Prega-se no mercado que as decisões devem ser tomadas com a razão. Porém, se José Efromovich tivesse se atido a ela, hoje provavelmente a Avianca Brasil não existiria. Em 2007, a ainda OceanAir, viveu um momento delicado. Embora viesse em um processo de desenvolvimento, com a compra da colombiana Avianca e a aquisição de novos aviões, a companhia aérea estava perdendo dinheiro – o EBITDA foi 55,5% negativo. “Íamos para o precipício, correndo o risco de fechar em seis meses”, relembra o presidente, acrescentando que apesar do mal momento, via no setor boas perspectivas. E com o coração, decidiu que era necessário manter a empresa. “Não podíamos sair. Por isso, abrimos mão de outros ativos para investir nesse negócio. Resolvemos fazer uma grande reestruturação”, contaEfromovich.
Nos dois anos seguintes, buscou arrumar a casa, ajustar processos e treinar os funcionários. E foi nesse momento que a empresa deu a virada. Mais do que promover mudanças internas, a empresa viu que precisava fazer algo diferente do que havia, para conseguir se destacar em um mercado dominado por duas empresas. A estratégia foi investir na qualidade dos serviços oferecidos aos clientes. Como resultado, mais do que equilibrar as contas, a AviancaBrasil passou a ter uma boa reputação, com a prestação de um serviço adequado. “O consumidor começou a gostar do que estávamos oferecendo.”Tanto que, nos últimos anos atingiu os maiores níveis de ocupação na indústria. Esse ano,já está com 81% na média, enquanto o setor costuma ficar em 77%. Em entrevista exclusiva à revista ClienteSA,Efromovichdetalha essa transformação pela qual a companhia passou, conta como foi o inicio de tudo e projeta o cenário para o futuro do setor.
Como começa a sua vida de empresário?
Começou, quando ainda era aluno defaculdade, no curso de engenharia civil, e precisa me sustentar. Em 1971, comecei a dar aula particular. Como o número de alunos foi aumentando, meu irmão e eu montamos um cursinho, que com o tempo virou um cursinho de madureza, o que hoje é chamado de supletivo. Foram dois anos. No entanto, por conta dos estudos, tivemos que vender a escola. Terminada a faculdade, fiz estágio e comecei a trabalhar como engenheiro civil onde fiquei por um ano. Era 1977, quando meu irmão e eu criamos uma empresa de controle de qualidade para a área industrial. Fazíamos inspeções de instalações industriais, plantas de petróleo, refinarias, oleodutos, gasodutos e plantas de hidroelétricas. A partir daí fomos nos desenvolvendo, ampliando nossos negócios. Começamos a distribuir produtos para área industriale entramos na área médica vendendo filmes de raio-x e materiais radioativos para diagnóstico de câncer.
E quando surgiu a ideia de criar a OceanAir?
Em 1998, uma das empresas para a qual prestávamos serviçoem Macaé não conseguiu pagar a conta e ofereceu dois aviões como pagamento. A princípio, decidimos utilizá-los para levar os nossos colaboradores do Aeroporto de Santos Dumont para Macaé. Depois de quatro meses,estávamos dando carona para amigos. Foi quando vimos que ali havia um negócio. Montamos uma empresa de taxi aéreo regional. Começamos a transportar pessoas e dinheiro. Em uma dessas viagens, no aeroporto de Campos, fomos assaltados e tivemos um dos aviões metralhado, resultando em perto total. Fomos atrás de outro para substituir e compramosquatro aviões Brasíliada Rio Sul. Logo depois adquirimos mais três Brasília nos EUA, da Delta. Em 2002, passamos a ser uma empresa aérea regional operando no sudeste do Brasil, a OceanAir Linhas Aéreas. Até que, em 2010, passamos a utilizar a marca Avianca.
Mas como foi esse processo?
