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O que precisa transparecer é a essência



As grandes marcas são grandes porque mantém um forte vínculo emocional com seus clientes. Nada mais simples que a intimidade entre o DNA de uma marca e sua “fala” – o incrível desafio profissional. São poucas as empresas, no mundo, que atingiram um estágio de maturidade de proposta baseado num repositório de conhecimento, organizados de tal modo que transformam a missão de produzir serviços ou produtos numa manifestação de um organismo pleno de vitalidade e consciência. Para estas empresas, o seu maior patrimônio é a marca. A Revista ClienteSA, trilhando o caminho de garimpar inovação, está correndo atrás das mentes mais brilhantes, capazes de compreender, produzir conhecimento e dar forma ao conteúdo de uma proposta genuína de marca. Encontramos a beleza nos gestos e na harmonia da desafiante designer Filomena Padron, profissional reconhecida por seu talento na transposição do objetivo empresarial à percepção do cliente, já há 16 anos na estrada da gestão de identidade de marca, design e branding.

Graduada em design gráfico e design de produtos pela Universidade Mackenzie, tem especialização em identidade visual pela FAU, gestão da informação com o mercado pela GV e MBA em marketing. Durante 12 anos foi responsável pela direção de criação, gestão do design e Identidade da marca Natura. Sem exceção, os profissionais envolvidos com o negócio de marca reconhecem sua excelência. Não é por acaso que a Natura está em 4º. lugar entre as 15 marcas mais valiosas do Brasil. Entre os prêmios internacionais, ela traz na bagagem o IF Design – International Forum Design – Hanover – WorldStars for Packaging, de 2003 e 2006. Na atualidade estabeleceu-se na Vila Madalena, bairro descontraído e selo de criatividade de São Paulo, com o Estúdio Filomena Padron, prestando consultoria em branding a importantes empresas, com o foco em linguagem de marca. Filomena é imperdível.

 

O que é inovação para você?

Inovação é uma palavra que está na moda, mas acho que isso é premissa de quem trabalha com criação. Ela não está presa somente a inovação, mas também a um ideal. As marcas conseguem inovar ou ir em frente porque têm ideal, visão de mundo e objetivo. Isso é o que te leva para frente. Inovação é olhar adiante. Se a marca não faz isso, se só olha para o mercado que está ao seu lado, ela não inova, não está na frente.

É correto falarmos que o projeto de vida de uma empresa é a marca?

A marca é mais que a empresa. Existem algumas empresas que têm só o projeto de vender. A marca está além da venda, além da empresa. Ela passa a existir quando se constrói um espaço de relacionamento, quando estabelece um comportamento, uma atitude, um compromisso maior do que a venda. Quando ela começa a ser gravada no mercado, vai além do símbolo da venda. A partir daí é que a empresa passa a existir, não só no mercado, mas na cabeça das pessoas. E por isso que marca é mais do que um sinal gráfico ou um nome. Ela é uma atitude, um comportamento e um relacionamento.

Daí a expressão “linguagem de marca”?

Ela é o veículo para a empresa chegar ao consumidor. A marca tem uma forma de pensar e de agir que a caracteriza. A linguagem é o que faz chegar perto das pessoas e estabelecer uma troca. A expressão vai além da comunicação, não é só propaganda e mídia, ela está no jeito de atender o cliente, no comportamento, na experiência proporcionada, no ambiente, no design do produto e em todos os sinais cognitivos que o fazem identificar uma marca. A linguagem da marca é quando se estabelece uma identificação, um ponto de contato onde o consumidor se relaciona, se reconhece naquilo. Por mais que as pessoas queiram, não conseguem dividir o emocional do racional. Elas podem racionalizar qual é o mais barato, o mais correto, mas tem alguma outra coisa que as leva para o outro lado, que elas não conseguem explicar. É o encantamento, a forma, o cheiro, tudo que ela ouviu, bagagem emocional, lembrança de que aquilo relaciona-se com alguma experiência. A marca, de alguma maneira, simboliza ou projeta algo que a pessoa foi, é, ou ainda o que quer ser.

Vivemos em uma explosão das possibilidades de contato com a marca. Entretanto, quando é que uma empresa amadurece a consciência da marca?

Essa consciência tem surgido muito em exemplos de marcas que se estabelecem com solidez no mercado.  Como a Natura e várias outras, que investem na construção da marca, que dão consistência para estratégias de marca, de comunicação e design. Isso começa a colocar uma diferenciação entre outras empresas que estão voltadas só para venda. Cada dia mais a concorrência é maior, os consumidores mais exigentes. Eles começam a cobrar da empresa uma atitude, mais do que só produto. Uma atitude de relação, de compromisso, uma ação com qualidade, com processos, com forma de fazer.

