Independente do setor, o ano de 2014 não foi dos mais fáceis. O mercado precisou lidar com a alta da inflação, a baixa no consumo e o aumento da insegurança com o futuro. Como consequência, o cenário trouxe uma previsão não tão animadora para 2015. A expectativa é de que o País cresça apenas 1% no PIB. Nadando contra essa maré está o setor de seguros, que apresentou crescimento de 11,24% no ano passado. Só até novembro de 2014, já havia arrecadado R$ 176 bilhões, 9,3% a mais do que no ano anterior, segundo dados da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização, a CNSeg, e da Superintendência Nacional de Seguros Privados, Susep. E a previsão para esse ano não foge disso, já que se espera crescimento de 12,4%. Uma das explicações está na maior consciência do próprio cliente com relação à importância de se investir em um plano de seguro. Este deixou de ser visto apenas como despesa ou regalia. A maior abertura de mercado e a ampliação das opções de contrato permitiu que públicos de diferentes classes se tornassem clientes. “O setor vêm crescendo a um ritmo de dois dígitos nos últimos anos, em um cenário em que a população está mais ciente e as seguradoras estão ofertando produtos mais acessíveis e diversificados, para atender a esse escopo maior. Além de estarem buscando mais sinergia com os corretores e os órgãos reguladores”, avalia Marco Antunes, vice-presidente de operações e tecnologia da Sulamérica.
Junto a essa expansão, o mercado também está mais competitivo. Empresas, que antes só trabalhavam com volume, hoje entraram nos nichos de mercado e vice versa, segundo Cristiane França, supervisora de operações da Chubb. “Existem empresas diversificando produtos e mudando sua identidade original. Aquelas que conseguirem facilitar a informação e o autosserviço sairão na frente na satisfação do cliente.”
Ela ressalta ainda que o cliente também é um agente influenciador das transformações pelas quais passa atualmente o setor, que começa a ter a boa experiência como palavra de ordem. Até porque, diferentemente de outras áreas do varejo, as empresas de seguros têm menos ocasiões de contato e qualquer chance é vista como uma grande oportunidade. “Ter um contato constante com consumidor é justamente uma das missões das empresas, atualmente. A intenção é estar presente na vida do segurado, além do momento do sinistro. Hoje, ele está mais atento a todos aos benefícios e serviços atrelados ao produto contratado e em cada fase de suas vidas têm necessidades diferentes e as empresas devem estar atentas a essas oportunidades”, declara a diretora de atendimento da Porto Seguro, Sonia Rica.
Isso se torna ainda mais fundamental nesse momento em que a fidelização é vista como um ponto chave no setor, de acordo com Patrícia Cardoso, diretora de marketing e estratégia da Liberty Seguros. “O cliente é o maior bem de uma seguradora, sendo muitas vezes o embaixador da companhia. Se não estiver satisfeito com os serviços ofertados, a tendência é trocar de companhia” conta.
O CAMINHO É A EXPERIÊNCIA
Entretanto, ter uma forte presença não é o suficiente, caso a empresa não se preocupe com a experiência de consumo, pois é isso que irá determinar se o cliente irá se manter, ou não, com a seguradora. “Se a experiência do cliente for positiva, ele renovará a apólice em anos subsequentes e comprará outros produtos e serviços, bem como divulgará a companhia a outras pessoas”, relata Roberto Barroso, presidente do Grupo Segurador Banco do Brasil e Mapfre nas áreas de vida, habitacional e rural. Essa recomendação feita por parte do cliente é, ainda, fruto daquilo que José Adalberto Ferrara, presidente da Tokio Marine, crê como o maior diferencial de uma seguradora, o atendimento. “Seguro está diretamente relacionado à experiência. Se o consumidor teve uma boa experiência na utilização dos serviços, ele não quer correr o risco de mudar, e vai além, indica a empresa”, opina. Na visão dele, cada vez mais, as seguradoras estão preocupadas em entender os clientes. “O setor sempre olhou muito para os corretores e agora, pouco a pouco, está adotando o conceito de visão do cliente, como já acontece em bancos. O cliente passou a ser um público tão importante quanto o corretor.”
Aliás, não há momento mais propício para esse novo olhar sobre o cliente. O mercado atual se encontra em uma fase de transição, acarretado pela mudança de comportamento do consumidor. Atualmente, ele se encontra cada vez mais conectado. Por conta dessa transformação, tem acesso a mais informações, está mais ciente daquilo que deseja e exigente. No momento, agilidade e comodidade estão entre as prioridades dos segurados, o que vem se tornando uma missão para as empresa, como a Porto Seguro, que, por exemplo, criou a opção de venda de bateria no momento da assistência 24h. “Compreendemos que há diferentes perfis de clientes e necessidades, para isso criamos um hall de benefícios e produtos segmentados”, adiciona Sonia Rica, diretora de atendimento. “O relacionamento com o cliente exige que tenhamos práticas coerentes para atender suas necessidades além das segmentações.”
ALIADO NA CONSTRUÇÃO DO PERFIL
Cientes dessas necessidades, o mercado vem procurando conhecer mais o cliente, suas necessidades e motivações. “As empresas têm investido cada vez mais em entender o perfil do cliente e desenhar soluções e produtos direcionados. Está claro que todos são importantes, independentemente da classe social, mas um cliente AA tem necessidades diferentes de um B, por exemplo”, aponta a supervisora da Chubb. A segmentação é necessária, também, para identificar a melhor forma de atender cada cliente, chegando a resultados mais positivos. “Conhecer os clientes, identificar e antecipar suas necessidades e seus desejos, garantir sua satisfação e assegurá-lo de que ele é importante para a empresa são alguns dos elementos fundamentais na sua conquista, além da capacidade de analisar o mercado e as tendências futuras”, explica Tatiana Gomes Ambrosio, superintendente de canais alternativos de negócio da Icatu Seguros.