Voltando a 2004, ainda como empresa regional, nos habilitamos em uma concorrência com mais duas companhias onde estava sendo vendida a Avianca, da Colômbia. Ela estava no processo de recuperação judicial na corte americana. O juiz optou pela nossa proposta financeira e, em dezembro de 2004, compramos 50% que pertencia a família Julio Santos Domingos e 25% dos 50% restantes que pertencia a Associação dos Cafeicultores da Colômbia. Tínhamos uma opção da compra dos 25% restantes por quatro anos, mas depois de dois anos já aexercemos, assumindo o controle total.
Ainda assim, mantiveram as marcas separadas?
Começamos a trabalhar as duas empresas de maneira totalmente independente. No Brasil, fomos desenvolvendo as nossas atividades como OceanAir. Em 2007, tínhamos 34 aviões,de seis modelos diferentes, com vôo para o exterior. Estava tudo maravilhoso, só que perdíamos dinheiro. O nosso EBITDA, na época, foi 55,5% negativo. Não é que fazíamos a coisa mal feita, mas os aviões que compramos já estavam com mais de 20 anos e tínhamos aeronaves muito diferentes. Na hora de operar, isso trazia enormes dificuldades. Íamos para o precipício, correndo o risco de fechar em seis meses, quando resolvemos fazer uma grande reestruturação. Em 2008 e 2009, nosso trabalho foi só de arrumar a casa, ajustar processos e treinar os funcionários. Devolvemos 22 aviões e ficamos sócom 14 Fokker MK 28. Isso fez com que os mecânicos fossem todos treinados para um único equipamento, assim como pilotos, comissários, comandantes e estoque.Aprendemos que esse tipo de indústria demanda determinadas ações e pré-requisitos que a gente não vinha respeitando, então com muita humildade demos alguns passos para trás e nos preparamos para avançar de novo. E esse processo de reestruturação tem sido extremamente bem sucedido, no sentido de que o EBITDAnegativo vem diminuindo. Nesse ano, já devemos equilibrar as contas. Masfoi a partir de 2010 que começamos a crescer novamente. A própria marca OceanAir passou a ter uma boa reputação, com a prestação de um serviço adequado. O consumidor começou a gostar do que estávamos oferecendo.
Foi quando decidiram mudar a marca?
Vimos que era o momento de aproveitar o histórico da Avianca. Com mais de 90 anos, ela é a companhia em operação mais antiga de todas as Américas e a segunda mais antiga do mundo.Não mudamos a marca logo no início da reestruturação, para que não ficasse configurado que escondíamos algo que não era bom. Primeiro procuramos arrumar o serviço e trazer aviões novos.
Nessa reestruturação também houve uma preocupação com a percepção de qualidade pelo cliente?
Na época, tivemos que tomar uma grande decisão de como iríamos retornar para o mercado, que estava muito concentrado – mais de 90% na mão de duas empresas. A nossa decisão foi fazer algo diferente do que havia.Optamos por oferecer um espaço maior entre as poltronas. Nossa empresa tem o selo A, reconhecimento da Agência Nacional de Aviação Civil que classifica o espaçamento entre todas as poltronas de das aeronaves. Mais do que isso, os aviões que começaram a integrar a frota, a partir de 2010,já vieram com televisão individual, possibilidade de entrada USB e para carregar computador. Também trouxemos de volta a comida para o avião, mesmo em vôos curtos. Com tudo isso, estabelecemos um produto bastante sofisticado no que diz respeito a atendimento e pontualidade. Hoje, estamos direcionados para descobrir o que mais precisamos fazer para que o cliente continue feliz e se mantenha fiel. Em nossas reuniões, não discutimos o marketshare, mas o que o cliente quer a mais do que já estamos fazendo, para continuar dando preferência a nossa companhia.
Como chegaram a essa cultura de cliente?
O SynergyGroup, do qual a AviancaBrasil faz parte, tem um DNA voltado para qualidade. Acreditamos que fazer direito é melhor, mais barato e aumenta a chance de retorno. Trazendo isso para o dia a dia, trabalhamos com processos pré-estabelecidos. Exemplo é o nosso atendimento. Quando colocamos alguém nocallcenter para atender a demanda de um passageiro, esse colaborador tem que tersido passageiro alguma vez. Por isso, os operadores vão ao aeroporto, ficam na fila dos passageiros, embarcam, fazem vôos, para vivenciar a experiência de ser um passageiro. Interessante citar que o callcenter é um centro de fornecimento de mão de obra para as outras áreas da empresa, como segurança, de atendimento, administrativa, manutenção.
