Como se faz para pulsar o coração das vendas?


Ex-professor de Educaçao Física formado pela Universidade de São Paulo, Rafael Palladino, vice-presidente e principal executivo do Panamericano – empresa do grupo Sílvio Santos -, é daqueles empreendedores que aprenderam a arte da administração na prática. E sob a ótica das vendas. Com seu mestre nos negócios – o empresário e apresentador que dá nome ao conglomerado -, Rafael aprendeu o grande segredo: é preciso fazer as coisas da forma o mais simples possível. “Senão o consumidor não compra. E, se comprar, não usa porque sequer sabe o que comprou”.

Com crescimento de 35% na média histórica dos últimos 10 anos, o Panamericano pretende agora, sob a batuta pragmática de Palladino, inverter a cultura que regia a maneira de se fazer negócios na empresa. Ao invés de se cobrar os colaboradores somente pelas metas de transações realizadas pontualmente, vai-se buscar o relacionamento de longo prazo. Principalmente pelo avanço no segmento de cartões de crédito. A empresa vai continuar vendendo, diz o executivo, mas colocará foco primordial no atendimento. A cultura cliente vai-se disseminar pela organização porque, para o executivo, sem um ótimo atendimento não há vendas.

Como é desenvolvida a estratégia de atendimento ao cliente no Panamericano?
O atendimento ao cliente não tem muito segredo, desde que a pessoa que faz esse trabalho também goste de ser bem atendido. Quando se começa a absorver essa cultura, em todos lugares tais como restaurante,  loja, etc,  e se começa a analisar como está sendo atendido. Porque o atendimento é o coração da venda. Ninguém vende nada se não fizer um bom atendimento. E o Brasil, depois da estabilidade econômica – de uns 10 anos para cá – vem melhorando absurdamente nessa parte determinante, assim como vem melhorando também suas ações em vendas. Nos EUA a cultura comercial é muito mais disseminada do que aqui. É uma loucura o que os norte-americanos sabem vender. Já no Brasil, no tempo da inflação não era necessário ter um bom atendimento para se vender, pois não existia interesse genuíno nas vendas. Por exemplo, você entrava numa concessionária não havia ninguém ali para lhe receber. Você tinha que inserir seu nome num livro e entrava numa fila de espera do automóvel. Então, não se desenvolveu no Brasil essa cultura de bom atendimento para venda. Não existia sequer uma noção de preços e custos.

Não se havia desenvolvido uma cultura de cliente…
Exato.  Hoje, apesar de ser possível se realizar um comparativo de preços em mais de uma loja, qual é o diferencial? É o atendimento. Lembro-me de que mesmo no mercado financeiro, quando eu era ainda um adolescente,  entrava num banco e o gerente permanecia lá no fundo, sentado à sua mesa. Não estava interessado em ninguém, pois o banco não precisava de cliente, mas apenas do dinheiro por causa da inflação. Hoje é diferente. Os bancos têm que trocar dinheiro, necessitam do cliente,  precisam apresentar um bom atendimento. Então, essa cultura de cliente fica muito ligada à venda, à cultura das metas a serem atingidas.

Como é a estrutura de vendas no seu negócio?
Temos 5.000 funcionários. Destes, praticamente 3.500 são vendedores, atuando nas 170 lojas em todo o Brasil. Temos as equipes de consórcio e as equipes de contatos comerciais que somam praticamente 15.000 revendedores de automóveis, moto e caminhões. Então,  nosso negócio começa sempre no primeiro atendimento. O cliente é bem recebido e tentamos fazer com que esse atendimento consiga suprir uma série de necessidades dele. Quando o cliente vem até nossa empresa para, por exemplo,  obter um crédito pessoal, também é oferecida uma série de outros produtos e serviços dos quais pode estar precisando. Se, num outro exemplo, deseja fazer um financiamento de carro,  oferecemos também o seguro  e outros detalhes  que atenda esse cliente no maior volume de negócio possível. Depois disso,  ele passa por um processo de análise de renda, recebe o cartão e torna-se um cliente fidelizado.

