Visão única, para não morrer no caminho


Um mesmo consumidor pode ser fragmentado em vários e estranhos indivíduos diante da empresa. Porque cada canal de atendimento da organização ainda o vê de maneira própria e diferente dos demais, impedindo um relacionamento personalizado, estratégico e inteligente – aquele que adiciona valor a ambas as partes. As formas de se mudar esse quadro – nocivo aos esforços de fidelização e incremento de negócios – foram debatidas no último dia 24, por centenas de executivos e empresários reunidos no Hotel Intercontinental, em São Paulo, na Conference Cliente S.A., “Visão Única de Cliente- Gestão Inteligente de Relacionamento”.

No primeiro painel, aberto pelo consultor Kendi Sakamoto, diretor da KS Contact Center Consulting, os casos reais da aplicação da visão de 360º dos clientes de alguns casos de varejo, como da Vodafone (Alemanha) e Lloyds Bank (Inglaterra), serviram de apoio para a exposição de Leonardo Vieiralves Azevedo, diredor da WG Systems. Ele colocou em relevo os elementos essenciais e benefícios da prática de visão única do cliente, através da análise e previsão do comportamento desse consumidor. E exibiu as práticas para aumentar a velocidade de implementação e obtenção de resultados de negócios no curto prazo, com drivers de produtividade para a equipe de CRM ao trabalhar com a visão 360º do cliente.

Já em sua palestra, Carlos Eduardo Bertholdi, gerente de Relacionamento da Avaya Brasil, apresentou o cenário de transformações que impulsionam as organizações a uma aproximação estratégica maior ao mundo dos clientes. “É preciso identificar o consumidor, diferenciá-lo, interagir com ele e, por fim, personalizar o atendimento”, disse, ilustrando com o fato de que até o hoje a Avaya não vendeu o mesmo produto, exatamente igual, para dois clientes diferentes. “Quem conhece de fato seu comprador nestes tempos de informação abundante sabe que ele é hoje muito mais sofisticado e sensível, exigente em termos de tempo e conveniência, extremamente móvel (infiel) e apresenta altíssima expectativa em relação ao atendimento”.

Através de um vídeo produzido pela própria Avaya, Carlos Eduardo mostrou a importância de se estabelecer uma clara diferenciação em cada cliente. Segundo ele, o valor percebido pelo consumidor está no pós-venda, na interação, e na capacidade e velocidade que tem a empresa de reverter eventuais situações de descontentamento. “Depois de identificar e diferenciar o cliente, o treinamento – fator humano – é de suma importância para as fases de interação e personalização através do perfil único de cliente”, destacou.

Citando exemplos de estratégias adotadas para que um cliente considerado “VIP” não seja atendido pelo mesmo “agente júnior” que se relaciona com clientes de outros perfis, o executivo da Avaya mostrou os cuidados que se tem de tomar com a comunicação. “No contato telefônico se perde metade dessa eficácia, e nos meios eletrônicos, como o email, o risco de uma comunicação equivocada é maior ainda”, concluiu.

Bom patrocinador – Na seqüência, o case do projeto “Skim” (Sistema Klabin de Inteligência de Mercado) foi apresentado e colocado em debate por dois executivos da empresa: Robson Alberoni, gerente de Planejamento de Mercado, e Apolônio Sales, analista de Marketing. Ambos expuseram os caminhos que permitiram à Klabin – que opera no B2B – chegar a uma visão unificada de seus clientes corporativos, e que propiciou com que o “Skim” fosse reconhecido como o melhor sistema de relacionamento da companhia na América Latina.

Sob o tema “Como prever os movimentos dos clientes através da informação”, os executivos da Klabin demonstraram que, ao perceber que um mesmo cliente era atendido pelas quatro unidades de negócios da empresa e por mais de uma regional, identificaram mais uma oportunidade de incremento de qualidade do que um problema. “Percebemos que teríamos de conhecer o cliente em sua totalidade. Não só suas características próprias, como também seu mercado, sua cadeia de suprimentos, seus hábitos, etc”, deixando claro que mesmo no B2B, quem se relaciona são sempre as pessoas.

Evidenciando a simplicidade de um processo que muitas vezes se visualiza erroneamente como algo complexo, Robson afirmou que a maior parte das informações necessárias estão dentro da própria empresa. Basta organizar, consolidar. “Às vezes, sai mais caro buscar uma informação do que o valor de retorno que ela representa”, expressou, acrescentando que “o momento é o de simplificar ao máximo. Devemos escolher um ou dois pontos de cada vez para analisar, evitando o excesso de dados, o que só complicaria o processo”.

Em um movimento que demorou cerca de três anos, entre o planejamento, a mudança de cultura e a efetivação, a Klabin conta hoje – garantem os executivos – com uma única visão de cada cliente por toda a organização. “Todas as informações estão numa mesma base de dados”. E, aconselha o gerente de Planejamento de Mercado, o principal é conseguir de imediato um bom sponsor (patrocinador) para o projeto. De preferência a principal liderança da empresa. “No caso da Klabin, quem nos assegurou o desenvolvimento e implantação do bem-sucedido projeto foi o próprio presidente. Dessa forma, os núcleos de resistência são enfraquecidos. Não há quem possa obstruir ou sabotar”, asseverou.

Por fim, Robson Alberoni exortou os presentes a refletirem sobre o fato de que a visão única não é fundamental apenas para melhoria do relacionamento no presente. É, também, pensar nos negócios de amanhã. “Entendendo o cliente podemos compreender as tendências e as demandas futuras. Ou seja, abre caminho para novos empreendimentos e novas formas de se fazer os negócios”.

