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A inovação, à flor da pele



Inovação. Associado a outro termo não menos intrigante, biotecnologia, tem servido de base para um negócio revolucionário na área médica. Foi assim que nasceu a Pele Nova, resultado de estudos nos laboratórios da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), de Ribeirão Preto. Foi em 1994, quando a médica oncologista Fátima Mrué desenvolvia sua tese de doutorado estudando materiais para reparo de trato esofágico em animais com câncer de esôfago. Mas foi ouvindo seus principais clientes – distribuidores, enfermeiras e o consumidor final – que a empresa, em 2006, decolou, pois mesmo com o lançamento do BioCure, um produto revolucionário e natural, batia na resistência do mercado. O business plan, elaborado em 2004, demorou para atrair investidores que, um ano depois, permitiram investir na primeira planta industrial e rever a política comercial. O modelo do negócio começou a frutificar com o posicionamento como fornecedor de matéria-prima, a identificação de parceiros, ou distribuindo (no caso do BioCure) ou desenvolvendo produtos finais. A orientação do mercado foi fundamental no sucesso do negócio, reconhece Marcos Silveira, que entrou como diretor financeiro de hoje responde como CEO da companhia, que vem crescendo aos saltos – pulou de pouco mais de R$ 400 mil, há três anos, para fechar este ano com R$ 3 milhões, como aposta o executivo. E, apesar de atuar em segmentos dominados ou por multinacionais ou grandes empresas, desenha um modelo que, com parceria, está contribuindo para grandes inovações. “Se hoje os produtos tradicionais representam algo em torno de 70% do faturamento de fabricantes de produtos farmacêuticos de beleza, entramos nos 30% de produtos inovadores, que no futuro serão fundamentais para a sobrevivência. Assim, também teremos um crescimento exponencial”, aposta Marcos, nesta Entrevista Exclusiva. Ele faz um balanço do negócio, discute as oportunidades de inovação que abre em mercados tradicionais e a viravolta na Pele Nova, agora preparada para crescer.

 

Qual é a sua formação?

Sou engenheiro mecânico aeronáutico e administrador de empresas. Minha formação foi voltada para planejamento econômico-financeiro e consultoria de estratégia. Trabalhei 12 anos em grandes empresas de consultoria e auditoria com clientes do setor químico, petroquímico e farmacêutico. Depois, fui convidado a trabalhar na Pele Nova, assumindo a posição de diretor financeiro, em 2004, e nos últimos três anos, tenho me dedicado aos negócios da empresa com o objetivo de transformar essa start-up na área de biotecnologia, voltada a produtos para a saúde humana.

 

Como nasceu a idéia da Pele Nova?

A Pele Nova nasceu em 1994, resultado de um trabalho da Dra. Fátima Mrué, médica oncologista que defendia tese de doutorado com a orientação do professor Dr. Joaquim Coutinho Neto. Após estudar diversas possibilidades alternativas para a tecnologia que já era usada nos Estados Unidos e Japão, encontrou no látex o substituto ideal para o material usado por outras empresas. Era dedicado ao trato esofágico de animais com câncer.

 

E como a experiência foi revertida para benefício humano?

Depois das experiências com animais, a Dra. Fátima resolveu fazer um protocolo clínico para a primeira aplicação médica. A condição humana encontrada foi a úlcera de perna, ou pé diabético. São condições onde o paciente sofre de insuficiência circulatória devido à ausência ou lesão dos vasos arteriais ou venosos. Com o tratamento, em oito semanas o tecido necrosado é removido, conseguindo promover a granulação, a formação de novos vasos sangüíneos. Ou seja, praticamente, todo o tecido lesado do paciente é recuperado.