Quando o senhor considera que o cliente está fidelizado?
Antes de mais nada,  quando esse cliente está feliz conosco. Em segundo lugar,  quando está usando nossos serviços. Possuímos um data base que avalia a média de produtos que o cliente já adquiriu conosco. E, através de um plano estratégico,  estamos sempre aumentando o volume dos negócios. No último plano que a gente fez, cada cliente possuía de 2,5 a 3 de nossos produtos. E agora, no  nosso  planejamento que vai até 2010,  a média é de cinco produtos comprados. Além disso, avaliamos periodicamente o nível de satisfação de nossos clientes. A tendência de todo mercado, não só no nosso,  é justamente buscar cada vez a qualidade no atendimento. É o que vai fazer a diferença. Mais do que o preço, pois este vai-se equiparando de forma crescente à medida em que a taxa de juros vai baixando. No nosso caso, obviamente quando se tem um preço quase igual ao de um grande banco, a diferença não é tão grande que eu não possa através de um melhor atendimento ganhar esse cliente. E acho que é isso que acontece em qualquer lugar do mundo. Você vai a um shopping e é atendido de uma certa forma, pois  está pagando um preço diferente do que os praticados por exemplo na 25 de março, onde custará mais barato, mas talvez você não tenha o mesmo tipo de atendimento.  Pode haver um diferencial de preço, por conta da qualidade do relacionamento, e é nisso em que apostamos. É isso que a gente tem que passar e é simples. E não é só o relacionamento externo. O atendimento interno também é muito importante. São os clientes entre os departamentos, como a área de Recursos Humanos, por exemplo, que tem como cliente o banco todo. Essa cultura de atendimento ao cliente está direcionada para fora e para dentro do nosso negócio.

Existe uma cultura do grupo que é colocada dentro da área financeira?
Todas as empresas têm necessariamente, hoje, que desenvolver uma cultura de relacionamento com clientes. Um grupo como o nosso, com mais de 40 anos,  que vende produtos e serviços, não sobreviveria tanto tempo sem uma cultura de atendimento. Talvez seja essa a diferença, porque há uma quantidade enorme de organizações que nascem e morrem num período de menos de cinco anos.

De que forma se consegue disseminar essa cultura de cliente para o  público interno?
Na nossa empresa, um departamento controla o outro em relação ao nível de atendimento. Ë possível hoje, por exemplo, saber se o RH está dando um bom atendimento à área de vendas, porque esta nos dá esse feedback. Qualquer coisa que atrapalhe o andamento dos negócios no que se refere ao relacionamento com clientes, interna e externamente, você fica sabendo. Porque, a partir do momento que se implanta essa cultura de atendimento ao cliente externo, qualquer coisa que atrapalhe internamente, “o povo grita”. A organização como um todo obriga cada um a um bom relacionamento com o cliente. Afinal de contas, são anos e anos de experiência no atendimento. E é simples:  quando o funcionário recebe o salário no fim do mês,  não é a empresa que está pagando, é o cliente. Aquele que está fazendo negócio com a nossa empresa. Aquele que está sendo bem atendido e que, portanto,  vai deixar o dinheiro para a empresa pagar o funcionário. Quando essa cultura é disseminada, o colaborador sabe que o bolso dele é alimentado pelo bolso do cliente.

São quantos clientes na área financeira?
É de 11 milhões o universo de pessoas que fizeram algum tipo de negócio conosco nos últimos 10 anos. Já os que fazem compram conosco, hoje, somam por volta de 1,8 milhões. Destes, os que possuem um relacionamento mais profundo com nossa organização – fazendo negócios de longa duração e utilizam nosso cartão no dia-a-dia – são cerca de 800 mil pessoas.

Quais são os canais que o Panamericano utiliza tanto para manter esses clientes diferenciados quanto  para buscar novos clientes?
Temos canais de vendas voltados para o financiamento de carros,  crédito pessoal,  financiamento de bens duráveis, material de construção, etc. No callcenter, por exemplo,  a gente comerciliza desde crédito pessoal até financiamento de veículo, “computador do milhão”, etc. Estamos vendendo vale-desconto, vale-saúde…Tentamos oferecer quase todos os produtos por telefone. Já financiamento de caminhões, por exemplo,  não é viável vender pelo callcenter. Às vezes  a pessoa está devendo no cheque especial ou no cartão de crédito, com altas taxas de juros, e prefere dar o carro em garantia. Daí, recebe 50% do valor do veículo, com taxa bem inferior. Então, troca uma dívida mais cara por uma mais barata. Isso a gente chama de crédito “tapa-buraco”. Mas, em termos de callcenter, temos cerca de mil pessoas trabalhando – 800 vendendo e 200 atendendo os clientes. Outros canais dos quais nos utilizamos são as nossas 170 filiais – canal direto, distribuído no Brasil inteiro – e as nossas plataformas de vendas, que chamamos de núcleos, comercializando, por exemplo, os consórcios, em cidades maiores, com alta produtividade de vendas. Esse núcleo nos traz resultdos em oito capitais e em duas cidades.também, Campinas e Ribeirão Preto.

