A simplicidade é a arma do negócio

São 70 mil associados que ligam do Brasil inteiro para uma central de atendimento com 21 posições de atendimento. Fora, uma outra central faz o relacionamento chamado de pós-venda para identificar a satisfação do cliente. E tudo com 80 funcionários. Mas o resultado é um índice de 0,09% de satisfação que comemora com entusiasmo o presidente José Valdir Ribeiro dos Reis, da Cooper forte, a cooperativa de economia e crédito mútuo dos funcionários de instituições financeiras públicas federais, que nasceu em 21 de agosto de 1984, resultado de uma caixinha de funcionários do Banco do Brasil. A idéia, de Oséas Maurer, foi transformar o conceito em uma instituição para permitir acesso ao maior número de funcionários a princípio do BB a créditos e com baixo – sem perder o conceito cooperativista que a originou. Hoje, é modelo. José Valdir abriu a Cooper forte a funcionários de outras empresas estatais e vem colhendo, nos últimos anos, crescimento constante. Movimenta algo em torno de R$ 300 milhões e tem patrimônio líquido na casa dos R$ 90 milhões. Apenas em setembro o volume de empréstimos atingiu R$ 234 milhões.
E ele não parou por aí. Agora quer contribuir com a comunidade com o projeto Passaporte para o Futuro, onde já atende 40 jovens em Brasília e quer expandir para o resto do Brasil, o que o levou a criar em 2003 o Instituto Cooperforte, seu braço social. Hoje são 500 adolescentes, entre 16 e 17 anos, beneficiados em várias cidades do País e, o resultado, foi o prêmio Ouro no 4º Prêmio ABT de Responsabilidade Social. “Foi uma grata surpresa, em nossa primeira participação”, resumiu.
Funcionário aposentado do Banco do Brasil, marcou sua entrada na instituição presenteando o livro Reclamação de Cliente, Não Tem Melhor Presente (Janelle Parlow e Claus Moller – Editora Futura) a todos os funcionários. Um ato que o gerente de marketing, Hermano José Valdevino de Brito, lembra com satisfação. “Foi a primeira demonstração do caminho que ele ia imprimir à instituição”, salienta. Sempre disposto a atender todas as reclamações, por telefone ou lendo os relatórios fornecidos pelo sistema, ele acompanha passo a passo o desenrolar de cada uma delas. O exemplo que ele mais gosta de contar, para explicar seus objetivos, é o de um associado que estava na praia e em pleno domingo lembrou-se de que tinha contas a pagar na segunda e não dispunha de dinheiro. “O associado foi a um orelhão, ligou para a cent ral e, apenas através do atendimento eletrônico, fez um empréstimo. E voltou a curtir seu dia de sol”, resume José Valdir. Esta é mais uma Exclusiva que merece atenção, pois o Presidente da Cooperforte nos revela como fez para a transformar em respeitada instituição e crescer frente a um mercado onde as taxas de juros especialmente onde atua têm se aproximado muito do praticado pelo mercado. Para crescer, a aposta dele é segmentar, atender bem e com muita simplicidade, como o exemplo da praia. Bom benchmark.
Como o senhor associa a questão do relacionamento com o cliente ao sucesso da sua gestão?
Quando tomei posse na Cooperforte, havia um número de telefone para atender o associado. E essa ligação tocava em todos os telefones, até um estar disponível para puxar a chamada. Era um caos completo, pois gente do Brasil inteiro ligava para nós. E gerava uma fila enorme no atendimento. Um amigo, que trabalhamos juntos no Banco do Brasil, tentou me ligar, quando soube que eu havia tomado posse na cooperativa e não conseguiu. O telefone estava sempre ocupado. Ao saber desta e de outras coisas, decidi instalar um call center, por volta de 1998.
E como o senhor fez para estruturar a central?
Fizemos aqui várias palestras sobre o assunto, mas nada agradou. Então conversei com três funcionários e decidimos enviá-los para São Paulo, para participarem de cursos sobre instalações de call center e central de atendimento. Eles voltaram entusiasmados com o que viram, a viagem serviu também para eles conhecerem Ana Maria Monteiro. Passamos então a analisar o mercado e colher mais informações sobre a empresa dela, a Am3. Tivemos ótimas referências e a contratamos para instalar o call center, selecionar e t r einar o p essoa l. E estruturamos nossa central com o que há de mais moderno no mercado.
