O futuro do mercado de televendas foi o pano de fundo do 3° Congresso ClienteSA Televendas. E pode ser pessimista, para alguns. O evento começou suscitando polêmica: Miguel Cui, diretor de cliente da Claro, foi taxativo: “o telemarketing tem séria tendência a desaparecer”. Irônico ou não, o posicionamento do executivo está baseado no atual cenário vivido pelo setor com a regulamentação dos SACs e o do not call. Segundo Paulo José Soares, assessor jurídico da Abemd, é possível que essa regulamentação ultrapasse os Estados e se torne Federal. Alexandra Persicinoto, coordenadora do Probare, participou das discussões sobre a questão setorial, e argumentou sobre a necessidade de união setorial para evitar crise. Posição que foi reforçada pelos outros palestrantes. Mas, o cenário de otimismo foi desenhado por Célia Sarauza, gerente de consultoria da IDC, que apresentou expectativas para o Brasil, respaldada em parâmetros do modelo norte americano pós as listas “do not call”. A executiva revelou expectativa de crescimento de 14% do mercado no Brasil, apoiada em suas pesquisas.
O lado da festa iniciou com a presença da ex-prefeita Marta Suplicy, homenageada pelo apoio à atividade durante sua gestão. E, em seu discurso, comparou a falta de conhecimento digital atual ao analfabetismo de anos atrás. “Hoje em dia, mexer em um computador não é mais um diferencial, mas uma necessidade”, afirmou. Mas a grande surpresa foi o vencedor do Prêmio Personalidades ClienteSA – Televendas 2008, o executivo Miguel Cui, diretor de Clientes da Claro.
Do pessimismo ao otimismo do mercado
Entre a expectativa de crescer 14% e previsão do fim do telemarketing primeiro painel tratou sobre o futuro do setor
Os números são animadores: até 2011 existe a expectativa de crescimento de 12,6% no mundo e 11,7%, Brasil. Os dados foram apresentados pela executiva Célia Sarauza, gerente da IDC, a partir de levantamentos internacionais realizados pela instituição. A previsão é de que o faturamento mundial dos serviços de callcenter deve pular dos atuais U$66 bilhões para U$100 bilhões. E o Brasil pode ultrapassar os U$10 bilhões em 2012, partindo dos atuais U$ 6 bilhões. As televendas também crescerão: hoje representam 29% do mercado mundial de contact center, até 2011 poderá chegar a 33%.
Um fator que tem contribuído é o aumento do consumo das classes C. Mas um fator preponderante é que, de acordo com Célia, os CEOs das 500 maiores empresas mundiais apontaram o relacionamento com o cliente como o principal foco de investimento para os próximos anos. Essa nova postura apresentadas pelos líderes destas companhias é resultado da mudança comportamental dos clientes, cada vez mais exigentes e influenciadores, utilizando a internet e as redes de relacionamento para manifestar suas opiniões sobre os produtos.
Mas Célia faz um alerta. O crescimento terá origem nos países emergentes, como a Ásia. Nos mercados mais maduros, o crescimento será menor em decorrência das restrições, como o do not call. A executiva afirma que a criatividade é a principal saída para driblar essas listas. “Nos EUA muitas empresas passaram suas campanhas de ativa para receptiva. Tenho certeza que com a criatividade do brasileiro encontraremos novas formas de approach”, aposta. Ela ainda acredita que o aumento do consumo da classe C vai gerar uma demanda por televendas nas áreas financeiras e a inovação de serviços, como já se observa, será o filão cada vez mais explorado pelas operadoras de telefonia fixa e móvel. “O desafio é apostar em novos serviços. E novas PAs serão criadas para atender estas ações”, afirma, otimista.
O cenário brasileiro, de acordo com Miguel Cui, pode ser de pessimismo. Para ele, o telemarketing pode estar com os dias contados. Em vez de fazer uma apresentação formal, preferiu apostar no diálogo com o público. Iniciou diferenciando SAC e televendas. A intenção foi criticar as ações regulamentatórias tomadas pelo governo, que segundo Cui, não conhece o setor e por isso acaba impondo linhas generalistas, longe de especificações. “E, como a atividade não fez seu dever de casa, passamos de mocinhos a vilões”, afirmou ao lembrar que há dez anos (com a escassez de linhas telefônicas) os clientes recebiam ligações das empresas e ficavam contentes, pois se sentiam importantes e prestigiados. Cui estendeu suas críticas ao próprio setor, “Não estamos preparados! Contratantes e terceiros não estão juntos e estamos acreditando que as normas não vão pegar. Mas o NR17, do not call e o Decreto do SAC estão aí!”, afirmou.
