Uma base de dados enriquecida e detalhada é a meta de muitos departamentos de gestão de clientes. Porém, a grande maioria possui apenas dados transacionais, como nome, telefone e endereço, e não conhece outros detalhes da vida de seus clientes que podem ser fundamentais para o relacionamento. Por exemplo, como um banco poderá descobrir que um cliente está lhe “traindo” com outra companhia? Informações transacionais enganam e, sem perceber, esse banco pode tratar um cliente muito rico (mas que deixa uma parte muito pequena da sua fortuna nesse banco) como alguém pobre, deixando de gerar negócios. A grande sacada do geomarketing é contextualizar o cliente a partir do seu endereço. “Consigo trazer a tipologia deste cliente. “Por exemplo, uma coisa é conhecer os dados transacionais dele, mas saber que ele gosta de equipamentos high tech, é outra coisa”, afirma Sueli Daffre, sócio-diretora e fundadora da SD&W.
“A partir do endereço, conseguimos georeferenciar o cliente, trazer outras informações do mercado e saber que ele mora em um lugar que tem determinado perfil”, afirma. A empresária, que é bacharel em estatística, faz uma tipologia das pessoas que moram nos diferentes bairros de uma cidade. A distância de perfis muitas vezes é menor do que a largura de uma rua e o mesmo bairro abriga vários tipos de clientes. “Em São Paulo, tem bairros que no qual o muro de um condomínio já serve de apoio para a construção de um barraco”, diz. Para detectar essas diferenças, Sueli oferece aos seus clientes um mapa com as características de cada bairro, ou então essas mesmas informações divididas pelo CEP. Ela também desenvolveu perfis de moradores, por exemplo: Segurança (são pessoas classe A, porém mais velhas, com filhos já criados e que moram sozinhas em casas ou apartamentos amplos), Solidez (famílias de classe A), Equilíbrio em Conquista (casais jovens), entre outros; e no extremo social oposto está o perfil Sobrevivência.
A empresária conta que uma empresa de cartão de créditos precisava aumentar o retorno nas suas campanhas de mala direta, principalmente nas regiões mais abastadas. “A companhia tinha grande retorno nas áreas de sobrevivência, mas lá sempre tem”. Sueli explica que o alto retorno nas áreas de sobrevivência é comum, pois essas pessoas normalmente têm problemas de aprovação de crédito e “quando alguém manda um cartão com R$ 500 de crédito para ela é uma festa”, não importa o apelo da mala direta. Já nas classes mais altas, a mala direta precisa chamar atenção, assim como os benefícios oferecidos. “Esses clientes já tem cartões sem anuidade e que dão milhas”, diz.
A partir do geomarketing, a empresa de cartão de crédito descobriu que as áreas chamadas de Solidez tinham como característica o lúdico. “As pessoas mais maduras têm muito essa coisa do lúdico, de tentar a sorte”, explica Sueli. Com essa informação em mãos, a agência de publicidade criou uma campanha que remetia a cartela de bingo. A ação teve sucesso e multiplicou por 10 o retorno da campanha de marketing direto nas classes A e B.
MICRO-UNIDADES
“Antes entendíamos que tínhamos de pensar São Paulo como um todo. Hoje, pensamos em micro-unidades”, diz Sueli. Ela explica que, com o aumento das classes C e D no mercado consumidor, as empresas viram que poderiam ganhar muito com a base da pirâmide, mas para isso precisariam diferenciar os perfis de consumo, rendas iguais não significam estilos de vida iguais. Nas classes altas também há diferenças de perfis, ainda que a renda seja similar, Sueli afirma que a classe A que mora no bairro dos Jardins em São Paulo é diferente daqueles que moram no Tatuapé.
“Quando eu falo dos Jardins, sei que as pessoas que moram lá têm internet e contato com o mundo lá fora há mais tempo. São ricas não só no sentido financeiro, mas também culturalmente, mais rico de informação. Já a classe A do Tatuapé se comporta de maneira distinta, ela é enraizada, não sai do Tatuapé porque gosta”, afirma Sueli.
Sueli explica que o uso do geomarketing mudou muito nos últimos 20 anos. Além da ampliação do mercado consumidor – “antes as empresas só pensavam em vender para as classes A e B” – a tecnologia também foi um dos pilares para a construção das bases de dados dos clientes, algo fundamental para a pesquisa. O mapa criado pela S&W mostra o mapa da cidade dividido em bairros, destacados por cores diferentes que representam o perfil dos moradores locais. Para a construção e atualização desse mapa, Sueli se baseia em nas informações de pesquisas quantitativas públicas (como IBGE) e também levantamentos qualitativos, para ratificar os dados públicos. Ela conta que esse estudo começou no início dos anos 90, com a privatização da telefonia. “A empresa precisava cabear a cidade inteira em dois anos, só precisava saber por onde começar: pelas áreas que iriam usar mais ou menos o serviço”, explica. Nesse estágio entrou o trabalho de Sueli para decifrar os bairros de São Paulo. A empresa cresceu e hoje são 5.564 municípios mapeado, além do escritório em Buenos Aires. “Na América Latina esse tipo de pesquisa ainda está começando, porque não há muitos dados organizados”, afirma.