A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) está prestes a definir de vez uma polêmica que já dura quase dois anos: quem deve pagar pelo serviço 0300? Cliente ou empresa? O impasse foi gerado porque havia muita denúncia de irregularidades como o usuário que acionava uma determinada empresa para fazer a reclamação de produtos e serviços e ainda tinha que arcar com os pulsos da ligação. Os órgãos de defesa do consumidor também têm ciência de reclamações em que certas empresas estavam trocando o serviço gratuito do 0800 pelo 0300. Por isso, desde setembro de 2002, a Agência decidiu interromper as concessões do serviço. Só em junho, ela anunciou a Consulta Pública 538 (Norma 6/99) para estabelecer quais os procedimentos entre cliente e empresa.
Além das reclamações, o cliente também queixa-se do tempo de espera na linha para ser atendido. Pedro Jaime Ziller, presidente da Anatel, diz que a situação precisa mudar, salientando que as empresas deverão arcar com o custo de espera. “O usuário não pode ser penalizado pela ineficiência de quem oferece o serviço”, observa. Segundo ele, a empresa que contrata os serviços da operadora passará a pagar parte do custo, antes bancado totalmente pelo usuário.
A Agêcia deve estabelecer que, no caso de ligação local, as fornecedoras de serviços e produtos vão pagar o mesmo valor de quem está ligando. No interurbano, a empresa deve arcar com 75%, menos o valor que o usuário está pagando. No documento publicado no Diário Oficial União, a ligação para o 0300 terá um custo de chamada local para todos os usuários, tanto na telefonia fixa quanto na celular, independentemente da localidade de quem origina e recebe a ligação. Hoje, o minuto da chamada custa R$ 0,29, na telefonia fixa, e R$ 0,67, no serviço móvel.
Com a alteração aprovada, o custo da ligação, a partir de um telefone fixo, será limitado ao valor do pulso local (quatro minutos), e poderá ser estabelecido em cerca de R$ 0,12. Na telefonia celular, a chamada custará aproximadamente R$ 0,29 por minuto, valor médio cobrado para as ligações locais. Anatel oficializa que “este documento e valores que regularizam a situação ainda não é oficial” e está passando por revisão. Mas, com as medidas aprovadas, a Agência espera que as empresas ofereçam um serviço “com melhor qualidade aos seus clientes”.
Defesa – Quanto às empresas que fizeram a substituição do 0800 pelo 0300, a Anatel reconhece-se sem poder. O Procon paulista avalia que a substituição dos números é contrária ao Código de Defesa do Consumidor e aposta que o atendimento gratuito deve fazer parte da estratégia de fidelização de cliente das organizações. “Empresas que disponibilizavam um canal de atendimento gratuito e o cortam promovem retrocesso em termos de defesa do cliente”, avalia Sônia Cristina Amaro, assistente de direção da Fundação Procon. Segundo ela, o maior prejuízo do cliente é quando conversa com o atendente e não consegue a informação correta ou solucionar seu problema. “Além de ter que passar por uma longa espera, em virtude da falta de um plano de relacionamento por parte da empresa, o usuário ainda vai ter que pagar por isso?”, questiona Sônia.
Em casos de serviços essenciais – energia elétrica, água e telefonia -, o Procon explica que as empresas têm a obrigação de disponibilizarem serviço gratuito, de acordo com normas das agências reguladores. No caso da Anatel, a Resolução 85, e da Aneel (Agência Nacional de Energia), a Resolução 456.
Um balanço do Idec, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, demonstra que as reclamações sobre o atendimento de telefonia chegou a 2.293 consultas, ano passado, representando 19,5% das pesquisas feitas no órgão pelos associados no setor de serviços. O número engloba os problemas de telefonia fixa, móvel e serviços por telefone das empresas, como o 0800 e 0300. Uma outra pesquisa feita no ano passado no portal do Idec revelou que algumas empresas estavam substituindo o 0800, gratuito, pelo 0300, pago. A pergunta no site era a seguinte: “Você boicotaria os serviços de uma empresa que age assim?” Em resposta, 4% manifestaram “Não” e 96% definiram-se pelo “Sim”.
Serviço completo – Maíra Feltrin, advogada do Idec, costuma dizer que a informação adequada e clara sobre os produtos e serviços colocados no mercado é um direito básico do cliente. “Se o cliente quiser, pode cobrar o tempo das ligações, o tempo que ele perdeu, o serviço de levar o produto à fábrica e o estacionamento usado. Ele tem direito a ter um produto completo sem nenhum problema”, ressalta.
A posição da ABA, a Associação Brasileira de Anunciantes, é que repassar a tarifa da ligação ao cliente gera desconfiança sobre até que ponto a empresa está disposta em ouvi-lo. “A reputação fica arranhada, pois a regra é não tarifar. Se a mensagem não for clara e o consumidor descobre depois que teve uma despesa pela ligação, compromete a confiança que existe na marca”, observa Afonso Champi Júnior, presidente de comunicação corporativa da entidade. Ele reconhece que as empresas que optaram por este caminho – e não foram muitas -, já estão revendo suas estratégias. E admite que resgatar a credibilidade perdida é um pouco mais complexo.
A cobrança de uma taxa para a prestação de serviços via telefone muitas vezes depende do tipo de relacionamento feito entre empresas ou empresa e consumidor, ou envolve até a categoria de produto ou serviço.Enfim, é uma escolha de cada empresa por meio de contrato com o cliente. “De maneira geral, não acredito que a transferência dos serviços 0800 para 0300 seja benéfica à imagem das empresas. Existe a percepção de que a empresa tem a responsabilidade de manter um canal de comunicação disponível, já que é (ou deveria ser!), a maior interessada em estabelecer contato com seus clientes”, explica Maria Lúcia Pettinelli, presidente do Comitê do SAC, da ABA.