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Será que o Governo entende o conceito de cliente?

O conceito de cliente é relativamente novo, quando observado pelo lado da importância do relacionamento estratégico – no sentido mais amplo do tema – e de resultado para as organizações. “Imagine se o nosso Governo tivesse essa percepção de cliente?”, questiona o reitor e fundador da Universidade Anhembi Morumbi e presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), o arquiteto Gabriel Rodrigues. Para quem, em 1957, trabalhava no Departamento de Obras Públicas de São Paulo, desenvolvendo material de relacionamento com engenheiros e arquitetos, a distância entre a atual filosofia de cliente com a implementada à época, é imensa. Mas ele se lembra de um chinês que já fazia a diferença no atendimento, no bairro da Liberdade. Gabriel conta que não entendia bem porque sua mãe ia mais longe comprar verduras, se por perto tinha outras mercearias. “Ele, na época, fazia a diferença”, recorda.
Por isso, ao falar de cliente, o reitor Rodrigues admite que ainda estamos caminhando na evolução de sua conceituação, no âmbito da comunidade e do relacionamento empresarial, em particular. E ele fala como cliente. Em função de seu estilo particular e empreendedor, foi entendendo o cliente que, há 30 anos, identificou uma oportunidade e lançou com amigos o primeiro curso de turismo do Brasil – e praticamente do mundo -, na então Organização Bandeirante de Tecnologia e Cultura. Foi o ensaio da Faculdade Morumbi. Depois, vieram cursos para formarem executivos de instituições financeiras e, em 1977, a aquisição da Faculdade de Comunicação Social Anhembi, quando surgiu a Faculdade Anhembi Morumbi. A meta sempre foi atender necessidades identificando oportunidades do mercado. Hoje, são 25 mil alunos, 1.000 funcionários e 800 professores.
Com a consolidação do negócio e o aumento da competição, as oportunidades podem aparecer a partir da qualidade do relacionamento com os clientes – para ele, a comunidade, muito mais que o aluno que fica quatro ou cinco anos na instituição. Foi assim que apareceram outros projetos como o da Universidade Corporativa, onde tem projetos com empresas como Multibrás e Softway. Nesta entrevista exclusiva, ele faz um balanço da evolução do conceito, através de experiências pessoais e as oportunidades geradas ao empreendedor. Sobre o futuro, ele é objetivo e direto: “O sucesso nosso foi porque sempre fugimos do tradicional. Procuramos investir onde a maioria das pessoas não conseguiu visualizar oportunidades – e agora não será diferente”. “Aqui no Brasil nós ainda estamos no primeiro grau na relação com o cliente.”
Quem é o seu cliente?
Naturalmente todos têm em mente aquela concepção mais antiga, ou seja, o cliente é quem compra o seu produto. Com o tempo, percebemos que qualquer organização, a exemplo de uma universidade, tem entre seus públicos, diversos perfis de clientes. O primeiro e o mais importante é o aluno; depois vem a família do aluno, que sempre está preocupada com a carreira e o sucesso profissional do filho, filha, ou qualquer outro grau de parentesco. O Governo e o País também são nossos clientes, pois eles estão preocupados com a formação dos seus recursos humanos. São as empresas, porque no momento em que a universidade faz um bom relacionamento com uma empresa, ela está abrindo possibilidades para o seu aluno. Outros que considero como clientes são os funcionários da instituição, os professores, a comunidade… no fundo, o cliente está disperso em todas essas possibilidades. E você precisa usar uma estratégia de relacionamento especial com cada tipo destes possíveis clientes.
O sr. fala do assunto com bastante paixão!
Realmente. Por exemplo, até o cuidado que se deve ter na hora de demitir um funcionário por qualquer que seja o motivo. Porque na conversa de demissão você precisa, com todos os recursos de uma boa comunicação, explicar claramente os motivos. Ele pode até não gostar – ninguém gosta de uma demissão, não é?! – mas ele vai ficar com uma boa impressão da instituição, o que significa dizer que não vai sair por aí criticando. Isso é para explicar a relevância do papel do cliente: mesmo sendo um ex-funcionário nosso, poderá futuramente vir a ser nosso cliente, se soubermos nos relacionarmos bem com ele. Então, olhando por este ângulo, realmente o cliente é um tema emocionante, que faz com que a gente interaja com ele. Mas, no fundo, toda empresa precisa desenvolver estratégias de relacionamento com o seu público, o Governo, não é? Imagine se o nosso Governo tivesse muito claro essa visão de clientes!…
O sr. acha que o cliente no Brasil é bem atendido ou ainda estamos engatinhando?
