Alguns conceitos precisam ser repetidos quantas vezes necessárias para encontrar eco. Como ocorre com o conceito de “promessa de valor”. Embora ele represente o compromisso firmado pelas empresas com seus clientes ou prospects, dificilmente são cumpridos no “momento da verdade”.
O que se diria das instituições financeiras que anunciam “serviços possuem a sofisticação perfeita para você”, ainda tenham portas giratórias, acompanhadas dos respectivos seguranças. Quando a porta trava, ele empunha a arma, e se põe em posição de defesa contra o cliente. Você precisa despir seus pertences pessoais na caixinha. Se quiser entrar!
Cenário bastante longe do momento em que os bancos estão desenvolvendo movimento de retorno às agências, forçando o contato pessoal, o cafezinho com o gerente. Quando reclamei, a pronta resposta: “as portas eclusas, dotadas de detector de metais instaladas com o objetivo de preservar a integridade dos clientes, usuários e funcionários das agências bancárias, cuja implantação tem suporte na Lei Federal n° 7102/83, que determina a adoção de sistemas de segurança nos estabelecimentos financeiros”. Sinceramente, não me sinto mais seguro nem com a integridade física preservada. Não creio que estes dispositivos têm de fato a eficiência pretendida, além da experiência constrangedora que impõe ao cliente.
Algumas instituições aboliram este dispositivo. Não são menos seguras, considerando nosso cao urbano. Mas com sofisticação e sem alarde, fazem parecer diferente. Critiquei muito, nas hoje dou a mão à palmatória: algumas nem parecem banco mesmo, comparado ao banco do qual sou cliente.
Enquanto isso, sinto-me em uma caixa forte, com vigilantes armados, uniformizados e “treinados para atender cordialmente aos clientes, sem gerar qualquer tipo de constrangimento. O Banco mantém monitoramento dos problemas e adota padrões de tolerância buscando uniformidade e controle da qualidade de suas agências”, continuou a resposta da instituição. E disse mais: “os vigilantes são funcionários de conceituadas empresas contratadas pelo Banco que passam por rigoroso teste de seleção, treinamento e reciclagem constante. Considerando seu entendimento de que o atendimento prestado, tanto pelo segurança da agência, quanto pelo nosso funcionário não foi adequado, reforçamos as orientações contidas nas diretrizes de nossa instituição”.
Mas, a “promessa de valor” contida na propaganda fala em sofisticação perfeita para o cliente, a “disciplina de valor” percebida na resposta do serviço ao cliente não parece sofisticada. Talvez seja perfeita para o Banco. E, de fato, é assim que deve ser. Cada instituição ou empresa tem o direito de fazer o que acha melhor para seus acionistas. É a “disciplina de valor”. No entanto quando ela não permite o cumprimento da “promessa de valor” desenhada pelos responsáveis da comunicação com o mercado, torna a mensagem publicitária inconsistente com a realidade. No exemplo, a carta-resposta é totalmente incompatível com a mensagem do Banco.
Os gerentes em geral se recusam a enxergar que a operação não reflete as premissas de qualidade definidas. Proponho saírem dos escritórios e frequentem as agências como simples clientes. Assim poderão afirmar de que as diretrizes são realmente cumpridas. Não esqueçam de levar seus os perigosos pertences. Depois, visitar a concorrência. Ficarão surpresos, envergonhados. Se os clientes ficarem surpresos e encantados com a concorrência, podem querer experimentar. E a lealdade sairá pelo ralo. Eu experimentei e, por enquanto, não me arrependi. Um ganhou, outro perdeu cliente. Com certeza, vai conquistar outros com a “promessa de valor”, que não poderá cumprir, intensificando a briga de marketshare no segmento prime.
No mercado de celular, vivemos a briga publicitária entre as duas maiores operadoras do País, criando fatos para mostrar-se líder, como sugere Al Ries em seu famoso “As Leis Vencedoras do Marketing”, “se você não é lider, crie uma categoria onde possa ser”. Na verdade, o que interessa é o faturamento. Se crescerem, tanto faz se através de novo cliente ou novas vendas a um já antigo. O custo precisa estar compatível. Mesmo que seja “cinco vezes mais caro conquistar um cliente do que mantê-lo”.
Infelizmente estes fatos parecem demonstrar minha suspeita de que, no Brasil, fidelidade conquistada a partir de respeito e serviço ao cliente ainda não é fator importante, em boa parte das empresas com alta competição. Para elas, parece que marketshare ainda é o melhor indicador de competência. Acho que existe o risco de se arrependerem em futuro muito próximo. Mesmo que lentamente o comportamento do mercado esteja mudando e um dia, quando acordarem, não será possível mais ganhar clientes novos, porque os concorrentes com mais visão os terão fidelizados. E aí, não adiantará “chorar o leite derramado” ou “caçar a lealdade perdida”.
Enio Klein é diretor da K&G e professor dos cursos de MBA/Marketing da FEA/USP. E-mail: [email protected].