Até o CRM pede socorro!



O grau de sofisticação das ofertas, proporcional aos impactos dos avanços tecnológicos, na grande maioria dos produtos, é um dos principais fatores da queda na qualidade dos já sofríveis serviços de atendimento ao cliente.  Alguns exemplos me ajudarão a esclarecer o assunto.

 

Os serviços bancários tiveram nos últimos 20 anos uma mudança gigantesca. Do papel, restrito às agências, hoje chegamos ao extrato no smartphone. Do saque com cheque no caixa à transferência feita pelo internet banking.  E tem todo o resto que se usa intensivamente. E na captação de clientes, talvez seja um dos segmentos que mais utiliza modelagem preditiva e inteligência na segmentação de clientes. Esta operação sofisticada requer sistemas de informação e tecnologia de ponta e algumas até nem bem estabilizadas. Tem as questões de segurança que também envolve tecnologia sofisticada. Além disso, todo o produto bancário tem sua retaguarda em sistemas de informação que interagem com estas plataformas de operação. Enfim, quando um sujeito tem um problema em sua conta corrente do tipo uma aplicação que deveria ter o resgate efetivado em uma data e não acontece, onde está o problema? Eu não sei. E o pior é que o (a) agente da central de atendimento sabe menos ainda. Pela ignorância e falta de preparo, acabam dizendo coisas erradas e irresponsáveis. O cliente fica desassistido e até receoso, face às questões dos frequentes casos de fraude que os bancos nos lembram todo dia.

 

Por outro lado, o que os bancos vendem em suas mensagens? Toda esta facilidade, flexibilidade e conveniência que os meios eletrônicos e a tecnologia, teoricamente, permitem. Investem muito em marketing para vender esta idéia. Porém se esquece do dia a dia. Muito pior do que isto é o fato de que o Brasil, por ser ainda um país de jovens, tem profissionais impacientes com dúvidas dos clientes. Quanto mais acreditam que no outro lado da linha tem uma pessoa mais madura, mais acham que o problema está na falta de conhecimento do cliente na nova e surpreendente tecnologia, mesmo quando ela não funciona – aliás, não é nada raro.

 

Os serviços de telefonia, os quais foram responsáveis pela primeira grande onda na implantação do CRM, não precisam de muitas análises para serem  reconhecidos como dos que mais têm evoluído e se sofisticado. A convergência fez do telefone celular um computador pessoal com capacidade de comunicação por voz e dados fantástico. O smartphone. A complexidade do serviço é, naturalmente, muito grande. E quando não funciona e a gente liga para a central de atendimento seria natural que o “outro lado” estivesse preparado. De novo é o mesmo drama e a mesma impaciência. O problema é sempre do usuário. Quando insiste, é porque não “está sabendo usar o esmartifoni, senhor”.  O serviço oferecido pela minha operadora funciona corretamente menos de 2/3 do dia. Eu pago a tarifa integral. O marketing diz que o sinal é de qualidade. E eu sou somente um sujeito de meia idade que provavelmente tem problemas com a tecnologia segundo um agente me deu a entender. “O senhor está tendo dificuldades com o aparelho, ele é complicado mesmo. Já perguntou ao seu filho. Ele deve saber”. Meu filho nem usa essas sofisticações. Quem gosta de gadget ou “porrinhola” como um amigo o denominou outro dia, sou eu. Ele não entende nada disso.  O serviço é que não funciona. Mas é vendido como se funcionasse. Cobrado e pago da mesma forma.  Depois dizem que conhecem o cliente.

 

Finalmente tem os serviços de internet, igualmente motivado pela convergência já se junta com TV por assinatura e telefone.   Quem os usa? Todo mundo. Para lazer, para a escola, para trabalhar.

 

O meu provedor de serviços, por exemplo, acha que todo mundo que usa é adolescente e frequenta festas animadas por um simpático general caucasiano.  Esta é a “retórica do marketing”. Não seria nenhum problema se eles proibissem a venda para aqueles que são profissionais e usam a internet, por exemplo, para trabalhar. Mas também usam a TV para se distrair e o telefone. Mas como proibir a venda? Perguntará você.  É simples. Se fosse só uma questão de mensagem mercadológica para conquistar um segmento alvo importante, até daria para compreender. Mas quando o agente da central de atendimento me pergunta se “o problema é que não está conseguindo baixar vídeos do You Tube?”, quando estava reclamando a falta de sinal, me faz acreditar que todo mundo lá acha que estou na mesma festa. Não acho que os acionistas da provedora concordem com esta postura. Já perguntei isso uma vez para um diretor. Pior do que isso. A ouvidoria tem problemas de audição: não escuta e não responde. O técnico que vem ao local para tratar do assunto usa equipamento rudimentar e parecem aquelas caras da antena externa: “Hei, ta pegando?”, “Não, vira ai”, “Vira Mais”. E enquanto isso o nível de serviço fica horas e às vezes dias.

 

Certamente não por coincidência, que estes serviços são campeões de críticas e queixas até no Procon. Não há CRM, conceito ou tecnologia, que sobreviva a esta falta de coerência na gestão dos negócios e é um desafio diário a tentativa de descobrir em que momento e onde a ruptura ocorreu.

 

Em nome do cliente, o CRM pede socorro!

 

Enio Klein é diretor da K&G e professor dos cursos de MBA/Marketing da FEA/USP. Entre no blog e deixe lá o seu comentário: http://blogclientesa.clientesa.com.br/napeledocliente

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