Uma coisa importante é você dispor de ferramenta para medir a percepção de uma empresa em relação aos diversos públicos, porque falar, todo mundo fala. E através da medição é que saberemos como melhorar o nosso relacionamento e a nossa prestação de serviço. Todo o enfoque que é dado ao cliente precisa ser lastreado por uma série de informações para que você possa, cada vez mais, otimizar o serviço prestado. No Brasil, os empresários estão começando a dar mais atenção ao assunto.
Qual conceito o senhor criou ou desenvolveu durante a sua carreira e implementou na universidade?
O conceito de cliente é novo, dentro desta concepção mais abrangente. Só com o tempo se percebe a importância a ser dada a todos os públicos com os quais você trabalha. Como por exemplo, saber lidar com a mídia, com o Governo, o professor… são todos planos específicos. Vou contar uma história de como podemos observar as coisas cotidianas e procurar usá-las em seu favor. Faz algum tempo, um professor queria falar comigo. O que acontece: é normal em todas as organizações, quando você começa, falar com todos os seus colaboradores diretamente. Depois, cresce um pouquinho e não dá mais falar com todos, então você adota seus representantes. Bom, esse professor queria falar comigo e normalmente eu não tenho porque falar com professores, pois tem o vice-reitor, os diretores e qualquer problema eles procuram resolvê-lo. Mas, ele “queria porque queria”. Ele chegou e disse: ´eu precisava falar com o meu reitor, porque a minha mulher disse que não se conformava por eu ainda não o conhecer´. Então, foi por causa da iniciativa daquele professor, que a cada quinze dias, no final da tarde, eu me reúno com um grupo de professores para tomarmos um lanche, nos relacionarmos de uma maneira informal e para que eles saibam quem é o reitor. Neste caso, eu sou o reitor e o criador da Anhembi Morumbi.
Quando e como o senhor começou?
Eu sou arquiteto de formação; comecei a trabalhar no Departamento de Obras Públicas (DOP), em 1957. Como você foi fazer o curso de arquitetura, significa que freqüentou uma faculdade, certo? Eu tenho uma raiz histórica porque fui aluno do colégio Santo Alberto e, no colegial, era professor substituto do primário. Participei ativamente de uma associação de pais de alunos, de um colégio chamado Pio XII, que começou no bairro do Paraíso e depois se transferiu para o Morumbi. E essa associação de pais ajudou no planejamento e desenvolvimento da Anhembi Morumbi. Então, sempre estive ligado à atividade educacional. No DOP, fui criador do grupo GTCom (Grupo Técnico de Comunicação), que era o setor para tratar da capacitação dos funcionários e divulgar o trabalho.
Como o senhor percebeu essa oportunidade de abrir uma faculdade?
No DOP havia engenheiros, arquitetos, auxiliares de engenheiro e desenhista. Aquela era uma época em que havia poucas faculdades. Os alunos que terminavam o colegial e não conseguiam entrar em uma, tinham como opções trabalhar no comércio, nos ofícios da família, ou ser funcionário público. Então – vislumbrando essa oportunidade que há 30 anos começava a despontar no cenário educacional brasileiro – um grupo de colegas e eu, formamos a Organização Bandeirante de Tecnologia e Cultura, e criamos o primeiro curso de turismo do Brasil e do mundo inclusive, dentro destas características que o curso tem hoje. Era 1971.
Quer dizer que o turismo foi o ensaio para a Anhembi Morumbi de hoje?
Sim, esse foi o nosso primeiro curso da Faculdade de Turismo Morumbi. Logo depois, criamos um curso para formar executivos para trabalhar em instituições financeiras. Em 1977, adquirimos a Faculdade de Comunicação Social Anhembi. Então surgiu a idéia de juntar as duas faculdades e procuramos dar um nome: foi aí que surgiu a faculdade Anhembi Morumbi. O nome foi consenso para não deixar os alunos das duas faculdades descontentes. Com o decorrer do tempo, ganhamos peso e em 1997, ou seja, 20 anos depois, ela foi credenciada como universidade.