E como foram as melhorias?
A partir daí o atendimento deu um salto de qualidade e passamos a crescer a taxas muito altas. Além disso, permanentemente passamos a fazer um trabalho de ‘auscultação’ com o cliente, identificando seu grau de satisfação em relação ao atendimento. Inclusive criamos a política de GSC, Gerenciamento de Satisfação do Cliente, no sentido de ter um relacionamento mais próximo com o associado e verificar quais são suas demandas. O GSC traz informações muito interessantes, pois neste canal é o cliente quem nos contata. Além disso, há o pósvendas, realizado em outro call center, onde entramos em contato com o associado para saber como é que está sendo feito o atendimento, se ele tem alguma reclamação a fazer e se quer fazer alguma sugestão.
O call center agregou inteligência ao negócio?
Exatamente. Foi o call center que permitiu essa proximidade toda com o associado. Ainda temos mais uma vantagem: somos uma cooperativa de crédito com associados no País inteiro. Quer dizer, de qualquer parte, ele pode ligar pelo 0800, nós pagamos sua ligação e ele próprio faz seu empréstimo pela URA, pela comodidade. Mas caso não queira efetuar a operação, volta ao call center e nós realizamos o empréstimo. Nós somos uma empresa virtual. Há alguns pontos de atendimento no Rio, São Paulo Belo Horizonte e Porto Alegre, mas a partir de Brasília atendemos o Brasil inteiro. A nossa tecnologia permite fazer tudo por telefone. Aliás, mais de 90% das operações são feitas por telefone.
O senhor chegou a criar serviço novo ou remodelar produtos em função do relacionamento com o seu cliente?
Sim. Este modelo inclusive de atendimento é inédito. Eu particularmente não conheço nem um outro lugar onde se faz empréstimos por telefone que funciona de forma fácil e simples. Uma vez fui fazer uma apresentação a associados e potenciais associados, em Cabo Frio, no Rio de Janeiro. Alguns fizeram questão de contar seus cases. Um disse que morava no Rio de Janeiro, era um domingo e ele estava na praia tomando cerveja e lembrou que tinha que pagar uma prestação na terçafeira, mas estava sem dinheiro. Ele pegou um telefone público, ligou no 0800 e fez o empréstimo. Voltou à praia e continuou a beber sua cerveja. Na segunda, o dinheiro já estava disponível na conta dele. Ao terminar de contar sua experiência, conseguimos mais 40 associados. Essa facilidade que nós proporcionamos ao cliente é um fator de grande sucesso.
Mas como surgiu esse modelo?
Essa questão de fazer o 0800 é anterior à minha chegada, eu apenas facilitei. Para fazer empréstimo por telefone é preciso ter um contrato. Para isso, bolamos o contrato de abertura de crédito, onde o associado assina uma única vez e nunca mais precisará assinar documento algum. Isso facilitou demais a vida deles.
Foi só agregar conhecimento, então?
Justamente, agregamos tecnologia e prestação de serviço com esse contrato de abertura de crédito, que evita do cliente estar sempre assinando uma nova proposta de empréstimo. Não foi só a vida do associado que melhorou. A nossa também, tanto que a Cooperforte atende o Brasil inteiro com 80 funcionários.
E o Presidente atende seus associados?
Outro dia recebi um associado que tem dinheiro aplicado. Ele queria transferir de sua conta direto para a conta da sua filha, usando o BB. O funcionário que o atendeu, disse que não seria possível. Insatisfeito, o associado me ligou reclamando e me comprometi a resolver. Mais tarde retornei a ligação para avisar que tudo estava resolvido. Nós trabalhamos dessa forma para satisfazer o cliente: quando eu acho que a minha ligação é necessária, não hesito em ligar e explicar como funciona nossa política de atendimento. Vou dar mais um exemplo: esteve aqui no atendimento pessoal um associado reclamando que nossas taxas estavam mais altas do que as dos bancos. Aí eu pensei: não pode ser. Liguei para ele e expliquei como funcionam as taxas. Ele ficou surpreso e perguntou por que eu havia ligado e não o meu gerente. O associado disse: ´olha, eu vou citar você como exemplo para o pessoal aqui na minha empresa por essa atenção dispensada ao cliente´.