 

Quando, efetivamente, o projeto saiu da esfera de pesquisa para se transformar em empresa?
A da Dra. Fátima publicou uma tese e requereu a patente da descoberta. Foi seu espírito empreendedor. Isso já em 1996. A patente foi depositada em 1996 e em 2002, encontrou uma empresa de participação em projetos na área de biotecnologia. Tivemos a satisfação de cair nas mãos do Osires Silva, um dos conselheiros, que percebeu a distinção do projeto entre os muitos que estava avaliando. Com isso, fomos convidados a fazer a exposição (a Dra. Fátima e o Dr. Coutinho) para esse investidor inicial. O resultado foi positivo e gerou interesse. Assim, nasceu a formatação da empresa: a Pele Nova Biotecnologia Ltda. A Dra. Fátima transferiu a titularidade da patente para o investidor e, conseqüentemente, recebeu participação na empresa. Daí para a empresa decolar, levou, aproximadamente, um ano e meio. Montou-se um plano de negócios, pensando no que o mercado pedia, o que o mercado precisava e o que o cliente dessa tecnologia necessitava. É uma tecnologia inovadora e pensamos em como atender às necessidades do mercado. Participei desse projeto, especificamente em sua parte final, na fase de estruturação de capital para poder fazer com que a empresa decolasse.

 

Quem fez o business plan?

Foi montado por uma empresa de consultoria que levantou as necessidades do mercado na área de curativos estruturados para pacientes crônicos. O nosso paciente é o paciente crônico portador do pé diabético, da úlcera de perna e, em um campo mais amplo, um paciente acamado em leito hospitalar. Hoje, temos aproximadamente, dois milhões de pacientes sofrendo algum tipo de ulceração crônica. Basicamente, 70% deles são atendidos pelo setor público e 30% pelo setor privado. É um público que está em uma faixa etária mais elevada, de 40 a 65 anos e nas camadas menos favorecidas da população, nas classes C e D. São pacientes típicos que não fazem prevenção de doenças durante a vida e, por isso, desenvolvem situações crônicas.

 

Quais foram as grandes dificuldades para o negócio sair do business plan e, efetivamente, ganhar mercado?

A primeira grande dificuldade foi capital para decolar. Era uma grande idéia, com inovação, patente, mercado definido, não só no Brasil. Afinal, só o mercado de curativos na área de pacientes crônicos movimenta US$ 8 bilhões por ano. Então, não falta mercado nem faltam grandes empresas, pois sabem que é lucrativo. Entre os grandes estão Johnson & Johnson, 3M, ConvaTec, Coloplast. No Brasil, o risco ainda está começando a ser melhor apreciado. Houve uma grande evolução nos últimos três anos. Tanto que a quantidade de empresas abrindo capital na bolsa de valores aumentou. O mercado de capitais, hoje, começa a tomar figura de um mercado mais maduro para financiar o risco. Nossa empresa tinha a condição de start-up. Tivemos que passar por todo o processo de road show para levantar fundos, o que durou quase um ano e meio – de abril de 2002 a outubro de 2003.

 

Os que entraram no negócio são nacionais?

Sim. E podemos citar empresários como Gilberto Bomeny, do World Trade Center, Marcelo Vespoli Takaoka, da construtora Takaoka, em Alphaville, a família Frering e Fundo Rafe. Esse grupo de empresas acreditou no processo e investiu na empresa.

Isso deu a condição inicial para montarmos a fábrica em Mato Grosso do Sul, até porque um dos acionistas tinha propriedade no Estado e nos cedeu. E com isso, montamos o empreendimento, lançamos o produto no mercado e montamos um plano de marketing.

 

Qual foi a grande dificuldade?

A primeira foi o capital. Depois, foi lançar o produto nas condições ideais e a terceira, entrar em um mercado dominado por seis grandes multinacionais. Apanhamos até conseguir levar a mensagem ao nosso público. Primeiro porque não estávamos vendendo diretamente para o paciente. Nosso primeiro cliente era o médico. Tínhamos que vender a opinião, o conceito, trazendo uma tecnologia nova e nacional, frente a inúmeras outras tecnologias disponíveis no mercado e bastante desenvolvidas. Isso dobrou nosso esforço. Além de termos que provar a funcionalidade do produto, tínhamos que trazer uma bagagem de estudos clínicos associados, garantindo segurança e eficácia – duas palavras-chave em medicamento e saúde. A quarta dificuldade foi entender que nosso mercado tinha uma dinâmica que passava pelas enfermeiras, que tem papel importante com paciente crônico. Ganhamos essa visão durante nosso estágio no mercado. Fomos aprendendo as lições para poder fazer uma sintonia mais fina e chegar de maneira mais efetiva ao paciente, que é nosso cliente final. Afinal, queríamos que o paciente se recuperasse. Sabíamos, por meio dos estudos, que 80% dos casos se recuperavam em oito semanas. Por que não transformar isso em uma realidade? Mas tínhamos que passar por outros clientes intermediários que são extremamente importantes. A quinta dificuldade foi mensurar o tamanho da nossa força de vendas. Estávamos comparando nossa força de vendas, com seis vendedores, com a de multinacionais, com oitenta vendedores. Isso, obviamente, nos colocava em nítida desvantagem. Foi aí que começamos a ouvir melhor o mercado.