“Bando” de dados – “Fala-se muito em tecnologia, mas a visão única de cliente e o relacionamento inteligente dependem em larga escala da atitude das pessoas”, afirmou por sua vez Enio Klein, diretor da K&G e professor em cursos de MBA/Marketing da FIA/FEA – USP, ao abrir o segundo painel de debates. Ele entende que o processo para a visão única de cliente, além de fundamental, deve levar em conta o inalienável cumprimento da promessa de valor embutida no produto ou serviço. “É preciso equacionar a disciplina de valor com a disciplina de custos, tudo diferenciado para cada tipo de mercado e cliente”.

Para Klein, no passado havia incontáveis casos disseminados na crônica empresarial aos quais era atribuído um relacionamento com visão única de cliente. Entretanto, houve um recuo e não se menciona mais esses cases. Sumiram. “Porque se descobriu que, na verdade, estavam muito longe desse tipo de relacionamento personalizado que agora preconizamos. Todos tivemos que rever os processos de relação com o cliente”.

Em seguida, Erik Lieb, diretor da Genesys, analisou um caso real em que se chegou ao alinhamento de toda a estratégia de CRM, ou do atendimento ao cliente propriamente dito. Antes, o cliente era um indivíduo multifacetado e indecifrável, pois seu perfil era sempre pontual, dependendo do canal que o atendia na organização. “Havia uma estratégia de melhoria, mas que oscilava sempre entre custo e qualidade, buscando equilíbrio também na receita. Era preciso alinhar toda a operação – todas as plataformas de contact center como uma central só – aos objetivos de negócios da organização”. Segundo Erik, a adoção das ferramentas, processos e treinamento visando à visão única de cliente permitiu uma curva sempre evolutiva da operação rumo a um relacionamento eficaz. Inclusive com sensível progresso na política de First Call Resolution – “que afeta positiva e fortemente a manutenção do cliente”.

Entre os resultados possibilitados pela VUC, o executivo da Genesys mencionou a redução de 12 segundos em cada chamada, “o que significa uma brutal diminuição de custos e aumento de eficiência”, enxugamento de 30% nas transferências de chamadas e a transformação do antigo agente de atendimento em consultor. Fato que havia sido enaltecido também no projeto da Klabin, onde o “tirador de pedidos” deu lugar ao vendedor consultivo e estratégico. “Em resumo, disse Erik, “trata-se da estratégia de negócio aliada ao conhecimento do cliente mais a mudança conceitual do fator humano no processo de relacionamento. Isso traz resultados”.

Já Ana Zappa, diretora de Marketing da Plusoft, mostrou que, enquanto no processo de relacionamento com clientes de alguns anos atrás a VUC era dispensável, atualmente, quem não souber se utilizar das ferramentas e da preparação do fator humano para chegar a essa estratégia, “certamente vai morrer no caminho”. Segundo ela, a visão de produto vai paulatinamente sendo substituída pela visão de cliente – “o gerente de Produto de antigamente está se transformando no gerente de Relacionamento”- e apresentou dados de uma pesquisa da Harvard Business Revue. Os números desse levantamento apontam que 68% dos clientes que abandonam a empresa o fazem por causa da indiferença ou do descaso no atendimento. “Apenas 14% mudam de fornecedor em função de descontentamento com o produto ou serviço”, lembrou.

Entre os pilares de um estratégia de CRM que leva à visão única de cliente, Ana Zappa ressaltou o esforços que devem ser feitos em nível da mudança cultural (pessoas), processos e tecnologia. “enquanto o sucesso estiver focado em ações pontuais, nada acontece”, frisou. É preciso, segundo ela, atribuir importância estratégica ao cliente, seja ele interno, externo ou corporativo. E, enaltecendo a importância de se tratar a informação para que ela se torne conhecimento – um banco de dados verdadeiro no lugar do difuso “bando” de dados -, num círculo virtuoso em que o conhecimento leve à ação, esta à satisfação e, por fim, à rentabilidade desejada, Ana Zappa apregoou o “Modelo de Amizade”: “As pessoas, disse ela, se relacionam com uma marca como o fazem com os outros seres humanos. Querem afeição, um história, credibilidade, atenção…”.

Inovando pelo conhecimento – Por fim, esmiuçando os motivos e as soluções inovadoras que conduziram o Fleury Medicina Diagnóstica à sua já notória política funcional da VUC no atendimento, o diretor de Relacionamento com Clientes da empresa, José Roberto Lino Filho, mostrou um desenho no qual a curva de percepção do cliente a respeito do atendimento estaria sempre equacionada com a linha de qualidade da empresa. Para isso, é necessário que cada problema se transforme em oportunidade de inovar para surpreender o cliente. Assim nasceram o primeiro drive thru na medicina diagnóstica, a mensagem no celular avisando sobre os resultados dos exames, o laudo evolutivo na internet, o núcleo de saúde da mulher, entre outros.

“Os casos são diferentes e únicos, mesmo quando parecem exatamente iguais”, salientou Lino Filho, reforçando que é preciso conhecer o cliente em cada etapa do relacionamento. “Os sistemas sozinhos não fazem nada – que era o equívoco de antigamente relativo ao CRM. Temos que traduzir os sistemas dentro da prática da organização”, destacou, ao finalizar: “Até mesmo a linguagem de comunicação adotada pelo Fleury demonstra a vontade da empresa de atender o cliente exatamente como ele deseja ser atendido. E, para isso, é preciso estruturar o relacionamento com base no conhecimento sobre esse cliente”.

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