente da empresa no Brasil. Para exemplificar, Miranda lembra os números de 2006. “No ano passado, investimos US$ 30 milhões na mídia no Brasil e nossas vendas cresceram 20% em reais. Conseguimos aumentar em 6% o número de revendedoras e em 13% o número de unidades vendidas por revendedora”, justifica.
Vez por outra, a Tupperware também investe em publicidade. Mas no momento, a empresa não tem planos de comprar espaços publicitários. “Nosso principal meio de divulgação são os folhetos que distribuímos às nossas revendedoras. Também promovemos reuniões a cada quatro semanas com as distribuidoras para apresentar as novidades e ofertas. Isso ajuda a fortalecer a propaganda boca a boca entre revendedoras e consumidoras”, revela Paola.
Diferenças – Importância da marca à parte, as estratégias de marketing adotadas pelas empresas de vendas diretas são bastante distintas. Enquanto as empresas que distribuem seus produtos no varejo estudam formas eficientes de colocar seus produtos nas lojas, as de vendas diretas concentram suas forças nos revendedores. A meta é aproveitar a grande capilaridade da força de vendas que elas possuem. “Investimos bastante em treinamento e incentivos”, revela Paola, da Tupperware.
Estimular os revendedores também é preocupação constante na Avon. A empresa também aposta em treinamentos e incentivos dados aos representantes da empresa que consigam atingir metas auspiciosas de vendas auspiciosas. Mais do que isso, procura integrar os vendedores no marketing institucional da empresa. Uma iniciativa nesse sentido foi criada em paralelo ao reposicionamento global da marca. Em dezesseis países, entre eles o Brasil, foi lançado o “Fundo Viva o Amanhã”, que vai premiar projetos sócioculturais organizados por instituições sem fim lucrativo. A indicação dos concorrentes aos prêmios será feita pelos revendedores e a escolha dos vencedores será feita por comissões formadas por funcionários da empresa. No Brasil, em 2007, serão selecionados seis projetos, com prêmios de R$ 45 mil cada.
O projeto “Viva o Amanhã” prevê a criação no futuro de outras iniciativas com caráter social que integrem as revendedoras nos problemas das comunidades com as quais estão inseridas. Para tanto, a Avon realizou, no último mês de janeiro, uma pesquisa mundial com oito mil mulheres dos mesmos dezesseis países, para conferir índices de satisfação das condições de vida desse público – no Brasil foram ouvidas quinhentas mulheres. “A partir dos resultados das pesquisas vamos criar outros projetos, que podem ser de caráter regional ou global”, explica Miranda.
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