É uma cultura que está em toda a empresa.
Todos os nossos colaboradores passam por um treinamento básico que é voltado única e exclusivamente a fazer com que tenha vontade, gosto e paixão de satisfazer o passageiro. Essa é a nossa meta e o nosso foco. Isso é diário e procuramos vivenciar a cada minuto. Em cada uma das áreas, existe o conceitode que o cliente tem que estar satisfeito para voltar.
E como fazer para equilibrar o preço com essa promessa de qualidade?
Quando desenhamos o novo produto, nos primeiros dois anos, o desafio foi o da implementação. A partir daí, com o crescimento, o desafio passou a ser o de cultivar esse conceito, fazendo com que todas as pessoas mantenham com muita humildade essa vontade de fazer as coisas bem feitas para agradar e servir bem o cliente. Foi nesse fazer constante, na melhoria diária, que conseguimos nos últimos anos atingir os maiores níveis de ocupação na indústria. Esse ano, estamos com 81% na média. O setor normalmente fica em 77%. Isso faz com possamos equilibrar a receita, sem ter que aumentar muito o preço. O preço é balizado pelo mercado, no entanto, oferecemos muito mais do que a indústria e não cobramos por isso. O cliente utiliza e volta porque teve um bom serviço a um preço justo.Óbvio que se tivéssemos um fator de ocupação de 50%, teríamos que cobrar um preço mais alto para pagar as contas. É simples: trazemos mais gente para o avião, o preço fica equilibrado e todos ficam satisfeitos, clientes e Avianca.
Pelos números, o cliente tem aprovado.
Sim, mas quero ver todo os aviões sempre lotados. Vale dizer que também ouvimos os nossos clientes. Esse é o segundo ano que realizamos uma pesquisa de satisfação. Os resultados foram bastante agradáveis em termos de retorno do que o cliente está percebendo do nosso trabalho.
Já está tendo retorno sobre o investimento?
Ainda falta um caminho a percorrer. A meta, hoje, é equilibrar as contas e sair do negativo, o que já estamos conseguindo. O próximo passo será desenhar como que vamos nos posicionar no mercado, sempre tomando como premissa não perder o que se construiu em termos de produto e nível de serviço que prestamos aos passageiros.
Teu objetivo é ser a melhor companhia aérea na prestação de serviços ao cliente?
Não tenha dúvida, um dos nossos planos é sermos uma das empresas mais queridas dentro da indústria.Os fabricantes para esse setor trazem produtos novos ano a ano, em acessórios e tecnologias. Estamos atentos para o que surgir de novo e vamos procurar incorporar tudo que fizer sentido, que estiver dentro daquilo que o passageiro espera e dentro do modelo de negócio que resolvermos implementar.
E para o futuro, o que o Sr. espera?
Sou otimista em função de que o Brasil é um país continental e depende da indústria de aviação. Esse é o primeiro passo para dizer que estamos nesse negócio. Só que o setor apenas vai funcionar bem se tiver uma boa infra-estrutura. Nisso também estamos enxergando um bom caminho pela frente. Os principais aeroportos do país estão sendo privatizados, com novas concessionárias, e passando por um processo forte de adaptação e mudanças. Paralelamente, o governo continua falando em concessões. Além disso, ele se comprometeu a investir mais de R$ 7 bilhões na preparação de 270 aeroportos para atender a regionalização, que também se faz necessária. Poderia dizer que essa infra-estrutura talvez seja um dos maiores entraves que estamos vivenciando hoje para crescer. Como essa evolução ainda está acontecendo, acreditamos que o fim desse processo irá acontecer dentro de três a quatro anos junto com a retomada do crescimento do País, o que irá favorecer um cenário positivo para nossa indústria.