Um e-esforço. O desafio real do comércio eletrônico



R$ 20 bilhões. Esse é o volume de negócios que o varejo virtual deve faturar no Brasil este ano, selando crescimento agressivo, de 30% ao ano. Um convite alvissareiro comparado ao varejo tradicional, que cresceu (modestos?) 10% em 2010. Quer mais? Até 2014, ele deve dobrar, na avaliação do Programa de Administração do Varejo (Provar), da FIA. Um mercado que acelera o profissionalismo, direcionando investimentos na conquista do consumidor virtual e principalmente na construção – ou consolidação – de marca.

O e-commerce brasileiro pode ser dividido em três momentos, segundo Tiê Lima, gerente executivo responsável pelas iniciativas de e-commerce do Grupo Abril, entre elas, Bananarama e Click-à-Porter. No primeiro, figuravam poucos competidores, como o Submarino — que era a referência — e poucas das grandes redes de varejo como as Lojas Americanas e o PontoFrio. Nessa época, segundo Lima, ainda estava longe de se considerar uma NovaPontoCom e a Magazine Luiza também dava os seus primeiros passos. O segundo ato foi a entrada de outras grandes redes, redistribuindo todas as cartas, com novos investimentos e um novo fôlego, o que fez muito varejista on-line soluçar.  “Já o terceiro ato representa o momento atual, pertencente ao cliente. E quando menciono cliente, o faço da maneira mais ampla possível, indo além do compromisso de entrega. Sem dúvida, uma experiência mais personalizada e um atendimento direcionado são os pontos que merecem mais dedicação e investimento”, pontua Lima.

A atual – e futura – expansão do e-commerce brasileiro está diretamente relacionada a quatro fatores, de acordo com Marcelo Theodoro, diretor da área de serviços e soluções financeiras do BuscaPé para América Latina. O aumento do poder aquisitivo dos brasileiros, especialmente da classe C; mais brasileiros acessando a internet; mais pessoas com acesso a serviços financeiros, e mais segurança nas compras on-line com sites suportados por serviços e soluções oferecidas por renomadas empresas do setor. “O crescimento da penetração de smartphones e os constantes avanços tecnológicos são alguns dos fatores que impulsionam o comércio eletrônico e ainda geram oportunidades a serem exploradas na área mobile, entre elas, a aplicação da visão de iWallet, mobile POS e mobile payments”, afirma Theodoro.

“Acredito que o grande trunfo, no momento, pertence àqueles que têm boas noções de como promover não somente seu produto, mas também sua marca. Um bom direcionamento de foco possibilita que o cliente virtual seja cativado pelo atendimento e pelo serviço prestado, se tornando um cliente habitual”, avalia Gislene Garuffi, especialista em comércio eletrônico e marketing digital.

A investida contra a aparente frieza das lojas virtuais está levando os sites a apostar alto não só em produtos, mas na prestação de um atendimento ágil, cordial, eficaz e diferenciado. O segredo é encantar e fidelizar. “A melhor forma de agradar o usuário é dedicar muita atenção ao que ele busca. A regra básica é os empreendedores atenderem as expectativas dos internautas – entre elas, inovar sempre”, pontua Pedro Eugênio, sócio-fundador do Busca Descontos.

A preocupação constante pela boa experiência do cliente move por exemplo a multinacional decolar.com. Alípio Camanzano, CEO, justifica o investimento de milhões de dólares em novas tecnologias e profissionais de TI. “A comunicação também é fator vital para impacto dos usuários onde quer que eles estejam, seja on ou off-line, claro que de forma medida milimetricamente e balizada para não estressá-los. A proposta é mostrar a todas as classes que comprar viagens pela internet é muito mais seguro do que fazê-lo de forma off-line, por conta da criptografia de dados, por exemplo. Em breve sairemos com campanhas massivas explicando estas diferenças.”