 

Quais foram as estratégias para superar essas dificuldades?

Em 2004 não tivemos um bom ano. Em 2005 aprendemos todas as lições do mercado – de forma direta, o cliente estava nos sinalizando – e, em 2006, passamos a colocar nossa estratégia em prática. Uma das lições foi em relação à força. Percebemos que somos muito bons em desenvolvimento de novas tecnologias, pesquisa-base e aplicada. Mas na área comercial precisávamos de parceiro. Hoje, temos um grande parceiro, que é distribuidor de produtos hospitalares e que tem uma tremenda força de vendas, atingindo mais de 20 Estados, a Hospfar Indústria e Comércio de Produtos Hospitalares. Foi um casamento feliz. Diminuímos a margem, mas aumentamos o volume.

 

E começaram a despontar os clientes…

Sim. O cliente foi identificado como gestor dos processos de compra de curativos, que geralmente são enfermeiras que trabalham nas comissões de enfermagem ou nas comissões de padronizações de hospitais, as formadoras de opinião. A Hospfar conhecia muito bem esse processo e, com isso, começamos a ouvir o que elas tinham a nos dizer em termos de aproximação dessas instituições. Internamente, ficamos apenas com um gerente nacional de vendas e uma estomaterapeuta, elo de ligação entre a força de vendas e o distribuidor. Assim, ampliamos significativamente a possibilidade de fazer negócios. Passamos a ter uma força de treinamento. Começamos a passar o conhecimento da nossa tecnologia para as enfermeiras e vendedores do distribuidor.

 

De alguma forma, você sentia pressão de descontinuidade do projeto?

Sem dúvida. Em um momento nos questionamos se o produto teria efetividade no mercado. Mas fomos descartando as hipóteses ruins, reafirmando que o produto era bom. Quer dizer, a tecnologia por si só, funciona. O produto funciona e é muito bom e quando é comprado, é aceito e utilizado. O problema estava na repetibilidade, no discurso e no treinamento para convencer e treinar a enfermeira a usar o produto. Uma vez que vencemos essa barreira, conseguimos ir em frente. De repente, conseguimos ver que esse processo junto com nosso distribuidor deu certo, e começamos a crescer.

 

Então o ano da virada foi em 2006?

Sim, foi o ano da virada. Em 2007, já chegamos a um faturamento maior. E em 2008 e 2009, temos faturamento projetado, junto com nosso parceiro, cada vez mais crescente. Começamos com R$ 400 mil em 2005, e estamos saindo desse valor para R$ 3 milhões. A tendência é aumentar, estabilizar, chegar à faixa de R$ 6 a 7 milhões.  O nosso mercado não é muito grande, deve estar em torno de R$ 50 a R$ 80 milhões por ano.

 

Vocês pensam em novos produtos?

Sim. Ao identificar este limite de crescimento, tivemos outro questionamento. Ser uma empresa com mais de um produto. Assim, ainda em 2006, fomos identificar as necessidades do mercado – ou oportunidades. Descobrimos, por meio de testes, uma proteína com bons resultados no tratamento anti-rugas. Foram 65 mulheres entre 45 e 50 anos que foram submetidas a 30 dias de uso do gel que continha essa proteína. A redução de rugas foi de 80%. Vimos que o mercado pedia novas tecnologias de princípio ativo natural. Achamos que podemos ter condições de atendê-los à medida que encontramos uma proteína do látex com essa atividade. Outra descoberta que fizemos foi no tratamento anti-queda capilar. O produto, ao estimular a angiogênese e a formação de colágeno, estimula a formação de novos folículos.

 

E qual é a estratégia para esses novos produtos?