Vocês costumam se utilizar da mala direta?
Trata-se de instrumento que empregamos bastante, principalmente para movmentar o callcenter. Pois,  além do segmento ativo temos o receptivo para o qual trabalhamos com muita mala direta. São inúmeras campanhas tais como a “deu a louca no gerente”, “campanha de Natal”, “campanha de Páscoa”, “dia das crianças”, IPTU, matrículas de escola… Utilizamos essa ferramenta também na área de marketing de relacionamento, como no dia do aniversário do cliente, avisos de promoções, etc. E agora pretendemos também oferecer produtos através da mala direta. Por causa do hotel,  temos conseguido fazer uma grande negociação na aquisição de TVs de plasma por exemplo, e tentaremos levar essas vantagens também para os nossos clientes. Às vezes, adquirimos quantidades de milhares de computadores, obtendo vantagens nos preços. E nada nos impede de repassar esses benefícios aos nossos clientes. Então, vamos oferecer através de mala direta. A pessoa liga e confirma o que quer, o callcenter manda entregar em casa, e a fatura é debitada do cartão. A mala direta é para quando se quer especificar mais o público. Já os comerciais de  televisão são úteis quando a intenção é falar com o Brasil inteiro e gerar negócios para as filiais também.

O senhor poderia nos falar sobre a estratégia de trazer especialistas para responder por determinados canais?
Tenho o seguinte conceito: a gente não conhece tudo, mas pode desenvolver o que for preciso. O importante é o conceito e isso temos no nosso grupo. Por exemplo, há três meses adquirimos uma empresa de cosméticos. Não entendo nada desse tipo de produto mas, se for preciso cuidar da empresa, eu consigo. E contrato quem conheça bem do segmento. A gente contratou uma especialista que trabalha há muitos anos na área de cosméticos. Como o objetivo é ter metas de vendas, aplicamos nossa cultura de comunicação de massa a um custo mais barato do que qualquer concorrente. Também não sou um especialista em consórcio, mas tenho um executivo que é. Não sou um especialista em cartão, mas fui buscar um especialista no segmento. E assim por diante. O restante –  controlar o orçamento –  é igual em todas as empresas.

O segredo é entender o foco do seu negócio principal ou ter clientes? Após a conquista do universo de cliente fica fácil identificar as oportunidades para agregar produtos?
Primeiro é necessário trazer o cliente para dentro de casa. Depois, ter a clara percepção do que ele deseja consumir. A televisão traz o cliente e, a partir dessa primeira relação, tentamos diagnosticar seu perfil e oferecer mais produtos. Por exemplo, estamos oferecendo um produto novo, o PanProtege, que é proteção integral para o cliente e para a família. Vamos fazer um rol do negócio, que possui vale-desconto, vale-saúde, parte odontológica, seguro residencial e garantia estendida para eletroeletrônicos. A idéia é que, a partir da presença do cliente, oferecermos essa gama de possibilidades. O ser humano precisa se alimentar, necessita de segurança, saúde, educação e moradia…O que  não conseguirmos oferecer dentro do produto – que ele vai pagar uma parcela por mês – vamos fazer por sorteio. Por exemplo, na questão da moradia: vamos sortear várias casas por mês. Seguro-educação: se algo acontecer com a pessoa, pagamos  pelo determinado período escolar, 5 ou 10 anos. Vale-saúde: são convênios com médicos e laboratórios, onde é praticada a tabela da associação médica brasileira e cobre uma consulta de R$ 30 ou R$ 40,  exames de laboratório com 80% de desconto, etc. Com o vale de saúde odontológica, a pessoa paga 50% do valor de uma tabela de dentista da Associação Brasileira de Odontologia. Então o indivíduo, com uma parcela por mês, acaba tendo uma série de proteções que antes não tinha.