O desafio corporativo passa por uma estratégia muito bem estruturada, que o cliente virtual precisa perceber, com a sutileza virtual da conquista, como ensina Walter Sabini Junior, CEO da VIRID Interatividade Digital. “Uma destas estratégias é criar ações automáticas e individualizadas de atendimento. Com isso, o varejista virtual consegue colocar seus profissionais com foco nos resultados das campanhas, evitando perder tempo com o trabalho operacional”, pontua. É o que reforça também Natan Sztamfater, CEO da PortCasa e sócio diretor da CookieWeb, agência especializada no atendimento a lojas virtuai. O que diferencia um site de outro são ações notáveis como frete grátis com entrega em casa, embalagens diferenciadas que traduzam o conceito da empresa, investimento em plataformas de atendimento on-line, por exemplo.

Na busca pela excelência, o Ótima Oferta, que entrou na febre de compras coletivas, aposta na busca de experiência do mercado, associando-se ao e-bit, especializado em pesquisas de satisfação para e-consumidores. O esforço é no estímulo ao bitConsumidor, provocando intercambio de avaliação de lojas virtuais onde consumidores compartilham experiências no varejo on-line. Eles avaliam as lojas, que acabam ranqueadas em diamante, ouro, prata ou bronze. “Ao nos associarmos a e-bit, podemos proporcionar melhorias em nossos processos, intensificar a qualidade em nossos serviços e garantir a satisfação dos consumidores”, afirma Robson Tavarone, sócio e diretor do Ótima Oferta.

Enquanto o Ótima Oferta disponibiliza um vídeo ilustrativo sobre a oferta, o Giuliana Flores investiu em uma legenda mais clara e direta por produto. A oferta de presentes diferenciados também se torna um atrativo, já que a venda de flores é realizada, muitas vezes, por puro impulso. O Melhor da Vida foi mais radical. Segundo o fundador e CEO, Jorge Nahas, o diferencial está na oferta de produtos segmentados e personalizados. Mas agregado a divulgação nas redes sociais para que os usuários gerem depoimentos de suas experiências e, com isso, desenvolver concursos culturais, promoções e produtos com a ajuda dos clientes. “O processo incluiu redesenhamos o layout do site para facilitar os processos de pesquisa e compra”, diz Nahas.

A aposta do OLX é na simplicidade no processo de anunciar um produto e priorizar a comunicação direta com clientes. Para chegar lá, a empresa criou uma área responsável somente pela fidelização de seus clientes que presta assistência personalizada com dicas de como melhorar sua experiência no site e na internet. “Ensinamos nosso cliente a oferecer um excelente atendimento via e-mail ou telefone e se aproximar ao máximo de seu comprador. Assim, ele fica à vontade e seguro para continuar o trabalho e obter bons resultados com a OLX”, afirma Rodrigo Ribeirão, diretor-presidente da OLX no Brasil e em Portugal.

Direito do consumidor
Um dos desafios do varejo on-line é atrair consumidores que ainda preferem tocar os produtos que compram, ver de perto ou trocar ideias com o vendedor, e convencê-los da praticidade e segurança da compra pela internet. Isso é comum, principalmente, em casos de pessoas que tiveram uma experiência negativa de compra pela internet. “Credibilidade é difícil de conquistar, especialmente quando se trabalha com comércio eletrônico. É normal que algumas pessoas ainda se sintam inseguras, porém, prestar um atendimento preciso e transparente pode transformar a insegurança em satisfação. E a tendência é que essa satisfação seja transmitida a outros clientes, já que a opinião do consumidor é facilmente disseminada, principalmente pela internet”, opina Gislene.

“Para muitos consumidores, ainda há o ´preconceito´ com logística, receio de receber produtos quebrados ou mesmo de pagar e não receber, entre outros. Mas se o site conseguir proporcionar ao cliente uma boa experiência de compra, será mais fácil fazê-lo entender as inúmeras vantagens do comércio eletrônico”, diz Eugênio, do Busca Descontos. Ribeirão, do OLX, concorda. “Uma boa descrição, apresentação do produto de forma clara e sucinta, disponibilidade de telefone e todos os canais possíveis de atendimento e a facilidade em encontrar o produto podem fazer o cliente mudar de ideia e comprar pela internet.”