Só o mercado de úlcera crônica gira em torno de R$ 80 milhões, no Brasil. O de produtos na área cosmética é o 3º maior do mundo. São R$ 16 bilhões por ano. Ficamos apenas atrás dos EUA e Japão. Passamos a França, que é o 4º maior mercado do mundo. Só na área de tratamento anti-rugas são quase R$ 1 bilhão por ano. São duas áreas onde resolvemos adotar outra estratégia para chegar ao mercado. Entendíamos que o mercado é crescente, mas não deveríamos cometer o mesmo erro do início da Pele Nova, que foi montar nosso produto e chegar ao mercado com nossa embalagem e com nosso marketing. Isso é muito custoso para uma empresa pequena. Resolvemos adotar a estratégia business to business. Nos apresentamos a grandes empresas farmacêuticas e de cosméticos, mostramos nossa tecnologia e encontramos três grandes parceiros. Estamos desenvolvendo o produto para, em parceria, a partir de 2008/2009, entrar no mercado. Uma das empresas é francesa.

 

Você está oferecendo um produto em um mercado commoditizado, e vai enfrentar muitos executivos que crescem dentro da margem planejada e não são muito afeitos a inovação. Como você oferecerá um produto inovador, quais são os paradigmas que têm de ser quebrados para que o negócio realmente tenha sucesso?

O trabalho que fazemos com executivos não é relativamente linear. Leva um ano e meio ao menos para apresentar resultado. Já existem diversos ácidos e vitaminas para o tratamento da pele no mercado. Chegamos mostrando que nosso produto tem sucesso na área médica, tem eficácia clínica comprovada em mais de 500 pacientes. No mercado, já tratamos mais de 10 mil pacientes. Temos origem médica com fundamentação sólida e com um produto com patente e inovador. A patente no mundo do cosmético vale muito, é como se tivesse o poder de quebrar monopólios estabelecidos, já que vale por 20 anos. Ao trazer uma nova droga ao mercado, você sai do genérico e similar e entra na inovação. É o que as empresas do ramo buscam de verdade. Nos posicionamos como o parceiro de biotecnologia que trará, com precisão, uma nova molécula ao produto, e um grande diferencial de mercado. O segundo passo é montar um projeto com esses executivos para que eles se convençam da qualidade do nosso ativo. Com isso, criamos um conforto para que eles tomem a decisão de levar o produto ao mercado.

 

Vão partir para o mercado externo?

Sim, essa é nossa expectativa. Montamos um laboratório em Ribeirão Preto para produzir o princípio ativo em escala semi-industrial. Investimos recursos consideráveis, importamos equipamentos da França e também trouxemos uma engenheira francesa que tem mais de dez anos de experiência na área. Nosso projeto agora é trazer a fábrica de Mato Grosso do Sul para Ribeirão Preto, terminar nossa unidade de purificação de proteínas e, a partir de agosto, fornecer em regime industrial para os parceiros no Brasil e exterior.

 

E quando os produtos começam a chegar para o consumidor?

Depende um pouco dos registros na Anvisa. Mas acreditamos que no final de 2008, início de 2009.

 

Você acredita que o projeto já é sucesso?

Acredito porque, hoje, conseguimos sair da teoria e da pesquisa universitária e transformar o projeto em aplicação prática e em um empreendimento. Atraímos não só atenção de parceiros comerciais para a biomembrana e sua colocação no mercado nacional, como conseguimos três parceiros na área de enxertos ósseos. Nesse aspecto, eu diria que já somos sucesso, pois o setor de biotecnologia no Brasil está nascendo. São cerca de 70 a 100 empresas, todas pequenas e buscando seu espaço. E a Pele Nova fez o seu. Não somos uma empresa grande em número de pessoas, temos 15 funcionários. Contando a fábrica devemos ir para 25. Mas somos capazes de gerar um capital muito grande. Do ponto de vista de receita, acredito que em 2009 teremos um salto. Sairemos da receita exclusiva do BioCure e entraremos nas receitas com os parceiros. Projetamos um faturamento de R$ 12 milhões entre 2009 e 2010. Acho que aí começaremos a despontar como sucesso econômico. Mas isso tudo em função de direcionar nossa estratégia, identificar um cliente importante que não era o final, e sim, a indústria e o que ela precisa. Dessa forma, conseguimos desenvolver um produto com mais sintonia para atingir o consumidor final.

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