Quais critérios são utilizados na empresa para identificar essas oportunidades de negócios?
O grupo todo entende muito das classes sociais, principalmente as C e D. O contato é diário, o que nos permite saber que os clientes querem segurança, saúde, educação e moradia. Então, com isso desenvolvemos os produtos e serviços, sempre buscando alternativas que possam melhorar a qualidade de vida do cliente. Produto bom, atendimento bom, preço bom, marketing bom…E, se acertarmos na mosca, conseguimos fidelizar o cliente para a vida inteira.

O senhor está falando de um público de…
Realizamos 170 mil negócios por mês, o que totaliza 2,1 milhões de transações por ano…

Essa é a meta?
Não se trata de meta. É o que efetivamente vai acontecer. Vamos fazer 2,2 milhões de transações. Apenas com esse produto vamos conseguir 50% desse crescimento. Um produto que nos vai trazer em um ano uma carteira de um milhão de clientes. Todos com cartão, fidelizados. E, se fizermos um bom trabalho, esse cliente vai ficar conosco a vida inteira. Então, em 10 anos eu estarei com 10 milhões de clientes.

Quem são os seus concorrentes?
Temos vários concorrentes, pois cada instituição tem a sua estratégia e em cada segmento existirá um concorrente. No financiamento de véiculos, temos a Votorantim, Finasa, Itaú e ABN Amro. Em crédito pessoal, temos  Fininvest e Losango. No segmento de consórcio temos a Rodobens, Porto Seguros, Bradesco e Caixa Econômica.

Mesmo com a concorrência, o foco é ser sempre o número 1 em todas as áreas?
Nosso foco principal é a área financeira.  A partir dela é que vamos analisar os clientes para os consórcios, para os seguros, etc. E com a fidelização, nosso foco vai passar a ser o cartão de crédito. É o que chamamos de estratégia relacional-transacional. A financeira faz transação e o cartão desenvolve a relação. O grande desafio agora é fazer com que a transação, que é ponual,  se transforme numa relação de longa duração. Isso modifica a cultura do banco. E mudança de cultura é sempre uma coisa difícil. Pessoas que há anos eram cobradas, aqui,  pela quantidade de transações que conseguíam e não pelo número de clientes que agregavam à política de relacionamento.

Mas os ganhos do funcionário não se dão apenas por transação? Como ele poderá receber também por cliente?
Nosso colaborador vai continuar ganhando pela transação, mas também pela relação. Obviamente, se o cliente quer um cartão de crédito do banco, não está havendo transação nenhuma. Então, posso pagar para quem fez o cartão, para quem trouxe o cliente. É inverter o que a gente faz: primeiro trazer a relação para depois o cliente fazer a transação.

O banco vai buscar inspiração em que modelo de relacionamento com clientes?
O nosso grupo como um todo tem como inspirador o nosso acionista (Sílvio Santos). Ele tem uma visão fantástica. Uma das coisas que eu aprendi com ele, há mais de 14 anos,  é a seguinte:  “Faça as coisas simples, senão ninguém entende nada”. Se passar de uma página para explicar um produto, pode parar. Porque você não vai vender nada, principalmente para esse nosso público  As coisas precisam ser muito simples e com uma linguagem simplificada.  Essa qualidade foi o principal ensinamento que tive com Silvio Santos. Se complicar, o consumidor não compra. E, se comprar, não paga. Porque não sabe o que comprou.

O senhor vem de que área?
Sou professor de Educação Física, formado na Universidade de São Paulo. Trabalhei muitos anos nessa área, mas depois exerci atividades na área comercial, no ramo imobiliário, em posto de gasolina…Em toda minha vida sempre tive ódio de entrar em banco. Mas como tive que tomar conta de um, faço-o da forma que eu gosto. Ou seja,  uma coisa bem dinâmica, com novidades todos os dias. Então o banco foi transformado em algo que me satisfaz.

Quanto o banco tem crescido, em média, por ano? Quais são as perspectivas?
No ativo temos conseguido um crescimento médio de 35%. Depende do ano e da economia do País.  No ano passado,  crescemos 40%, mas a média histórica nos últimos 10 anos pode ser considerada um crescimento médio de 25% a 30%. Quando a economia “balança”, principlmente levando-se em conta o tipo de público com o qual trabalhos, aí temos que colocar o pé no freio e analisar.

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