Mas se de forma macro as regulamentações exigem uma parceria maior entre tomadores de serviços e prestadores de serviços, o executivo alerta para as pressões de custos. “Parece que viramos uma máquina de triturar operador”, afirmou, ao explicar o excesso de regras trabalhistas estabelecidas exclusivamente para os callcenters, altamente prejudiciais e que geram custos. O surgimento de um novo sindicato laboral também contribui para as pressões salariais, trazendo novo problema à atividade.
A indispensável união da atividade
Desunião do segmento foi apontada como principal dificuldade interna e precisa ser superada com urgência
Paulo José Soares – assessor jurídico da Associação Brasileira de Marketing Direto, a Abemd, e responsável na abertura do segundo painel por revelar uma radiografia das propostas de regulamentações que rondam a atividade – adotou um tom alarmista. Alertou sobre a possibilidade do “do not call” se tornar lei em todo o país, com a proliferação de propostas apresentadas, o que levaria o governo a transformar em Lei Federal. “É simples: basta o governo pegar o decreto do Rio ou de Brasília e trocar as palavrinhas que denotam estadual para federal”, explicou Soares. A Abemd entrou com pedido de ação de inconstitucionalidade contra as listas decretadas pelo governo de Brasília e do Rio de Janeiro, alegando que essas regulamentações só podem ter deliberação federal. Porém essas ações não são muito consoladoras, já que caso a lei se torne federal deixam de ser inconstitucional. Soares também afirmou que o prazo de 120 para a adequação para o Decreto do SAC ainda é insuficiente (o prazo da proposta inicial feita pelo Ministério da Justiça era de 60 dias).
Em discurso acalorado sobre o setor, Alexandra Periscinoto foi taxativa: “A lei realizada hoje é muito mais amena do que a que está por vir”. Para ela, o Decreto é resultado da “falta de união entre contratantes e contratados”. Assim como a baixa adesão ao Probare contribuiu para que o governo interviesse no setor. “Agora, há uma corrida pelo Probare. Espero não ser um pouco tarde!”, afirma Alexandra. A executiva aposta como saída a união de todas as partes envolvidas para discutir a perenidade do segmento e não se concentrar em problemas conjunturais, como se faz. Assim como Miguel Cui, a preocupação de Alexandra é com os impactos causados pelas transformações externas, mas principalmente pelos problemas internos. Por isso é imprescindível a união do setor para discuti-los e solucioná-los.
Alexandre Jau, presidente da TMKT e moderador do debate, apimentou a discussão questionando a atuação dos órgãos que representam a categoria. Diogo Morales, presidente do Sindicato Paulista das Empresas de Telemarketing, Marketing Direto e Conexos, o Sitelmark, respondeu destacando o problema gerado pela pulverização de sindicatos trabalhistas. “A divisão entre sindicatos e associação não agrega, apenas defende interesse próprio”. A baixa participação das empresas nas associações também foi levantado.
Mas entre as discussões sobre os impactos da regulamentação na atividade, alguns exemplos começam a aparecer, como o marketing direto por e-mail, que está se profissionalizando e já possui auto-regulamentação. Este foi o tema da palestra de Vicente Argentino, diretor do Datalistas, que falou sobre o programa de auto-regulamentação do setor de listas de marketing direto, o Prolistas. A iniciativa da Abemd tem objetivo de abrir um canal com o consumidor final permitindo que ele saiba a procedência das mensagens recebidas por mala-direta ou e-mail marketing. “O Prolistas surge como uma forma de respeitar o consumidor final e os players do mercado”, explica Argentino. Para Fernando Cirne, diretor de marketing da Abril, o uso de e-mail maketing eficiente faz poucos clientes pedirem exclusão das listas. “Normalmente são clientes que foram destratados no primeiro contato e por isso pedem para serem excluídos da lista. É algo administrável”, afirma.
A cultura do callcenter em debate
Talk show com experts propõe a formação de uma nova cultura empresarial
Mas, ao longo destes anos – a venda por telefone é praticada desde o início da década de 80 – os executivos vêm construindo uma cultura de resultados empresariais, como demonstram os participantes do talk show coordenado pelo jornalista Milton Jung, da rádio CBN. “O telemarketing tem servido de apoio aos gerentes e auxiliado na conquista de novos clientes”, como reconhece Marcelo Frontini, superintendente do Bradesco Cartões. Quem faz coro à constatação de Frontini é Carlos Mathias, um dos vencedores do Prêmio Personalidade ClienteSA – Televendas 2008, diretor senior de negócios de seguros do HSBC, ao reforçar que o telemarketing no Brasil tem grande potencial, o que justifica a instituição apostar no canal para gerenciar o relacionamento com seus clientes.