Como o senhor multiplica essa prática para atingir todos os clientes?
O pós-vendas faz um serviço de amostragem dos clientes que foram atendidos e nós ligamos para eles. Com base nas informações coletadas de forma aleatória verificamos se o atendimento está bom ou ruim. Montamos a partir daí um relatório, que passa pelo gerente e diretores, depois chega na minha mão. E verificamos o grau de satisfação, o que o cliente tem a reclamar, se faz alguma sugestão, etc. O que achamos que é factível mandamos para análise. Tabulamos as que não podem ser implementadas para verificação posterior, pois se houver muito associado com a mesma reclamação, passamos a examiná-la. Se não for viável, inserimos uma matéria em nosso jornal explicando o porquê da não implementação.
O que é inviável, por exemplo?
Alguns clientes sugerem que seja criada uma linha de crédito imobiliário. Esse é o tipo de empréstimo que para uma cooperativa de crédito é inviável. Principalmente porque exige muito recurso de longo prazo para que a taxa de juros seja muito baixa.
Isso ajuda a cativar o cliente?
Sim, porque essa atenção dispensada aos pleitos dos associados, às suas angústias e demandas é que cativam. Isso é importante devido à peculiaridade das cooperativas, porque o associado é cliente e dono do negócio ao mesmo tempo. Quer dizer, ele tem que se sentir dono também. É isso que tentamos passar para ele o tempo todo. E tem mais: o cliente pode dispensar todo mundo da empresa, basta que ele passe a comprar no vizinho. Aqui é pior ainda, porque ele é dono e pode nos dispensar com mais facilidade. Portanto, eu procuro sempre fortalecer esse conceito no atendimento, para que a qualidade tenha prioridade máxima. O cliente tem que estar no pedestal e portanto merece nosso respeito e consideração; o restante vem depois.
Qual é a base do relacionamento com o seu cliente?
Na internet nós temos pouca coisa, hoje o associado apenas retira o extrato. O investimento nesta mídia, para transportarmos um modelo como o do 0800, onde ele faz tudo automaticamente, é muito caro. O associado pode até fazer o empréstimo através da web, mas tem que imprimir o pedido para que possamos efetuar o processo aqui.
A web não é prioridade então?
Inauguramos um novo site em julho, mas chegamos à seguinte conclusão: não agradaria muito ao associado e uma das nossas preocupações na criação de qualquer serviço é justamente agregar valor.
Mas a web não agrega valor?
Nosso sistema funciona 24 por dia, durante os sete dias da semana. Além do mais, o sistema de segurança na web é muito caro e, como somos uma instituição pequena, f icaria muito custoso disponibilizar a operação também na internet. Resolvemos então postergar a idéia e continuar dando ênfase na qualidade do atendimento, através do 0800. E o nosso serviço funciona mesmo. Existem alguns serviços desse tipo por aí que não funciona de jeito nenhum. Aqui você liga e o 0800 diz: ´se você quiser pode fazer a operação diretamente. Se não, aguarde um segundo que vamos transferi-lo para o call center´.
Quais os canais mais utilizados para se relacionarem com o cliente? Vocês utilizaram outras ferramentas de marketing direto por exemplo?
Não. Nós não usamos marketing direto, às vezes fazemos algumas malas diretas. Mas isso é uma tentativa deadquirir novos associados. O que utilizamos muito é o telemarketing ativo, que serve tanto para buscar novos clientes quanto para lembrar que a Cooperforte existe e para oferecer serviços, além, claro, do atendimento receptivo.
O objetivo é operar da maneira mais simples possível para poder transferir o benefício para o cliente dentro do menor custo possível?