Como o sr. se sentia na época como cliente?
Naquela época não existia o cliente. Existia o consumidor, relações públicas, que tinha um enfoque mais idealista dos diversos públicos que interagiam na empresa. Mas não com esse foco de cliente. Eu me lembro de um chinês que sabia trabalhar a relação com o seu cliente. Naquele tempo existiam os armazéns de esquina e esse chinês era dono de um. Então, a minha mãe só comprava com ele. Perto da nossa casa havia uns cinco armazéns: nós morávamos na Rua Condessa de São Joaquim e o armazém do chinês era na Vergueiro. Eu tentava entender porque a minha mãe, mesmo havendo mercearias por perto, saia para fazer compras longe. Mas o chinês era simpático, vinha pegar o pedido, dava todas as informações sobre o produto, ficava conversando, ou seja, dava toda atenção à minha mãe e ela não comprava em outro lugar. Veja você: até nas pequenas coisas a importância do relacionamento é fundamental. Isso é uma habilidade, um atributo pessoal, porque há pessoas que fazem melhor do que outras. É tudo questão de jogar na posição certa, não é?
Como o sr. aplicou o conhecimento de relacionamento pessoal no negócio para crescer?
Sou um homem paciente e perseverante. Em função disso e dentro de uma expectativa que tinha há muito tempo, você acertando a atividade, não precisava ter preocupação, porque havia uma demanda muito maior. Acho que a preocupação do cliente só aparece quando nós estamos num mercado mais concorrencial e que você precisa estar preocupado com todos os públicos, como está acontecendo atualmente. Eu escolhi o setor educacional, como já disse, por ter ligações históricas e o mercado ajudou, pois não havia a concorrência de hoje. Por isso conseguimos crescer.
Quais as maiores preocupações de uma empresa?
Dentro deste enfoque você precisa trabalhar o seu cliente. No tratamento inicial, isso é tratado empiricamente, quer dizer, tratar bem todas as pessoas que dependem de você. Porque na empresa há um grupo de pessoas e você depende delas também, para ajudar a levá-la adiante. Acho que em qualquer negócio, essa preocupação deve ser para todo mundo que trabalha, direta ou indiretamente com você. Agora, quando os negócios ficam, digamos, com mais exigências do mercado, você precisa ter um grupo de colaboradores unidos, com os seus propósitos e a sua missão.
E o que fazer para que essas pessoas se fechem em torno da missão da empresa?
É o trabalho de todo o dia e o desafio que as instituições terão daqui para frente: fazer com que isso aconteça. É preciso deixar bem claro à toda a organização a missão, os objetivos, onde se pretende chegar. Quais os benefícios diretos ou indiretos que os colaboradores poderão ganhar, caso consigam cumprir metas pré-estabelecidas e, acima de tudo, passar para eles que se trata de uma grande família e que precisam se desenvolver para poderem sobreviver às intempéries do mercado.
E como perceber se os colaboradores estão em sinergia com a filosofia da empresa?
Há uma nova ferramenta desenvolvida nos EUA chamada Balanced Scorecard, um sistema de pontuação, que funciona como um placar. No conceito mais antigo, as empresas eram avaliadas pelo lucro financeiro. Quanto mais lucro, melhor era o conceito daquela empresa. Porém, se lembrarmos a metade do século 20, quantas organizações tradicionais que, de uma hora para outra, saíram do mercado? É para isso que surgiu essa tecnologia e conceito. Ela mede quatro fatores de uma companhia: econômico, processos, desenvolvimento e a satisfação do cliente. Como o cliente vê a empresa? Sua satisfação é medida através de pesquisa, porque às vezes, as empresas podem estar indo muito bem financeiramente, mas se os seus recursos humanos estiverem estagnados, a prospecção dela não será para frente. Se por outro lado, os clientes não estiverem satisfeitos, o prognóstico também não será bom. Então, você tem uma forma clara de medir o desempenho da empresa. Em 2001 surgiu outro conceito denominado administração total do Scorecard, que alia o medidor empresarial e pessoal e o outro como medidor de qualidade e relacionamento. Porque não adianta a empresa ir muito bem se o funcionário vai mal – todos precisam estar ligados ao projeto da companhia. Se o projeto de vida do funcionário não estiver ligado ao projeto da empresa, a questão fica complicada, para dizer o mínimo.
