A volta da Gradiente: o que mudou em 5 anos?



Autor: Marcos Morita

 

Empresa que marcou época nos anos oitenta, a Gradiente decidiu retornar ao mercado em decorrência de pesquisa realizada. Os resultados demonstraram a admiração e lembrança dos consumidores com a marca, uma vez que muitos não sabiam de sua saída das prateleiras, ocorrida há seis anos. Os produtos de áudio e vídeo, três-em-um e televisores de tubo, eram considerados inovadores e de qualidade. Ainda me lembro do “Meu Primeiro Gradiente”, toca-fitas colorido, sucesso entre crianças que se divertiam entoando canções do Trem da Alegria.

 

O relançamento se dará primeiramente por meio das vendas via e-commerce, sendo o varejo o próximo passo. O público infantil será um dos focos da empresa, tentando resgatar o apelo emocional dos antigos usuários da marca, hoje responsáveis pais de família. Caso semelhante ocorreu com a fabricante de brinquedos Estrela, cujos produtos marcaram gerações. A empresa de Guarulhos foi duramente afetada com a entrada dos chineses e marcas globais, reduzindo em quase dez vezes o número de funcionários.

 

Para voltar a crescer também aposta na emoção, relançando verdadeiros desejos de consumo do passado como Autorama e Ferrorama. Apesar do saudosismo, resta saber se às crianças hiperativas de hoje, acostumadas a realidades virtuais em 3D e contatos online em redes sociais, se renderão aos momentos lúdicos promovidos pelos brinquedos de antigamente. Apesar das oportunidades existentes pela lembrança das marcas, o mundo é bastante diferente do encontrado há algumas décadas, exigindo maior musculatura, recursos e competências. Vejamos.

 

Concorrência: empresas em sua maioria nacionais e familiares dominavam a cena. Caloi, Monark, Trol do ex-ministro Dilson Funaro, Xalingo e Bandeirante, com seus jipes vermelhos e triciclos de ferro foram substituídas por concorrentes globais como Sony, Microsoft e Nintendo, as quais investem bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento de seus novos consoles e jogos. Saudades do Atari, e dos inocentes Pac Man e Donkey Kong.

 

Inovação: a curva de ciclo de vida; introdução, crescimento, maturidade e declínio; está cada vez mais rápida, com novidades lançadas a todo o momento. Para não perder mercado, empresas canibalizam os próprios produtos, disparando novidades antes da concorrência. A Apple é um exemplo desta nova tendência. Seus lançamentos mundiais literalmente sacodem o mercado, deixando críticos e consumidores ansiosos pelas novidades.

 

Opções: em épocas de reserva de mercado e restrições a importações, a variedade era relativamente restrita, o que fazia com que os consumidores tivessem que se contentar com produtos muitas vezes obsoletos e com baixa tecnologia embarcada. A internet, a globalização e as viagens internacionais cada vez mais acessíveis têm trazido opções praticamente infinitas a clientes cada vez menos fiéis, com raras exceções.

 

Produção: considerados os grandes ativos das empresas no passado, os parques fabris são hoje terceirizados em sua grande maioria, cuja localização pouco importa aos usuários finais. Para ter escala e preços competitivos as corporações buscam mão-de-obra em qualquer ponto, esteja ele no país ou no sudeste asiático. Em contrapartida, investimentos em tecnologia, inovação e construção de marca.

 

Enfim, o ambiente de negócios será bastante diferente do encontrado há algumas décadas, quando estas empresas dominavam grandes fatias de seus mercados com produtos e marcas que conquistaram gerações. Dar a volta por cima será uma tarefa hercúlea, mesmo com a admiração de seus antigos consumidores. Grandes volumes de recursos serão necessários para reerguê-las, num cenário em que a concorrência se mostra cada vez mais feroz.  O mercado já está grande demais para estas marcas as quais acredito, não passarão de gostosas memórias acessadas via YouTube quando a saudade bater.

 

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ.

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