Sua origem é no design, mas na Natura você fez interface com distintas áreas da empresa. Poderia falar um pouco sobre isso?

O design é uma ferramenta fundamental para a empresa, porque consegue materializar conceitos. É capaz de dar forma a intenções, entregar um produto de uma maneira não só física, mas consegue trazer emoção, sensações, conveniências, atender necessidades. O bom design não é feito para durar seis meses ou um ano, é feito para durar 10 anos, 20 anos. Ele precisa ter uma visão atemporal, estar à frente da necessidade do momento, ter clareza de onde quer chegar com uma proposta. O design é importante porque reúne todas as iniciativas criativas, estéticas e sensoriais que a marca tem para um único objetivo: sua construção. Ao convergir as iniciativas, cria-se uma estratégia para isso. Dentro da empresa, esse é o maior ouro de uma gestão de identidade corporativa. É estabelecido um planejamento, indicadores de resultados para saber o quanto a marca está sendo assimilada, reconhecida e identificada. A gestão é fundamental para que a marca consiga atingir esses objetivos.

A Natura é uma empresa que considera o design estratégico para sua existência?

Com certeza. Por isso a Natura é tida como referência, não só como marca, mas como identidade de marca construída, como linguagem, estética, que se expressa e consegue se manter atual, não só em termos de produtos, mas em termos de expressão. É uma marca de grande expressividade. Mas por trás, tem uma estrutura muito consistente preocupada com isso.

Foi sempre assim?
A Natura não nasceu com uma estratégia de marca pronta. Isso é um processo de amadurecimento. Ela tinha na liderança pessoas com compromisso com a marca. Do outro lado, havia a comunicação, ou seja, o veículo para expressar esses conceitos. Também tinha o design de produtos, que é o veículo de comunicação da qualidade dos produtos. Porém, a empresa só amadureceu quando percebeu que essas coisas precisavam estar integradas, dentro de uma estratégia.  A partir daí, começamos a ter convergência de esforços para começar a trazer identidade. Isso foi crescendo dentro da Natura. Construímos uma identidade visual que expressasse a marca. Vimos que todos os produtos precisavam comunicar o DNA da Natura. Antes, o design trabalhava isolado, cada marca de produto tinha sua cara. Quando ampliamos os conceitos de cada parte, conseguimos ver que todas estão ligadas e começamos a reunir isso em uma estratégia, entendendo que isso é uma estratégia de marca e de design. Com o tempo, o que era conhecido no mercado como identidade visual foi ampliado e ganhou maturidade.

Quando a sustentabilidade se cristalizou na Natura? E qual a relação entre desenvolvimento sustentável e linguagem de marca?

A sustentabilidade existe na Natura, assim como a marca sempre existiu, mas não tinha esse nome. A Natura já tinha isso dentro da essência, onde tudo é interdependente, ou seja, minhas atitudes impactam em quem está ao meu lado. Há 35 anos, a Natura já acreditava na interdependência. Isso ganhou maturidade com o tempo. A importância das relações humanas, do compromisso social com a marca, da viabilidade econômica de suas ações e o impacto com o meio ambiente foram amadurecendo. Se isto é um compromisso da empresa, foi assumido como sua raiz e não como aspecto de marketing. No caso do design, é um compromisso muito forte e complexo, porque não está só nas mãos da empresa, está nas mãos dos parceiros, de uma cadeia muito grande. O design para a Natura cada vez tem ganhado mais força na atitude. Por exemplo, o programa de análise de ciclo de vida, onde é estabelecido qual o impacto ambiental que determinada embalagem gera, isso é medido por indicadores. Esse indicador está acima da estética, não adianta o design ser maravilhoso. Se ele não estabelecer um indicador adequado para determinada linha, não é aprovado. Isso faz parte da escolha da empresa que abre mão de algumas coisas em função do impacto ambiental e dessa análise do ciclo de vida. No mercado de cosméticos há luxo, detalhes, excesso de materiais e a Natura foi quebrando essa cultura em função de um compromisso maior, sem abrir mão da estética.

Um exemplo disso é o Perfume do Brasil?

Esse produto trouxe uma grande visibilidade do que é o design brasileiro. Levar o Brasil não de um jeito estereotipado, mas sim, um País elegante, que tem qualidade, criatividade e delicadeza. Foi um grande desafio construir uma perfumaria fina, onde o Brasil não é reconhecido por essa tradição. Tem muito valor ser reconhecido pelo mercado com um produto que não é uma cópia do mercado internacional. A marca leva o conceito da tradição e da cultura brasileira, os ativos foram tirados da biodiversidade brasileira e o design teve que materializar tudo isso. Por isso, primeiro nos inspiramos nas sementes como, por exemplo, na castanha-do-pará, que é extremamente rústica e parece bruta por fora, mas é delicada e bonita por dentro. Esse foi o ponto de partida. Ter a cerâmica como a casca de uma semente, onde tem uma coisa muito preciosa e delicada dentro, que é o frasco do perfume.

