Sempre que ouço falar de empresas que ‘encantam o cliente’ tenho o reflexo de colocar a mão no bolso. Fico desconfiado porque tenho certeza de que a tal empresa está caprichando no feitiço e na magia, enquanto dezenas ou centenas de clientes sofrem nas filas de espera do call center ou tem problemas sem solução há semanas.
Quero lançar um pedido muito inocente e singelo às empresas que nos leem: apenas cumpram as promessas explícitas ou implícitas porque, de verdade, não tenho interesse em ser encantado.
Sobre esse paradoxo – empresas que nem fazem o arroz com feijão e querem ser encantadoras -, saiu em julho um artigo muito bom na Harvard Business Review, com tradução em Português na HBR Brasil de agosto de 2010.
Os autores Matthew Dixon, Karen Freeman e Nicholas Toman fizeram um estudo, apoiado pelo Corporate ExecutiveBoard, com mais de 75 mil pessoas para examinar três questões:
– Qual a importância do atendimento para a fidelidade?
– Quais atividades aumentam a fidelidade e quais não?
– É possível aumentar fidelidade sem aumentar custos de atendimento?
Os resultados mostram objetivamente que o foco das empresas no encantamento está redondamente equivocado. Os aspectos da experiência do cliente que realmente impactam na fidelidade são muito mais básicos. Uma frustração no atendimento claramente gera saída de clientes. Mas o que gera fidelidade, na opinião dos clientes, é que a empresa os ajude a resolver problemas eventuais com rapidez e facilidade. Muita gente boa esquece que esta é a única opinião que importa neste tema, pois fidelidade não pode ser imposta, é uma escolha do cliente.
Assim, esqueça por enquanto a pretensão de superar expectativas e focalize seus esforços em remover obstáculos para o cliente. Tornar sua vida mais fácil. Isso na prática significa focar o atendimento em três coisas muito simples:
– Evitar que o cliente tenha de contatar a empresa várias vezes para ter o problema resolvido;
– Nunca fazê-lo repetir a história ou dar informações que a empresa já possui;
– Não transferir o cliente de um ponto de contato para outro ou de um atendente para outro, sem resolver o problema.
O que se conclui é que encantar o cliente não traz fidelidade, reduzir o esforço para ter seus problemas resolvidos, sim. Por isso é possível aumentar fidelidade sem aumentar custos: melhores processos de atendimento muitas vezes até reduzem custos para a empresa.
Em resumo, faça seus processos e sistemas tomando em conta o que é mais importante para o cliente. E a grande surpresa é que ele não quer nada demais. Mas só para cumprir os três pontos acima, qualquer área de atendimento a clientes já tem projeto para dois ou três anos.
Fernando Pierry é sócio-fundador do Peppers & Rogers Group do Brasil. Artigo disponível em: blog.1to1.com.br