Sim, e também trabalhar com ganho de produtividade. Recentemente tivemos que fazer um ajuste na taxa de remuneração, devido a mudanças econômicas, o que deixou nossas taxas muito altas. Fizemos a adequação e demos aos associados prazos para ele sacar o dinheiro com as devidas remunerações. Já os depósitos efetuados depois seriam remunerados com base na taxa nova. Um funcionário me perguntou se na hora de sacar o dinheiro seria usado o recurso antigo ou o novo. Respondi que faria sempre o que fosse melhor para o cliente. Ou seja, era só optar pelo que lhe parecesse melhor. Quando o cliente deposita algum valor aqui, há uma carência de 30 dias. Se ele sacar o dinheiro antes desse prazo, não ganha remuneração alguma. Um associado pediu o resgate no período de carência e não recebeu nada. Mais tarde ele ligou reclamando que havia sido prejudicado. Tranqüilizei-o e fui falar com o meu gerente para que fizesse o cálculo dos dias que o cliente perdeu e depositasse na conta dele em seguida. Depois, foi só elogios que recebemos.
E qual é o nível de reclamação?
As estatísticas das reclamações feitas são de 0,09%. Ou seja, nós temos um número da satisfação de 99,91%. O nosso pessoal tem sempre uma explicação para dar ao associado. Se mesmo assim ele não ficar satisfeito, aí sim, ele registra uma reclamação, que são mínimas. O associado diz que o atendimento é ótimo e os agentes são objetivos. A filosof ia da Cooperforte é a de não endividar o associado, porque se endividá-lo além da conta, ele não poderá saldar seus compromissos e a conseqüência é o transtorno, tanto para ele quanto para nós. Por exemplo, um associado sugeriu que fosse criada uma linha de crédito educacional, sendo que já existem convênios com as faculdades, onde pode se obter 20% de desconto e a Cooperforte disponibiliza empréstimo pessoal para esse fim também.
Qual é o pulo do gato da Cooperforte?
Simplicidade, facilidade e agilidade. Somos muito ágeis, até para dizer não a gente é rápido. E tudo é conseqüência de várias coisas congregadas. Muita gente me pergunta qual foi o fator do sucesso da Cooperforte. Nós temos um 0800 eficiente, onde você faz sugestões e reclamações, efetua empréstimos todos os dias e hora. Mas ele não é o único fator. Eu lhe digo que o pulo do gato é essa facilidade que o associado tem.
Você tem um índice de inadimplência muito alto?
O índice de inadimplência aqui é menos de 1%, é muito baixo. Para se ter uma idéia, o relatório do Banco Central mostra que a inadimplência nos bancos é de 7%.
Mas o desconta é em folha de pagamento, não é?
Apenas uma parte é descontada em folha; outra, em débito em conta.
O associado então não tem como fugir.
Tem, sim. Se ele não tiver o dinheiro na conta, acabou. Mas sempre procuramos facilitar a vida de nosso associado. Agora mesmo, com a greve dos bancos, decidimos adiar a cobrança das parcelas de empréstimos por um mês, visando facilitar os associados que terão descontos no salário de parte dos dias parados.
Mas a cooperativa não vai ter problemas ou o senhor pessoalmente em função da decisão?
Não. Até por que a decisão é da diretoria e tem o objetivo de facilitar o associado em um momento delicado, além do que, não trará conseqüências financeiras à coorporação. E também faz parte do processo de relacionamento com nosso cliente, entendendo uma situação momentânea.
Diante do conceito que conseguiu implementar na instituição e pelo nível de satisfação alcançado, o senhor é muito exigente como cliente?
De certa forma sim. Tenho reclamado muito e em vários momentos. De forma geral, não me sinto um cliente muito satisfeito. Em 1995 a Cooperforte perdeu cinco mil associados da noite para o dia, todos foram demitidos. De uma forma geral esse pessoal causou problemas. Mas normalmente, quando há empréstimos nós tentamos cobrar tudo de uma tacada.

Números da Cooperforte
– R$ 18 milhões devolvidos aos associados ou investidos.
– Em 2003, cresceu 36%. Em julho estava com ativo de R$ 283 milhões.
– Até julho de 2004, emprestou R$ 217 milhões.
– O capital de reserva atingiu R$ 90 milhões.
– Índice de qualidade de carteira da Cooperforte é de 98,4%, contra a média de 98% do mercado.

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