Como você vê o desenvolvimento do design no Brasil?

O Brasil vem crescendo. No entanto, os empresários brasileiros ainda precisam ter consciência plena de que precisam investir para aumentar os recursos de empresas, fornecedores e profissionais. Se não tem demanda, não tem entrega. Na China e na Itália, há uma demanda muito grande, e por isso conseguem qualificar e preparar profissionais. No Brasil, existe muito talento e criatividade que precisa de uma demanda que invista nessa parceria. Não é só comprar o objeto, o cliente precisa estabelecer uma parceria com os fornecedores. Na Natura, em relação ao sucesso do seu design, foi estabelecida uma parceria com designers e fornecedores. Não é só criação, precisamos da engenharia, da técnica e desses profissionais juntos em equipe. Também é preciso transferência de conhecimento, se o designer não tiver abertura da empresa e do cliente não consegue acesso à informação, e aí os fornecedores também se fecham e ele não consegue ter os recursos necessários para ganhar técnica, informação e conhecimento, fica só com a criatividade e com o talento.

Hoje você não trabalha mais diretamente na Natura?

Não diretamente, mas continuo prestando consultoria. Há um ano, montei um escritório para prestar consultoria para a Natura e outras empresas. Porque o que traz a força da marca é o aprendizado, o conhecimento estabelecido nessas relações. O design não é um produto que apenas deve ser comprado. Ele tem que ser um processo de gestão, de capacitação. Afinal, o gerente de marca não é um cargo de um departamento, ele está nas mãos de todos os funcionários da empresa. Todos são gestores de marca, seja o gerente de comunicação, de marketing ou de produção. Isso tem que ser levado para todos os níveis hierárquicos da empresa. Hoje, meu papel, além de desenhar esse conceito, é fazer o planejamento, implementação e disseminação para que as empresas adquiram conhecimento.

 

O que você pensa a respeito de publicidade e design?

Publicidade não é o veículo de construção de marca, é só um deles. Ela transfere os conceitos da empresa. Acho que ela precisa dar mais um passo no compromisso da construção de marca com as empresas. Não apenas levar só uma campanha de sucesso e premiada que, apesar de não deixar de ser importante, não é o objetivo da publicidade. Ela tem de estar ao lado do cliente, dentro de uma estratégia de construção de marca, trazendo consistência. E o design também é um dos veículos. E a união de todos esses veículos é que constrói a marca.

Entre as 10 empresas mais rentáveis do mundo, sete delas tem suas origens no design. Isso quer dizer que o design seria o território de uma amplificação, de uma consciência mais clara a respeito dessa oferta genuína de marca?

Design é fundamental porque dá forma à idéia, forma a uma imagem, a uma intenção. Não adianta ter uma estratégia sem forma, sem materialização. Por isso o design tem de estar muito próximo de todos os veículos de expressão. Mas o design sem estratégia também não é nada. Só são formas, e ele não traz a força que a marca precisa. Esta é a grande união: do design, da criatividade, do talento, de trazer emoção para as marcas, mas aliado com uma estratégia, com pensamento voltado e convergente para o negócio e para a necessidade que a empresa tem.

E quanto tempo leva esse processo?

É um processo que leva seis meses. Esse trabalho não é só uma questão estética. A estética vem só no final. Começo o trabalho na construção de identidade, de posicionamento, da proposta de valor que essa marca tem e o que ela entrega. Se ela não tiver um ponto de partida fica a forma pela forma. Estabeleço as diretrizes para que meu cliente possa fazer uma comunicação, implementar um design para o produto, definindo as diretrizes, as estratégias para construção, os pontos de partida e as premissas que uma marca precisa para sua comunicação.

Poderíamos dizer que os consumidores têm tanta informação que não perdoariam empresas que não desenvolvem atividades de design em seu interior?

Claro. Uma marca chega no seu máximo de linguagem de expressão quando é reconhecida não pelo logotipo, mas sim, reconhecida sem o seu logo. Reconhecida pelo conjunto de sinais que emite. Seja por uma foto, por uma cor, um jeito de fazer, jeito de falar e de se comunicar. Aí sim, quando o consumidor a reconhece por essa atitude, se chega a um ponto ideal de marca.

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