Em que área a Anhembi Morumbi pretende investir daqui para frente?
Nós agora vamos priorizar os investimentos na indústria criativa. O setor tradicional lida com fabricação de produtos e as indústrias criativas com a criatividade. Tudo o que estiver ligado à imaginação, design, turismo, moda, congressos. Quer dizer, tudo que se consegue movimentar como negócio e que faça parte do processo de criação – esse será o nosso foco daqui para frente. A indústria criativa é responsável por 7% do PIB (Produto Interno Bruto), do planeta. Ela está começando a despontar agora, mas empiricamente, nós sempre andamos pelos caminhos da indústria criativa. O sucesso nosso foi por sempre fugirmos do tradicional. Procuramos investir onde a maioria das pessoas não conseguiu visualizar oportunidades – e agora não será diferente.
Como é possível identificar o cliente para futuros vôos?
O cliente sempre existiu. Vamos pegar um exemplo que acho excelente, que é o da religião católica. Ela dispunha de uma ferramenta que avaliava o seu cliente: era o confessionário. O padre ficava ali só pesquisando para saber quais os anseios de seu cliente e quando chegava a hora da missa – baseado no que ouvia no confessionário -, desandava a falar dos problemas. Mesmo com toda essa percepção que a Igreja Católica teve, ela não foi sensível em perceber, num determinado momento, que os clientes não queriam mais apenas o “reino dos céus”. Eles queriam ter um projeto de vida e realizá-lo em vida. As igrejas protestantes fizeram justamente o contrário. Elas identificaram o fiel como um cliente e estão conseguindo se expandir. Qual é a promessa destas igrejas? É “uma vida melhor na terra mesmo”. Você pode até criticar que elas estão apenas interessadas na questão econômica, mas no fim, pregam o bom caminho e vendem a credibilidade que cada um precisa ter em si, para vencer na vida. E o que é que elas pregam? Que acreditemos em Deus, ou seja, é “a religião a serviço do projeto de vida de cada um”, mais pragmática.
Como fidelizar o cliente?
Isso aí você sabe melhor do que eu (risos). Mas na minha opinião é a nossa criatividade, porque o aluno mudou e a instituição tem que acompanhar tais mudanças. A maioria das universidades continua dando aulas como 30 anos atrás. É preciso estar sensível a essas mudanças e criar produtos que vá ao encontro disso tudo. Poucas universidades no Brasil têm a percepção do aluno como cliente por toda a vida. Porque não se pode pensar o aluno como um cliente por apenas quatro anos. É preciso ter em mente que ele se relaciona com muitas pessoas, que vai casar e ter filhos, que tem amigos e que vai falar da universidade para todas essas pessoas. Porque no boca-a-boca o cliente-aluno é o nosso maior propagador.
O que está sendo preparado de novidade?
Durante o curso, tudo o que o professor fala em sala de aula se perde e nós estamos nos organizando para fazer com que a aula seja registrada. O professor faz um programa e as aulas ficam ali, a disposição do aluno através da internet. Isso é mais uma estratégia de relacionamento com nossos públicos. Porque a cada aula cria-se outra nova aula que vai sendo sempre adaptada e o aluno vai ter acesso a ela por toda a vida. Certo dia eu encontrei um ex-aluno que se formou aqui na década de 80. Ele reclamou que nunca havia recebido uma correspondência da gente. É falta de relacionamento e vamos procurar, de todas as formas, mudar isso. Porque o aluno é o principal objetivo da instituição.
Como cliente, o senhor é satisfeito?
É difícil responder essa questão, mas vou citar um exemplo que aconteceu comigo recentemente. Fui a um restaurante almoçar e estava só. O prato principal da casa era costela na ripa. Para acompanhar, pedi uma salada. O garçom trouxe uma, enorme, mesmo sabendo que uma pessoa não consegue comer tanto. Embora eu não tenha perguntado o tamanho, era para o garçom ter se antecipado e providenciado para apenas uma pessoa. Claro que a culpa não é apenas dele, mas dos responsáveis pelo restaurante, que não instruíram o funcionário para certas situações. Aqui no Brasil nós ainda estamos no primeiro grau na relação com o cliente.

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