A estratégia é seguida pelo jornal Valor. Marcos Rodrigues, diretor de marketing e circulação, argumenta que o modelo adotado segue pela utilização de todos os canais de comunicação. “O telemarketing tem nos ajudado na geração de assinantes e no aumento das vendas”, afirma. Com os novos desafios advindos das regulamentações, a aposta do Valor é em parcerias, como afirma Rodrigues. “Ela tem uma importância estratégica. Temos que nos articular para inovar diante dos novos desafios. Por exemplo, ao realizar uma assinatura também posso vender o produto de um parceiro”, explica. A idéia foi indagada por Milton Jung, que se colocou na pele de cliente e perguntou: “mas se eu estiver assinando jornal, não significa que quero cartão de crédito!”. Rodrigues respondeu que algumas técnicas ajudam a identificar os clientes que tem interesses em fazer novas compras.
Unificação da cultura de atendimento foi a aposta da Unicard quando decidiu as vendas de cartões das agências bancárias para televendas. “Capacitamos os agentes e depois monitoramos as empresas para saber se o combinado está sendo cumprido”, afirma Luis Carlos Ribeiro da Rocha, diretor comercial da Unicard, e um dos vencedores do Prêmio Personalidade ClienteSA – Televendas 2008.
Para Paulo Neto Leite, presidente da Dedic, é necessária a geração de cultura homogênea em função do cliente para evoluir e integrar o canal de televendas com os novos canais. “A área de televendas é menos profissionalizada do que o SAC e a área de cobrança. Falta capacitação”, avalia Leite. Mas não culpa a falta de capacitação dos atendentes, diz que este argumento “já virou clichê”. Acredita que o principal desafio do setor é a educação: se o governo não fornece ensino de qualidade, não adianta as empresas reclamarem, mas sim capacitar os atendentes. Para defender sua tese sobre a necessidade de investimentos nos atendentes, desmistificou o conceito de callcenter como primeiro empresa, usando dados da própria Dedic, que possui trabalhadores com mais de cinco e até dez anos de casa.
Antonio Portero Campoi – outro dos vencedores do Prêmio Personalidade ClienteSA -Televendas 2008, gestor de relacionamento com clientes do Grupo Caixa – enxerga além, acreditando que se no passado o canal televendas foi a melhor forma de expandir as operações, hoje o serviço se mostra como área estratégica da empresa, unindo a área de atendimento ao cliente, com os segmentos de marketing, por exemplo.
Reconstrução da imagem – O desafio de refazer a marca da atividade foi um dos shows do encontro com o jornalista Milton Jung. Entre os indagados, Marcos Littério, superintendente de vendas telemarketing e vendas pessoas da Credicard Citi, avalia que “com a comoditização do setor algumas pessoas tiveram experiências ruins e se propagou no mercado a imagem negativa. Temos que trabalhar para desmistificar e reverter essa imagem. E fortalecer o setor”. Mas, calma com a avaliação. Frontini faz a comparação entre o número de transações feitas por dia e o de reclamações, mostrando que o percentual de erro é muito pequeno se comparado ao todo. E assim como Littério reconhece que imagem negativa do setor vai trazer mudanças para a cultura das empresas.
Rocha, do Unicard, reconhece a falta de esforço das instituições bancárias pela desunião frente às regulamentações do SAC. “Os bancos conseguem se unir. Mas no caso da regulamentação de SACs, os esforços foram concentrados nas mãos da Febraban.” Ele também aponta a falta de adesão ao programa de auto-regulamentação da atividade de callcenter, o Probare – alternativa para criar e por em prática a uma cultura que associa ética com profissionalismo – como um dos motivos que levou o governo se envolver na atividade e impor um Decreto com orientações de atendimento. O executivo voltou-se à platéia e questiou: “Quem aqui tem o selo de ética?”. Rapidamente algumas mãos se levantaram, e ele respondeu: “eu também tenho, mas é recente. Ninguém apoiou no começo”, finalizou.
Para Marcelo Martins, presidente da Vidax, há uma inversão de valores na análise do setor. Para ele, há dez anos quando um operador ligava para oferecer uma linha telefônica, era muito bem recebido. Na época, com o início da privatização das telecomunicações, havia escassez de linha telefônica. “Hoje, o mercado nos encara como invasivos!”, diz o empresário. Ele abre uma convocação aos executivos para começar um trabalho de valorizar o setor. “Temos que valorizar o que realmente fazemos: que as pessoas fiquem satisfeitas com o atendimento”.