A coleta de dados, inclusive, tem funções que vão além da construção de um detalhamento do cliente, sendo uma das formas mais utilizadas, a pesquisa de satisfação. Com o cliente mais exigente, essa é uma estratégia que vem fornecendo dados de grande valor para as seguradoras, a fim de saberem qual o melhor caminho a ser seguido para a construção de um bom relacionamento. “Realizamos uma pesquisa de satisfação periodicamente. Os pontos de melhoria sinalizados pelos clientes são considerados como presentes à empresa, pois processos e sistemas são aperfeiçoados a partir da opinião dos consumidores”, exemplifica Barroso, do Grupo Segurador Banco do Brasil e Mapfre.
No caso da Seguros Unimed, a base está no Índice de Desempenho da Saúde Suplementar, IDSS, uma lista de avaliação das operadoras de saúde da Agência Nacional de Saúde, a ANS. “Ele é composto de uma avaliação nos seguintes temas: Atenção à Saúde, Econômico-financeira, Estrutura e Operação e Satisfação do Beneficiário. A nossa nota, em 2014, em Satisfação do Beneficiário foi de: 0,5494, dentro de uma escala de pontuação de 0 a 1. O que é muito satisfatório para nós”, afirma Rafael Moliterno Neto, presidente da seguradora. Já para a Liberty Seguros, os indicadores têm a função de guia para os processos da empresa, um meio de segurança para a realização de um atendimento mais satisfatório. “Esses indicadores são acompanhados mensalmente por todas as áreas, desde equipe de atendimento até os altos executivos”, conta Patrícia. O resultado está na criação da iniciativa Comunicação Proativa, cujo objetivo é informar o cliente via serviços eletrônicos, como SMS e e-mail. “Não basta entregar quando o cliente pede, tem que antecipar as necessidades. Por isso, em 2013, também implantamos uma ferramenta de CRM, visando fazer com que todas as interações com os segurados fossem registradas em um único ambiente.”
MAS…
De nada vale falar sobre as pesquisas, a construção de um perfil do consumidor, a preocupação com sua experiência, se tudo isso não for colocado efetivamente em prática. E, embora o setor possua estratégias bem avançadas, ainda há falhas que precisam ser revistas. “No mercado brasileiro como um todo o serviço de atendimento é precário. O foco deixa de ser em atender as necessidades básicas do cliente. Temos que lembrar que ele deve ser o centro de todas as nossas atenções, pois, no final, é ele quem paga a conta”, analisa Cristiane. Uma suposição de Tatiana Ambrosio, da Icatu, para a existência desse problema é a permanência ainda da burocracia e das fortes regulações dos órgãos competentes, que limita o serviço das seguradoras. “Isso também acaba impedindo o setor de se adequar mais rapidamente ao relacionamento com o cliente por meio das novas mídias sociais”, aponta.
Outro desafio é a cultura do seguro pouco desenvolvida que o Brasil possui se comparado a outros países, segundo a diretora da Liberty. Consequentemente, as empresas necessitam informar constantemente às pessoas sobre a importância de ter um plano, sem contar o desafio de se estabelecer no mercado, diante da desaceleração econômica. “É provável que o mercado fique mais concorrido, com seguradoras em busca da manutenção do market share de suas carteiras”, prevê.
Por isso, a saída está em ser acessível ao consumidor a qualquer hora e lugar, por meio dos mais diversos canais. Para Moliterno, tão importante quanto estar bem estruturado, ter uma equipe motiva, treinada e empenhada em prestar um atendimento de qualidade, é estar à disposição dos clientes em várias plataformas. “O importante nesse momento é poder se relacionar com o cliente por meio dos múltiplos canais. Essa é uma tendência que precisa ser acompanhada”, aconselha Tatiana. Ou seja, é preciso que as empresas tenham em mente que quem decide a forma como vai ser contatado é o próprio cliente. Por essa razão que ser omni-channel é uma questão de sobrevivência para o negócio. “Somos uma companhia de atuação multilinha e, para aproveitar as oportunidades de cross selling, é fundamental que o segurado esteja satisfeito. Quanto mais o cliente gosta do produto e do atendimento, maior a chance de adquirir outro. Por isso, temos o conceito Click Call Face, que explora o que cada um dos canais tem de melhor a oferecer”, acrescenta o executivo da SulAmérica.
Afinal, são diferentes tipos de clientes e cada um tem a sua preferência. Para a Porto Seguro, os meios podem ser diversos, como telefone, chat, redes sociais, canais eletrônicos ou as Unidades de Resposta Audível, porém, o mais importante, é investir em tecnologia para que a resolubilidade seja sempre alta e o tempo de atendimento cada vez menor. “É preciso que o cliente seja prontamente atendido no primeiro contato com as empresas, formação e autonomia nas pontas de atendimento”, declara a executiva.
As tecnologias e a conectividade, aliás, continuarão a ser no futuro as causadoras das mudanças no relacionamento entre empresa e cliente. Como sobreviver? Paulo Renato Franco, chief of operations officer GI LatinAmerica da Zurich, dá a receita: “as seguradoras que conseguirem antecipar e planejar as transformações sairão na frente e terão melhores condições de atuarem neste futuro de exigências mais instantâneas”. De acordo com ele, as novas tendências no relacionamento são: simplicidade, transparência e velocidade nas transações. “Será necessário também reavaliar os papéis na cadeia de valores das atividades das seguradoras a fim de se tornarem mais importantes para o cliente final.”