No caso da Giuliana Flores, a aposta está nas fotos com vários tamanhos e ângulos para o cliente conhecer mais de perto o produto, além de um espaço para os clientes postarem suas opiniões, relatando suas experiências de consumo no site. “Apesar de assistirmos a um enorme crescimento nas vendas pela internet, muitas pessoas ainda têm receio de comprar. Daí, cabe a nós gerarmos a confiança aos nossos consumidores, realizando de forma correta todos os processos de compra e pós compra”, afirma Juliano Souza, gerente de marketing da Giuliana Flores.

As vantagens que a internet proporciona superam o receio de utilizá-la para compras, acredita Camanzano, do Decolar.com. “Pela internet o cliente tem a facilidade de buscar o que quiser e quando quiser, além de poder comparar preços com mais rapidez. Atualmente, ir a uma loja física envolve deslocamento, estacionamento, vulnerabilidade no horário de atendimento e vários retornos para concretização da compra. Definitivamente, não é o nosso caso.” Nahas, do O Melhor da Vida, lembra sobre a importância de investir em segurança. “É indispensável um certificado para garantir a compra de seu cliente e até mesmo para nós estarmos protegidos contra ataques e vazamento de informações.” Para Rubens Branchini Martins, diretor comercial da Eletrônica Santana, é fundamental exibir os selos que comprovam a segurança do site, além da política de privacidade que garante manter os dados do consumidor em sigilo.

Do ponto de vista da advogada especializada em Direito do Consumidor, Gisele de Lourdes Friso, o site deve garantir o cumprimento de seus direitos. Segundo ela, o site deve, primeiramente, informar adequadamente as políticas em relação às compras, aos pagamentos e às devoluções. “Vale lembrar que a informação é um direito básico do consumidor, garantido por lei. E, além da importância de as informações estarem facilmente disponíveis no site, estas devem estar claras, de forma a não gerar dúvidas a quem lê. Chats para sanar dúvidas, ou mesmo formulários de contato, são muito bem vindos, desde que sejam prontamente respondidos, para que não surtam um efeito contrário”, ressalta ela.

Uma das informações que deve ser de fácil compreensão, segundo Gisele, diz respeito à política de devolução de mercadorias que deve estar em consonância com a lei, já que o consumidor tem o direito de arrependimento, ou seja, de devolver o produto adquirido no prazo de sete dias a contar da data de seu recebimento e ainda ter os valores ressarcidos, inclusive o frete de entrega e devolução. “Principalmente com a popularização dos sites de compras coletivas, tornou-se cada vez mais comum no Brasil a venda on-line de produtos como roupas e calçados, que são bastante suscetíveis a troca. Respeitando os direitos do consumidor, o fornecedor via internet terá mais chance de evitar reclamações e situações constrangedoras que, atualmente, podem ser averiguadas com facilidade em sites especializados e nos órgãos de defesa do consumidor”, esclarece a advogada.

O fato de o cliente on-line ainda não valorizar a diferença de qualidade da experiência na compra de um site para o outro também é um obstáculo a ser superado, na opinião de David Bernardo, CEO da HiPXiK. “É difícil ainda justificar grandes investimentos que não gerem escala ou melhoria de preço como acontece nas lojas (por exemplo, preços mais elevados em uma loja com melhor localização, pessoal mais especializado e melhor experiência).” Outro desafio é acompanhar a velocidade das informações e das novidades na web. Neste caso, vale a atualização diária e a conexão direta com todas as tendências do mercado.

