A tendência virou marketing de circunstância

Vivemos épocas de angústia generalizada. E é sabido que o consumo é dos melhores escapes que o ser-humano encontrou ao longo de sua evolução para equilibrar as sensações de perda, derrota, fracasso, medo, insegurança e tristeza, tão naturais de nossa natureza. Assim, quando se diz que consumo é impulso não se exagera em momento algum. Consumo, no fundo, é uma atividade motivada por algo; portanto, impulsionada.
A essência, o reason why desse impulso, dessas motivações pode ter inúmeras origens e inúmeros propósitos. Freud definiu as motivações humanas em 2 grupos: fugir da dor (compra por necessidade, por restrição, por desespero, por imposição, etc) ou buscar o prazer (compra por desejo, por sonho, por competição, por satisfação, etc). E é assim que funciona mesmo. Ou consumimos para fugir da dor (remédios e passagens aéreas) ou consumimos para buscar o prazer (remédios e passagens aéreas). Opa?!!
Explico: Se comprarmos um remédio para nos medicarmos contra uma infecção intestinal, estaremos comprando um produto para fugir da dor. Denomino isto de Consumo Defensivo. Ao contrário, se comprarmos um remédio para ajudar a definir esteticamente nosso abdômen, estaremos consumindo algo em busca do prazer. Denomino isso de Consumo Positivo. Na mesma toada, se comprarmos uma passagem aérea para mudarmos de cidade porque não agüentamos mais a violência, estaremos praticando consumo defensivo, ao passo que, se comprarmos uma passagem aérea para viajarmos por 15 dias de férias na Polinésia, estaremos praticando consumo positivo. Ou seja, o tipo de consumo e nossas motivações “dependem”. Do quê? Das circunstâncias em que nos encontramos.
Essa talvez seja a principal lição da ciência da gestão proposta por Clemente Nóbrega em seu último livro. Marketing é circunstância. A essência do marketing é o ser-humano; portanto, marketing é, antes de tudo, antropomarketing.
Assim, sendo, sugiro fortemente aos estrategistas e planejadores de marketing que, ao definirem seu próximo mercado, planejarem seu próximo lançamento, construírem sua estratégia de posicionamento de marca e estrutura de alianças e distribuição somente o façam se tiverem mapeado, em qualidade, as circunstâncias em que esse novo produto ou serviço, essa nova marca estaria interagindo com o consumidor potencial, se concentrando menos em atributos (tanto do consumidor, quanto do produto/serviço em si) e mais no processo de interação (razões, momentos, valores).
Isso porque pessoas querem que tarefas sejam feitas e os produtos e serviços, reforçados pela marca e por tudo mais que os envolve (distribuição, promoções, vantagens, embalagens, propaganda, etc), são os meios capazes de fazer com as tarefas sejam feitas (ou seja, que as necessidades sejam supridas nas circunstâncias em que é necessário que sejam – e isto depende!).
Neste caso, a pergunta certa a se fazer não é “Quem compraria esse novo produto que queremos lançar” ou “Quanto um cliente pagaria por este serviço extra”, mas sim “Em que circunstância (momento, situação, etc) esse meu produto (qual, como) resolveria (de que forma) algum problema (qual problema) de algum tipo de pessoa (os clientes potenciais)” ou “Quanto vale (valor de percepção traduzido em moeda) resolver (como, quando) este problema (qual) para aquela pessoa (qual) com esse serviço extra (qual, como)?”.
Isso é planejar marketing para circunstâncias. Responder isso é entender de consumo, pois é entender das motivações e aspirações dos consumidores. Quer testar? Quanto você pagaria por um hot-dog em uma van na esquina da Paulista com a Brigadeiro (1)? Um, dois, até três reais… não mais que isso, certo? E quanto você pagaria por um hot-dog em uma lanchonete do tipo New Dog ou Fifties (2)? Cinco, seis reais, certo? Opa! a marca e a experiência, que trazem consigo embutida a percepção superior de qualidade pesaram e você aceitou pagar mais por, basicamente o mesmo produto, né? Agora pergunto: quanto você pagaria por um hot-dog se estivesse na Somália em uma tribo passando fome (3)? Ah! Não tem preço?!
Obrigado por comprovar minha tese de que o preço não é atributo do produto, mas fruto da percepção do cliente, derivada de sua situação circunstancial. Ou seja, nos 3 exemplos acima passamos de comer, se alimentar (1), para sair, se divertir (2), para sobreviver (3).
O mesmo produto, para a mesma pessoa, em circunstâncias diferentes, têm valores (portanto preços) diferentes. Marketing circunstancial é isso. Menos atributos e mais circunstâncias. Sacar isso (e conseguir mapear e planejar em cima) é entender praticamente tudo!
Daniel Domeneghetti é sócio-fundador e diretor de Estratégia e Conhecimento da E-Consulting Corp. e vice-presidente de Conhecimento e Métricas da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (Camara-e.net)

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