Trabalho em equipe
Para superar as expectativas do internauta, o site precisa contar com uma equipe qualificada e que esteja comprometida com o negócio. Para isso, o treinamento contínuo e o monitoramento da atuação dos colaboradores são primordiais para garantir a satisfação do cliente. A especialista Gislene recomenda apostar em reuniões de feedback, treinamentos na área de atendimento ao cliente e de vendas, além de testes periódicos de avaliação da equipe. “Acreditamos que o ideal não é fazer apenas um treinamento pontual com nossos funcionários, mas investir em melhorias diariamente, com base em métricas de eficiência. Para que o negócio funcione como planejamos, dependemos de pessoas que entendam nossos processos. Com menos de um ano e meio de funcionamento, já temos mais de 120 funcionários”, avalia Alex Todres, sócio do Viajanet.

Já o Ótima Oferta conta com nove executivos de contas que, segundo Tavarone, são devidamente capacitados quanto aos processos do site e à estratégia de aliar às oportunidades do estabelecimento às exigências e necessidades do consumidor. “Nossos profissionais são treinados para que, desde o momento da prospecção, consigam transmitir credibilidade quanto aos processos e às estratégias utilizadas pela equipe comercial e de marketing”, garante Tavarone.

No Decolar.com, o processo abrange uma bateria de treinamentos pré ingresso na empresa, acompanhamento constante, pesquisas qualitativas de opiniões e de qualidade (tanto internas, quanto com clientes). Segundo Camanzano, no CAC e no SAC são realizados testes para identificar se os atendentes estão alinhados com as novas leis dos SAC´s, código de defesa do consumidor e normas reguladoras em geral. “São feitas premiações internas semanais de qualidade de atendimento de acordo com a pontuação dos atendentes dada pelo cliente”, completa ele.

O site Giuliana Flores também investe em treinamentos periódicos em que os funcionários novos passam por uma integração com a equipe e são orientados inicialmente pelas gerentes do atendimento. Já o Imperdível conta com uma estrutura de atendimento sediada em Petrópolis (RJ) onde capacita seus colaboradores. Estes são treinados pela chefe de atendimento e também pela gerente de desenvolvimento de talentos e cultura. “Nosso grupo concentra esforços e acredita no valor da qualidade da gestão”, afirma Pedro Guimarães, sócio do Imperdivel.

Na HiPXiK, os funcionários passam por integração e treinamento em cada um dos departamentos da empresa em seus primeiros quinze dias de trabalho. “É fundamental que todos conheçam e entendam o funcionamento da empresa como um todo, apesar de atuar em parte dela. Isso se reflete no atendimento ao consumidor, que é atendido com a rapidez que exige uma operação on-line, e com a transparência e respeito que o consumidor tem direito”, diz Bernardo.

O Melhor da Vida também possui uma área especifica para o atendimento ao cliente, onde os profissionais são qualificados para sanar dúvidas e auxiliar o cliente com dificuldades referentes à navegação ou a compra. “Este funcionário conhece todos os processos e tem acesso a todas as informações administrativas para resolver os problemas no menor tempo possível sem ficar transferindo um cliente a outros departamentos. O principal é realizar treinamentos semanais e realizar alguns testes como cliente oculto”, aposta Nahas. Ribeirão, do OLX, conta que a empresa aplica um treinamento de quinze dias para novos funcionários que aborda a história da empresa, cada departamento e funções, processos internos e diários, além do atendimento ao cliente, prospecção e fidelização.

“A tendência do comércio eletrônico é um estreitamento cada vez maior do relacionamento entre o site e o cliente. O mercado é muito competitivo e se transforma todos os dias, assim como os clientes. Acredito que acompanhar as constantes mudanças do e-commerce seja o principal desafio, mesmo para quem já está no mercado há anos. Além disso, com o aumento do número de empresas atuando na internet e da adoção de procedimentos de segurança, a expectativa é que a compra virtual ganhe cada vez mais credibilidade e conquiste ainda mais espaço no processo de consumo do brasileiro”, finaliza Gislene Garuffi.

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